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| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

A Assembleia Legislativa do Paraná decidiu, nesta segunda-feira (20), que vai acelerar a análise de um projeto de lei que visa banir o amianto – mineral que, apesar de apesar de condenado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), ainda é usado na fabricação de itens como telhas e caixas d’água. Com a aprovação do regime de urgência na tramitação, a matéria passa a ter prioridade nas comissões e pode ir a plenário dentro de 15 dias. Hoje, o estado tem três indústrias utilizam o amianto como matéria-prima.

Observatório vai identificar trabalhadores expostos ao amianto

Recém lançado, o Observatório do Amianto vai identificar e acompanhar 10 mil pessoas que trabalham ou que trabalharam expostos ao mineral no Paraná nos últimos anos. A partir disso, o grupo pretende ter um diagnóstico mais preciso do impacto que o produto causa aos empregados das empresas que usam o amianto como matéria prima.

Foi criado a partir de um acordo de cooperação técnica entre o Ministério Público do Trabalho (MPT), Associação Paranaense dos Expostos ao Amianto, Ministério do Trabalho e Emprego, Universidade Federal do Paraná (UFPR), Ministério Público do Paraná, Secretaria de Saúde do Paraná e de Curitiba e o Hospital Erasto Gaertner. O grupo de trabalho mantém um portal na internet com informações atualizadas sobre o tema.

O estudo mais recente da OMS concluiu que a exposição ao mineral é responsável pela morte de 107 mil pessoas por ano, vítimas de doenças como câncer de pulmão e asbestose. Quase todas trabalhavam em linhas de produção que usavam o amianto. Por isso, quem teve a saúde diretamente afetada pelo produto, comemora a possibilidade de banimento.

“O que nós esperamos é que o amianto seja extinto, porque é um produto que mata”, resumiu o presidente da Associação Paranaense dos Expostos ao Amianto, Herbert Fruehauf, que desenvolveu doenças pleurais, após atuar por cinco anos em uma fábrica da região de Curitiba.

Os efeitos à saúde fez com que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Mundial do Comércio (OMS) apontassem pelo banimento do amianto. Enquanto 66 países o erradicaram, o Brasil ainda permite a industrialização de alguns tipos do mineral. Apenas oito estados aprovaram leis para erradicar o produto. Com a permissão, 42 empresas estão cadastradas no país a produzir e comercializar itens fabricados a partir do amianto.

Vistorias do MPT

O Ministério Público do Trabalho (MPT) realizou vistorias nas três empresas da região de Curitiba, que fabricam produtos à base de amianto: a Isdralit, a Multilit e a Eternit. Todas foram reprovadas e duas delas já respondem a inquéritos por expor trabalhadores ao mineral.

Na Região Metropolitana

Ainda que a lei estadual não venha a ser aprovada, o amianto deverá banido até junho do ano que vem em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba. A Isdralit – empresa que opera no município – firmou um acordo com o Ministério Público do Trabalho em que se compromete a substituir o mineral como matéria-prima.

Uma lei municipal previa que o amianto fosse banido em junho deste ano, mas a Câmara pôs em tramitação um projeto de lei que pretende ampliar o prazo em seis anos. A propositura ainda não foi a plenário.

“Com o acordo firmado, entendemos que qualquer lei que venha a ser aprovada perde o efeito”, disse a procuradora Margaret Mattos de Carvalho.

“Todas as três [indústrias] tinham péssimo controle ambiental, com exposição dos funcionários e muita poeira do mineral”, apontou a procuradora Margaret Mattos de Carvalho. “É um material cancerígeno, com período de latência. Com isso, as consequências disso aparecem tardiamente, muitas vezes, depois que o empregado já se desligou da empresa”, completou.

A Gazeta do Povo tentou ouvir as três empresas sedeadas no Paraná, que fabricam produtos usando o amianto. A Eternit preferiu não se manifestar. A Isdralit e a Multilit não responderam às solicitações até o fechamento desta reportagem.

Lobby

Um projeto de lei federal que prevê a erradicação do amianto na indústria também tramita na Câmara Federal, mas a matéria está parada na Casa desde 2002. Para a procuradora, o Brasil só não baniu o produto ainda por causa do lobby dos industriais em todas as esferas. “Até 2030, nós teremos uma epidemia de vítimas do amianto. Os empresários não estão preocupados, porque não são eles que vão pagar esta conta”, disse Margaret.

Oito estados

Os estados brasileiros que baniram o amianto: São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco e Minas Gerais.

“Eu ainda estou vivo, mas meus companheiros já morreram”, diz vítima do amianto

Os sintomas se manifestaram anos depois de Herbert Fruehauf ter se desligado da Multilit, empresa sediada na região de Curitiba, que fabrica telhas a partir do amianto. Fibras do mineral se alojaram no pulmão do ex-encarregado de manutenção, provocando uma doença na pleura. Depois disso, ele passou a lutar por pessoas que sofrem as consequências da exposição ao produto. “Eu ainda estou vivo, mas meus companheiros já morreram”, disse Fruehauf.

O ex-operário entrou com uma ação na Justiça do Trabalho, que lhe deu ganho de causa e condenou a empresa a indenizá-lo. Apesar disso, ele ainda sente o peso da contra-argumentação da empresa. “Me incomodou muito o fato de eles alegarem que eu ainda conseguia falar, me movimentar. Que por isso eu não estaria contaminado”, desabafou.

Presidente da Associação Paranaense dos Expostos ao Amianto, Fruehauf quer se dedicar a ter uma dimensão exata do impacto causado pelo amianto na saúde dos trabalhadores. Ele mantém uma lista de 12 ex-trabalhadores que morreram após exposição ao mineral. “Nós vamos procurar os familiares e tentar rastrear outros casos. Tem muitos que ficam escondidos, porque a própria família perde o interesse em lutar contra as empresas”, apontou.

“Desafio a encontrarem um doente”, diz presidente de federação

O presidente da Federação Internacional dos Trabalhadores do Amianto Crisotila (Fitac), Adilson Santana, atacou o projeto de lei que visa banir o amianto do Paraná. Ele diz que a produção a partir do mineral é controlada e assegura que não há mais nenhum risco à saúde dos trabalhadores. Segundo Santana, as vítimas do amianto teriam contraído as doenças pulmonares na década de 1980, quando os índices da fibra ainda não eram controlados.

“A Justiça e o Ministério Público têm trabalhado diuturnamente como se o amianto crisoltina fosse o mal do século. É um equívoco. A nossa realidade hoje é muito diferente dos anos 80”, disse. “Cadê os doentes? Eu desafio a encontrarem um doente que tenha sido contaminado depois da década de 80”, completou.

Santana apontou aspectos técnicos da produção. Ele afirmou que as empresas trabalham a um índice de concentração de 0,1 fibra por centímetro cúbico de amianto: quase 20 vezes abaixo do limite de duas fibras por centímetro cúbico, estabelecido pela legislação federal.

Paralelamente, ele salientou que a discussão tem afetado economicamente as empresas que exploram o mineral. Na avaliação do presidente da Fitac, o banimento seria um lobby da indústria de fibras sintéticas, que substituiriam o amianto.

“Temos tido demissões em todos os estados. Estão colocando em crise um setor cuja cadeia produtiva envolve 150 mil pessoas”, destacou.

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