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A tradição historiográfica costuma tratar a Batalha das Termópilas, em 480 a.C., como um embate decisivo entre Ocidente e Oriente. Os gregos perderam. Mas conseguiram conter por sete dias o avanço do exército persa. Foi tempo suficiente para evacuar Atenas e reorganizar as forças helênicas, que um ano mais tarde expulsariam os invasores da Grécia continental. Há quem diga que aquela guerra foi travada entre duas visões distintas de mundo: de um lado, os gregos buscando manter uma sociedade marcada pela liberdade, razão e democracia; do outro, um império em que a autoridade do rei sobre os súditos era absoluta.

A vitória assegurou o desenvolvimento do século de ouro dos gregos e a posterior disseminação de seus valores pela Europa – por meio da política, filosofia, ciência e arte. A Grécia foi, assim, o berço do Ocidente e o seu primeiro limite.

Os gregos, porém, estão hoje diante de numa nova fronteira. Fazem parte da União Europeia, mas caminham para um calote em seus credores e colocam um pé fora da zona do euro e da própria comunidade de nações da Europa. É simbólico que o projeto da Europa unida possa começar a ruir justamente pelo país que legou grande parte dos princípios sobre os quais o continente foi construído.

Nascida dos escombros da Segunda Guerra Mundial, a União Europeia – mais do que um simples mercado comum – é um projeto político para evitar novos conflitos bélicos como os que haviam destruído o continente por duas vezes no século 20. A escolha de Roma para ser sede da assinatura do tratado em que o bloco foi constituído, por exemplo, é significativa nesse sentido: o objetivo seria atingir uma nova pax romana.

Os políticos de ambos os lados têm sido incapazes de impedir que a Grécia caminhe em direção oposta à da União Europeia

A economia – o motivo pelo qual a Grécia abala a Europa e põe o mundo financeiro em alerta – seria tão somente um meio de chegar àquela meta primordial da união de nações. Ou seja, não seria o principal. A ideia da Comunidade Europeia é que, com laços econômicos e comerciais fortes, seria muito mais difícil que países voltassem a entrar em guerra. Além disso, os europeus partilham valores comuns – muitos dos quais de gênese helênica –, o que facilitou a união.

Os políticos de ambos os lados, porém, até agora têm sido incapazes de impedir que a Grécia caminhe em direção oposta à da União Europeia. E a crise helênica cobra seu preço. Fez crescer no país partidos de inspiração fascista. Aumentou o populismo. E, recentemente, o governo grego e a Rússia de Putin – justamente um país que não preza a liberdade e a democracia – começaram a se aproximar.

Obviamente, ainda é prematuro saber quais serão os desdobramentos do drama grego. Mas há um risco de que o berço do Ocidente se afaste do Ocidente. Seria uma nova fronteira, mais estreita, de uma forma de ver o mundo.

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