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Há exatamente um ano, o verão mais seco e inclemente pelo qual o país passara em décadas estava chegando ao fim. Foi um calor do cão. Foram dias de cão. Junto com as elevadas temperaturas, o Brasil vivia uma onda de radicalização cuja expressão máxima havia sido a morte do repórter cinematográfico Santiago Andrade, atingido num protesto no Centro do Rio de Janeiro por um rojão disparado por black blocs – aquele grupo de extremistas que, com violência e vandalismo, conseguiu sequestrar o espírito das jornadas de junho de 2013. Parecia que os brasileiros demorariam muito tempo para sair às ruas sem que as manifestações de massa terminassem em quebra-quebra gratuito. Parecia. Foi aqui no Paraná que uma luz de esperança se acendeu.

A ocupação da Assembleia Legislativa por professores e servidores estaduais foi uma atitude extrema para evitar outra atitude extrema: a aprovação às pressas, sem ampla discussão, do pacotaço de austeridade proposto pelo governo estadual. O ato esteve muito próximo de terminar em tragédia – o que talvez só não tenha ocorrido por mérito dos policiais, que em geral evitaram reagir com excesso de violência.

A passeata dos professores e servidores ocorreu à luz do dia e todos estavam de cara limpa. Há uma diferença simbólica em relação a junho de 2013

O fato de o movimento e as forças policiais não terem ultrapassado essa perigosa linha, porém, abriu uma porta que parecia fechada. Na semana passada, milhares marcharam rumo ao Centro Cívico para defender seus direitos e cobrar dos políticos coerência entre discurso e prática. Nenhum incidente foi verificado. Nenhum black bloc apareceu. Nenhum vandalismo. As manifestações foram redimidas. Foi uma mostra de que é possível protestar sem depredar e recorrer à violência.

O Paraná ganhou, assim, uma segunda chance para diminuir o fosso entre a classe política e a população, que se perdera no restante do país. O governo estadual recuou e abriu o diálogo com a sociedade. Os deputados reconheceram o erro e decidiram acabar com o tratoraço.

É importante notar que a passeata dos professores e servidores ocorreu à luz do dia e que todos estavam de cara limpa. Há uma diferença simbólica em relação a junho de 2013, quando as marchas ocorriam em geral no escuro da noite e tiveram como ícone a máscara do personagem principal do filme V de Vingança. Num caso, a transparência. No outro, o oculto – semente que germinou e provocou a ruína daquele movimento que por pouco não mudou o país de forma profunda.

A erva daninha do radicalismo, porém, não está extirpada. E este ano promete ser quente, embora o verão já esteja no fim. Existe uma crise nacional na política e na economia – mistura que costuma ser potencialmente explosiva. Haverá muitos protestos em todo o país, pelos mais variados motivos. E ainda há um clima de extremismo no ar. A fronteira que separa a legítima pressão popular da bagunça é muito tênue. O caso do Paraná pode servir de exemplo para o país.

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