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Uma vez alguém me disse que não confiava em ninguém que tivesse mais de cinco amigos, uma frase engraçada. O assunto da conversa era o Orkut, nos seus primórdios, alguns poucos anos atrás. Lembro que me convidaram para o clube e aceitei – passei a vida gostando de novidades. Mas depois de dois meses, entrando na página, conferindo recados, vendo fotografias, trocando abobrinhas e engordando a lista de amigos, me perguntei: o que estou fazendo aqui?! Era o sinal inequívoco de que, até que enfim, eu estava ficando velho, como queria Nelson Rodrigues, ao acon­­­selhar os jovens: "Enve­­lhe­­çam, por favor, envelheçam!"

Atenção: nada contra esses espaços sociais da internet, que são maravilhosos pontos de encontro e estão mudando o perfil da convivência humana. Tenho uma imensa curiosidade sobre os efeitos da tecnologia sobre nossa vida e procuro quebrar meus preconceitos quando eles, insidiosos, se intrometem nos meus olhos. Mas há um dado básico que poucos comentam: ninguém se conserva a mesma pessoa ao longo dos anos. O que parece a alma da vida aos 21 pode ser apenas interessante aos 38, chatíssimo aos 47 e indiferente aos 52. Seria terrível se não tivéssemos essa incrível capacidade de mudar.

Assim, vivo deletando convites gentis para entrar no Linke­­din, facebook, orkut, tuíter e tudo quanto é rede social – sou cada vez mais um bicho do mato. Me perdoem – não é maldade, intolerância ou rabugice; é só técnica de sobrevivência e, digamos, "produção de tempo", essa mercadoria que vai ficando de­­sesperadamente escassa de­­pois dos 50.

Pensei nessa relação entre internet e faixa etária também quando a Apple lançou o celebérrimo iPad. Eu já havia tido uma experiência desastrosa com esses telefones movidos a simples toque (preciso sentir o relevo das teclas; se eu fosse um pouco mais antigo talvez só me desse bem com o telefonão de disco preto e 10 buracos, que Hitchcock imortalizou em "Disque M para ma­­tar"); portanto é muito pouco provável que algum dia eu vá comprar um iPad, ainda que seja um admirador das traquitanas de Steve Jobs – feito um adolescente fanático, considero os computadores iMac a oitava maravilha do mundo da informática.

Bem, eu até poderia pensar num iPad para leitura. Isso me interessa: o leitor digital. Ainda quero ter um. O problema é que o ato de ler deve anular completamente todas as outras atividades: a leitura é uma solidão ma­­ravilhosa. Ora, não é fácil ler um livro digital recebendo e-mails, pipocando mensagens, convites para jogos, janelinhas de internet. A tentação de me distrair seria grande demais e suspeito que, no fim das contas, o iPad é que seria meu usuário, e não eu o usuário dele. Por isso me agrada o conceito do Kindle, o leitor digital que é apenas e exclusivamente leitor – nenhuma chance de distração. Mas com tanto livro na fila empilhado aqui em torno, acho que posso esperar mais um pouco.

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