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O trem é uma boa metáfora para as guerras. Após a máquina ser posta em movimento, freá-la é algo que não se faz rapidamente. E, quando duas composições se encontram na direção oposta, a tragédia é inevitável. A Primeira Guerra Mundial, cujo início completou 100 anos nesta semana, foi como um trem desgovernado. Começou numa sucessão de blefes malsucedidos em que políticos e diplomatas se viram incapazes de controlar a máquina bélica – uma reflexão atual num planeta envolto em conflitos como os da Ucrânia e de Gaza.

O 28 de julho de 1914, data em que a história marca o início da guerra, amanheceu sem que as potências europeias acreditassem que haveria um conflito em grande escala. Foi quando o Império Austro-Húngaro declarou guerra à Sérvia por entender que a nação vizinha tinha envolvimento no assassinato do herdeiro imperial, um mês antes. A expectativa dos austro-húngaros era de que, mais do que um conflito aberto, a declaração forçasse uma negociação diplomática mais vantajosa a eles.

Essa também era a avaliação da Rússia, "defensora" dos sérvios. Mas, como grande potência, ela tinha de demonstrar força: moveu, então, suas tropas para as fronteiras com a Áustria-Hungria e com a Alemanha – esta inimiga dos russos e aliada dos austríacos. A reação alemã era esperada: divisões se mobilizaram para o front russo e também em direção à França – adversária da Alemanha e amiga da Rússia.

Até então as operações militares eram vistas como um instrumento de pressão para um acordo diplomático. Mas esse acerto tácito esbarrou na inflexibilidade do plano de mobilização das tropas alemãs. Concebido por burocratas da caserna sem quaisquer preocupações políticas, ele não abria brecha para a diplomacia. Cerca de 840 mil soldados foram embarcados em trens para de fato invadir a França.

Quando a Inglaterra comunicou Berlim que não entraria na guerra se a França não fosse invadida, a cúpula política alemã comemorou: era hora de desmobilizar as tropas a oeste. Os militares informaram que isso não era viável: 11 mil trens em linha não param de uma hora para outra. Certos de que não entrariam em guerra, os britânicos baixaram, então, sua demanda: exigiram apenas que a integridade de sua inofensiva aliada Bélgica fosse assegurada. Isso também não era possível. As tropas alemãs àquela altura já cruzavam o território belga – uma tática para, no papel, surpreender os franceses e garantir uma vitória rápida.

Apenas uma semana depois do 28 de julho, as potências da Europa haviam sido tragadas para uma guerra que os políticos não esperavam naquele momento. E que, ao contrário dos planos iniciais, foi longa e custosa: quatro anos e milhões de mortos. A máquina bélica, afinal, não parou rapidamente. E, curiosamente, a paz foi selada em um vagão de trem.

Este é o segundo de três artigos sobre a Primeira Guerra.

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