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A ação mais estruturada de catadores e outros profissionais que lidam com lixo reciclável pode ter impactado no volume da coleta oficial. | Diego Pisante / Agência de Notícias Gazeta do Povo
A ação mais estruturada de catadores e outros profissionais que lidam com lixo reciclável pode ter impactado no volume da coleta oficial.| Foto: Diego Pisante / Agência de Notícias Gazeta do Povo

Pela primeira vez em uma década houve redução no volume recolhido pelo caminhão do Lixo que não é Lixo em Curitiba. A notícia pode ser boa ou ruim. Pode significar que menos resíduos foram separados para a reciclagem e foram parar no aterro. Mas também pode ser que a população esteja gerando menos lixo. Uma terceira possibilidade: as redes não oficiais de coleta (como os catadores) estão trabalhando mais e deixando menos material para ser recolhido pelo caminhão.

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Você costuma separar o lixo reciclável do lixo comum? O que poderia ser feito para melhorar o sistema de coleta de resíduos na sua cidade? Escreva para leitor@gazetadopovo.com.br ou deixe o seu comentário abaixo.

A quantidade de resíduos coletados pelo Lixo que não é Lixo caiu de 33 mil toneladas em 2013 para 29,4 mil em 2014 – redução de 11%. O volume também é menor do que o de 2012. Mas, verdade seja dita: atualmente, o curitibano separa muito mais lixo (e entrega para os meios oficiais de coleta seletiva) do que há alguns anos – a quantidade dobrou em relação a 2008.

Campanha educativa pode ter influenciado coleta, diz secretário

Apesar de os números não serem os ideais, o secretário municipal de Meio Ambiente, Renato Lima, considera que há muitos motivos para comemorar quando o assunto é o lixo em Curitiba. Ele vê uma relação direta entre a redução na quantidade coletada de resíduos recicláveis e a campanha do Dr. Sigmundo, realizada no ano passado. Ele reforça que a queda no volume começou em abril, período em que estava na rua a mensagem educativa. Lima destaca também que mais do que a separação do lixo, a campanha tinha como mote a redução do consumo e a reutilização de embalagens. Se a mensagem foi incorporada por uma parcela da população, menos resíduos foram coletados.

Lima enfatizou as vantagens – financeiras e ambientais – com a redução no volume de lixo. Como a prefeitura paga a gestão do lixo por tonelada, cada vez que menos quantidade é recolhida, a despesa fica menor. Também reduz o volume de resíduos enviado ao aterro, garantindo mais tempo de vida útil para o espaço. Os ganhos ambientais são ainda maiores – a consciência no momento do consumo leva a gastos menores de matérias-primas. As despesas com a campanha do Dr. Sigmundo foram na ordem de R$ 2,42 milhões e não é possível calcular qual foi a economia direta com a mensagem passada à população. “Com a redução no volume coletado, já estamos mudando uma tendência de aumento”. Ele argumenta que ano a ano são registrados crescimento nos números e que não há notícia de outra cidade que tenha conseguido reduzir a quantidade de lixo.

Entre os fatores que costumam influenciar no volume gerado de resíduos está a movimentação econômica. Em períodos de recessão ou emprego em baixa, o consumo cai, principalmente em bens supérfluos. O setor de embalagens, que gera muito lixo reciclável, costuma ser um indicador do momento econômico. Outro aspecto que pode ter pesado no decréscimo da tonelagem do Lixo que não é Lixo é a ação mais estruturada e planejada dos catadores e outros profissionais que se dedicam a buscar produtos a serem reaproveitados. Sabendo o dia e horário em que o caminhão “oficial” vai passar, alguns grupos se organizaram e percorrem as ruas antes, escolhendo o lixo mais valioso.

A Secretaria de Meio Ambiente não dispõe de dados sobre a coleta não oficial, mas reconhece que há estruturas organizadas, com caminhão e tudo, que aproveitam o calendário de dias e horários do Lixo que não é Lixo para vasculhar o material deixado pelos moradores em busca de resíduos rentáveis. E complementa que nada há de ilegal nisso. Cerca de 70% do material reciclável na capital é coletado pelo sistema não oficial.

Convencional

Por outro lado, o volume do lixo convencional aumentou em 2014 na mesma proporção dos últimos anos – foi de 499 mil toneladas em 2013 para 511 mil no ano passado. Assim, os gastos municipais com a destinação de resíduos seguem em alta. Em 2014, somente com o recolhimento de lixo e o depósito no aterro, a prefeitura gastou R$ 137 milhões. Tanto em termos de economia aos cofres públicos como em ganhos ambientais, seria importante reduzir o volume do lixo convencional.

Pioneira no passado, Curitiba ainda faz uso de aterro

No momento em que reduz o volume coletado de lixo – mesmo sendo o reciclável – Curitiba inverte a lógica que se instalou na maior parte das cidades, que só veem a montanha de entulho aumentar.

Contudo, não há apenas motivos para comemorar os resultados. Para o diretor executivo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe), Carlos Silva Filho, a capital paranaense perdeu a vanguarda na gestão ambiental.

O principal exemplo é a destinação do lixo. Silva Filho destaca que, enquanto outras grandes cidades já colocaram em prática modelos mais racionais de destino final, Curitiba ainda enterra (aterra) o lixo convencional. Em São Paulo, por exemplo, há centrais mecanizadas de separação de resíduos e plantas de compostagem.

Ele afirma que quanto mais rica e mais desenvolvida uma sociedade, mais resíduos são gerados. Ele comenta que, num processo contínuo e gradual, levaria um ciclo de 12 e 15 anos para “criar consciência” sobre a gestão do lixo. “Não conheço uma situação no Brasil que tenha tido redução”, acrescenta. Quando novos serviços de coletas são ofertados à população, há uma influência direta e imediata nos números. “Mas estável e concreta, não”, diz.

Copenhague

O diretor da Abrelpe acredita que as questões envolvendo o lixo urbano não podem ser solucionadas no curto prazo. Ele cita o caso de Copenhague, na Dinamarca, que há 38 anos mantém campanhas educativas permanentes. “Num primeiro momento, era para conscientizar para o descarte correto do resíduo. Depois, para a redução do volume. Mais recentemente começaram dar ênfase a determinados resíduos, como a destinação correta para bituca de cigarro e a separação entre o tampinha, o rótulo e o corpo das garrafas”, conta.

Para Silva Filho, só irá funcionar de verdade uma ação que “premiar” quem gera pouco lixo. Ele acrescenta que é comum as pessoas dizerem que separam o lixo, mas mesmo algumas bem intencionadas estão desinformadas. “Para criar bons hábitos, primeiro é preciso ensinar o cidadão, dar comodidade e vantagens”, diz.

Mesmo com a redução na quantidade recolhida pelo Lixo que não é Lixo, a despesa anual cresceu por causa de fatores como o reajuste anual do valor pago pela prefeitura à transportadora (Cavo)– de R$ 19 milhões em 2013 para R$ 21 milhões ano passado.

A reportagem tentou apurar se aumentou a coleta dos catadores, mas não há entidade que quantifique o volume.

88% dizem que separam o lixo

A atitude de separar o lixo seco e úmido parece ter sido incorporada pela grande maioria dos moradores de Curitiba. Pelo menos é o que eles afirmam quando são questionados se separam o lixo orgânico do reciclável. Quase nove em cada dez moradores dizem que fazem a separação dos materiais. Em consulta feita nas ruas, igual índice declara não ter dúvidas sobre como o trabalho deve ser feito. Entrevistas feitas pelo instituto Paraná Pesquisas mostram que também está no patamar superior a 80% a proporção de cidadãos que sabem o horário da coleta seletiva.

Chama a atenção que 63% dos consultados consideram que separar o lixo não é “nada trabalhoso”. Ainda assim, quando os sacos plásticos que saem de casas e empresas são abertos, é comum encontrar entre os resíduos convencionais alguns materiais que poderiam ser reciclados. Também entre o que é coletado pelo Lixo que não é Lixo estão resíduos que não poderão ser reaproveitados e terão de ser encaminhados para o aterro. Em ambos os caos, a proporção de materiais destinados erroneamente é superior a 30% do volume recolhido.

Análise

Para o diretor do instituto Paraná Pesquisas, Murilo Hidalgo, os resultados do levantamento mostram que a população tem informações sobre a destinação correta do lixo. Contudo, ele acredita que, como os números revelam uma leve tendência de queda em relação ao ano anterior, pode significar uma acomodação.

Hidalgo avalia que o cenário pode ser revertido com campanhas educativas. Para ele, falta divulgação. “As pessoas vão esquecendo e precisam ser estimuladas constantemente.” Apesar da realização de uma campanha sobre o lixo no último ano, o diretor analisa que o trabalho não foi suficiente para motivar a população nem emplacou como as realizadas anteriormente. O destaque positivo da consulta foi que o serviço de coleta de lixo é bem avaliado pela população.

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