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Curitiba não tem apenas a menor avenida do mundo – a Luiz Xavier. Tem também o menor espaço de arte do circuito internacional, o Lilituc, formado por pequenos aquários de vidro presos a uma das paredes da Galeria Júlio Moreira – nome oficial do "túnel" que fica atrás da catedral, sede do TUC, o Teatro Universitário de Curitiba, templo do rock-and-roll. Com a decadência da Júlio e, mais recentemente, sua revitalização, a Lilituc parecia ter seu fim anunciado, para tristeza de seus idealizadores, os performers Hélio Leites, Kátia Horn, Efigênia Rolim e Lauro Borges, entre outros brincantes que expunham ali miniaturas feitas de sucata.

Mas eis que... A Fundação Cultural de Curitiba anuncia para setembro a reabertura do Lilituc, dessa vez "na parede em frente." O espacito ficou ainda menor. "São agora três dedos de arte", mede Hélio, certo de que na profundidade vai caber pelo menos um Kinder Ovo – tema da primeira exposição de 2008. Só falta agora a banca de revista do Melo reabrir.

O nome Lilituc nasceu da fusão de TUC com Liliput, reino encantado criado pelo irlandês Jonathan Swift, no século 18, para ambientar As aventuras de Gulliver. Lá, homens e mulheres minúsculos se digladiam por conta de coisa pouca e bobagens, numa daquelas legítimas sátiras que gente como Bush devia ler antes de ir para a cama. Leites, adepto do humor sem escracho, não perdoou o trocadilho e cravou o nome da ilha imaginária na galeria smurf que acabara de fundar. Gabaritou.

Mas seu Swift ajudou bem pouco o empreendimento. Essa história começa mesmo é com ninguém menos do que dona Helena Kolody. Foi ela quem soprou pro Leites que "aquela gruta" nos fundos da igreja era perfeita para uma sala de exposições. A sala não vingou, mas, que remédio, virou uma caixinha parecida com as que a gente coloca as chaves quando entra no banco. Deu certo. Em pouco tempo, a Júlio Moreira recebia em seus domínios uma mostra de presépios que cabiam na palma da mão. Um mimo.

A Lilituc viveu grandes momentos, a exemplo de uma coletiva em que todas as peças foram feitas com latas de fermento Royal, tendo contado com a participação especialíssima do designer Guto Lacaz. A propósito, não é difícil para Leites atrair gente bamba para seu regaço. O cabra idolatrado por Paulo Leminski já rendeu o jornalista Maurício Kubrusly no Me Leva Brasil, o Jô, e é atração anunciada do especial Bom Jeitinho Brasileiro, do Canal Futura.

Badalado fora de casa, contudo, é provável que Leites concorra com o Templo das Musas, na Vila Izabel, na categoria "a Curitiba que o mundo inteiro conhece, menos Curitiba." Se alguém sofrer desse tipo de amnésia, é só procurar pelo Hélio na Feirinha do Largo, onde ele bate cartão sempre aos domingos. Ou de segunda a sexta-feira na Escola de Belas Artes, na Emiliano Perneta, da qual se tornou aluno tardio. Dou um braço que a Belas ficou menos sisuda depois dele.

Não tem mofo que resista. O acadêmico espalhafatoso já carregou seus colegas de classe para a rua, precisamente para o pátio do Museu de Arte Contemporânea (MAC). Numa pequena área com grades, bem onde o vento faz a curva com a Desembargador Westphalen, já ocorreram três heróicos vernissages do projeto batizado de "Canteiro de Obras". "Está ouvindo este barulho? [silêncio] É que os paradigmas estão caindo", debocha, anunciando que o linguajar empolado que se cuide. Melhor não desdenhar: Leites manja de guerrilhas estéticas como poucos.

Foi de sua tropa de elite que surgiu a idéia do Kinderção – Associação dos Colecionadores de Kinder Ovo, uma fundação lúdico-artística sem precedentes. Some-se à lista a Escola de Samba Unidos do Botão – cuja alegorias são carrinhos desses que guri brinca. E a Igreja da Salvação pela Graça – a igreja engraçada. É também de Leites e cia. que vem mais nova campanha que abala a paróquia: a canonização de Helena Kolody, "nossa santinha municipal". Vamos cultuá-la no TUC, túnel imaginário que leva a Liliput. Rock-and-roll.

José Carlos Fernandes é jornalista.

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