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 | Julio Cesar Souza
| Foto: Julio Cesar Souza

De todos os postulantes à prefeitura de Curitiba, o petista Tadeu Veneri é talvez o único que enfrentará maior resistência do eleitor não simpatizante por representar o partido que acaba de ser defenestrado do governo federal com o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Ele próprio admite que foi um desafio lançar-se candidato no ano em que o PT sofreu sua maior derrota política e ainda por cima ter de enfrentar o prefeito Gustavo Fruet, um ex-aliado. Na manhã da última quinta-feira, dia 1º, horas após a votação do Senado que tirou Dilma do Palácio do Planalto, a coluna conversou com Veneri, deputado estadual no quarto mandato, além de oito anos como vereador na capital, no escritório de advocacia de seu filho, no Centro Cívico.

Por que decidiu ser candidato a prefeito de Curitiba?

Eu tenho uma relação com Curitiba que é, ao mesmo tempo, uma relação de gratidão por todas as coisas que eu vivi aqui, que são extremamente positivas, e também um compromisso não só com o Partido dos Trabalhadores, mas com aqueles que entenderam que nós poderíamos ter uma leitura e uma proposta diferente para a cidade. Curitiba, que já foi referência para muitas coisas, passa, como o mundo todo, por um período que acredito seja de transição entre o que foi feito e aquilo que precisa ser feito. Curitiba é uma das cidades mais ricas do Brasil, é o quarto maior orçamento e isso faz com que ela tenha um potencial de se reinventar muito grande. Além disso, fomos o partido que, aliado ao PDT e ao PV, elegeu o prefeito e a vice-prefeita de Curitiba. Tivemos um período de uma convivência muito produtiva, mas chegou um determinado ponto, a começar pelo próprio prefeito Gustavo Fruet, que não fez nenhuma manifestação no sentido de continuar a aliança, o que é absolutamente legítimo.

Mesmo participando da administração do atual prefeito o senhor se considera candidato de oposição?

Sim, porque nós não entramos na questão da personalidade, acho que isso não ajuda nenhum diagnóstico. As pessoas têm acertos e erros, mas penso que se tem que olhar o conjunto e no conjunto acho que o prefeito, durante este período, acabou tendo algumas ações que não eram aquilo que eu, particularmente, esperava. Te dou um exemplo: a questão do transporte. Acho que entramos num processo de bastante contradição. Curitiba viveu um período em que tivemos talvez o maior número de construções novas de habitação através da Cohab e de regularização fundiária com 100% de verba do governo federal. Do mesmo jeito, toda a construção ou reorganização das 92 Unidades Básicas de Saúde foram feitas com recursos federais. Os 32 Cmeis que foram construídos ou que estão sendo construídos são do programa Pró-Infância.

Está dizendo que houve falta de reconhecimento do prefeito?

Acho que não houve um empenho em se fazer uma parceria que de fato reconhecesse, do lado da prefeitura, do lado do prefeito, aquilo que houve de contribuição do governo federal. Nós sabemos que a revitalização da Avenida das Torres, da Comendador Franco, da Rodoferroviária, dos terminais, do próprio Atlético Paranaense, do novo corredor que foi feito na Marechal Floriano, são recursos oriundos do governo federal, que podiam ter vindo para Curitiba ou não. E vieram em uma quantidade significativa.

Mas vieram porque o PT está na administração?

Vieram porque o PT estava (sic) na administração. Não tenho dúvidas disso, não que não devessem vir, mas é óbvio que isso ajudou. Eu acho que é natural também que se reconheça que houve um determinado momento em que o prefeito Gustavo Fruet fez uma tentativa de se descolar do governo da agora ex-presidente Dilma, como se isso fosse uma situação que lhe causasse um peso muito grande. É preciso ter um mínimo de humildade para reconhecer que nenhum partido é perfeito do começo ao fim. Então o que me parece é que a justificativa da prefeitura para todas as suas impossibilidades se deram por conta do governo federal, o que não é verdade. O governo federal atravessa uma crise, o país atravessa uma crise, mas não é justificativa para abandonar aliado durante a crise.

Ontem o Senado aprovou por ampla maioria o impeachment da presidente Dilma. Como se sente como candidato do partido que foi afastado do governo federal?

Desafiado. Eu acho que desafiado é dizer que o partido tem, veja, eu fico até perplexo com a decisão do Congresso. Pelo menos do Senado. Porque o Senado faz um processo de alguns dias, algumas semanas, meses, e chega à conclusão que há de se fazer a cassação, é uma decisão soberana do Senado, nós podemos divergir, mas não há o que questionar do ponto de vista numérico. São 61 senadores que entendem que a cassação deve ocorrer. E na sequência, o próprio Senado diz que não há crime. E mantém os direitos políticos da pessoa cassada.

Mas aí por uma manobra do PT, que pediu a votação em separado.

Mas quem vota é o Senado. Do mesmo jeito.

Concorda com a afirmação da senadora Gleisi Hoffmann de que o Senado não tinha moral para cassar a presidente?

Eu não julgo o Senado. Porque eu acho que quando eu julgo o Senado eu julgo pessoas, é minha posição pessoal. E se nós formos olhar os parlamentos, formos olhar os poderes todos, muitas vezes nós vamos questionar a condição, não só moral, mas a condição que eles têm de julgar. Não só os parlamentos, os poderes, os Tribunais de Contas, o Judiciário, sempre vão ter erros.

O PT nunca chegou ao poder municipal em Curitiba, exceto agora com o prefeito Gustavo Fruet na vice-prefeitura. O senhor pega justamente essa ressaca do impeachment numa cidade que é tradicionalmente avessa ao PT. Acha que será preciso rever alguma estratégia?

Não. Nós chegamos duas vezes ao segundo turno das eleições aqui nos últimos 16 anos. Uma vez com o [Angelo] Vanhoni, em 2000, e novamente com ele em 2004. Não chegamos ao segundo turno em 2008 porque a eleição foi decidida no primeiro turno, e com a vice em 2012. Então, se você pegar dos últimos 12 anos, de 2000 para cá, o PT chegou duas vezes ao segundo turno e uma vez perdemos a eleição por pouco mais de 20 mil votos, e numa terceira com a vice prefeitura. Então, esse é um dado que tem que ser olhado com certo distanciamento. Uma cidade avessa ao PT não levaria o partido ao segundo turno duas vezes e uma a vice prefeitura em 12 anos. Não é surpreendente?

Mas nos últimos dois ou três anos, especialmente agora, neste período pré-impeachment, o PT perdeu quadros, perdeu inclusive em número de candidatos em relação a última eleição, de 2012.

Sim, perdeu deputados, perdeu vereadores, senadores. Filiados não, filiados aumentou. Eu não entendo por quê. Aumentou no município, aumentou no estado e aumentou nacionalmente (risos). Não sei exatamente o que aconteceu. Talvez o PT leve mais 12 anos para chegar ao segundo turno em Curitiba. Talvez aconteça nessa eleição, talvez aconteça numa eleição daqui a quatro anos. Eu aceitei ser candidato dentro de algumas condições. Eu não sou candidato para fazer todo tipo de coligação a qualquer custo, a qualquer preço. Essa é uma situação que não me agrada. Eu não sou de fazer isso, não gosto disso. E não tenho como acreditar num partido como o PT se aqui em Curitiba, pelo menos, ele estiver aliado a partidos que são frontalmente contrários aquilo que nós propomos. Outra condição foi que nós tivéssemos uma campanha que pudesse ser basicamente bancada com recursos dos próprios petistas.

O senhor acredita realmente que a sua candidatura tem chances reais de vitória com a crise enfrentada pelo PT?

Eu sempre pego como padrões pessoas que saíram candidatas, tanto da direita quanto da esquerda, com chances mínimas, mas tiveram a dignidade de fazer aquilo que era seu compromisso. No caso do presidente Lula, em 1989, saiu com 1%, 2% das chances de ir ao segundo turno e foi ao segundo turno. O mesmo aconteceu com o Fernando Haddad na última eleição. Dois exemplos do PT. O caso do prefeito e hoje governador Carlos Alberto Richa, que saiu com 2% e foi ao segundo turno e ganhou a eleição do PT, do Vanhoni. E nós tivemos momentos muito ruins e muito positivos.

Caso seja eleito, como será sua relação com o presidente Michel Temer?

Uma relação republicana. Eu acho que os Poderes têm que estar acima das pessoas. Você não pode pensar que uma cidade como Curitiba, como falei, um dos maiores orçamentos do país, 8 bilhões de reais, uma cidade próxima de 2 milhões de habitantes, com uma região metropolitana como essa, que gera 36% do ICMS do Estado, eu já não tenho mais a leitura que algumas pessoas ainda têm, que a prefeitura determina a cidade. É o contrário. É a cidade que determina a prefeitura. E a cidade vai determinar o que você tem que fazer.

Mas essa relação não geraria desconforto ao senhor junto ao partido ou suas lideranças nacionais que consideram Temer golpista?

De jeito nenhum. Não, porque veja, o governador Carlos Alberto Richa fez todas as críticas que achava que eram necessárias, e acho que é um direito dele, à presidente Dilma assim que ela ganhou as eleições, aliás, já no primeiro mandato.

Mas críticas normais como opositor.

Como opositor e pela forma como ela ganhou as eleições. Quando ele dizia que houve uma fraude eleitoral porque a proposta era uma e na prática as coisas aconteciam de outro jeito. Isso não impediu que ele a procurasse, e fez o correto. Então, acho que as coisas não se confundem.

O senhor acha que o PT comprometeu seu legado ao se envolver em escândalos de corrupção?

O PT não, as pessoas do PT sim. Eu sempre falo que as pessoas compõem o partido. Se nós pensássemos: por que você fala, quando se fala do PT, como sendo 1 milhão e 800 mil filiados, ou 1 milhão de filiados ou 10 mil filiados, ou 2 filiados, todos responsáveis pelas mesmas ações? E quando falam do PSDB, falam do Aécio Neves? Ou falam do senador [Zezé] Perrela? Ou quando falam do PMDB, não falam do PMDB, mas falam do [Eduardo] Cunha. Ou falam do Renan [Calheiros] ou do [Romero] Jucá ou do próprio agora presidente.

Mas não seria por que o PT sempre se colocou como guardião da ética?

Sim, eu acho que também. Eu acho que... as pessoas fazem essa analogia, você tem razão. Agora, eu falei isso, o Paulo Salamuni, que é o candidato a vice na chapa do Fruet, tanto ele quanto o prefeito agora usam muito uma expressão que é... e aí não vai uma correção, não tenho nem esse direito, nem essa pretensão, essa uma constatação. “No meu governo não tem erro, no meu governo...”. Não bata no peito três vezes ao dia para dizer Senhor, Senhor, Senhor, porque isso não lhe garante o reino dos céus (risos). E não há nem na prefeitura, nem no Estado, como não há no Governo Federal condição de dizer: aqui 100% é sério. Eu acho que esse moralismo pode agradar setores da sociedade, mas o mesmo moralista que vai marchar num dia contra a corrupção, no dia seguinte vai preso, como foi o caso do Luiz Abi Antoun (parente do governador Beto Richa). E isso, para mim é emblemático. As pessoas fazem todo um discurso sobre moralismo e sobre ética e nós temos em Curitiba 4 bilhões e meio de reais não recolhidos aos cofres públicos em sonegação fiscal de IPTU. Eu não sou o guardião da moralidade, da ética, não sou a única pessoa certa em todo esse processo. Eu tento fazer as coisas de uma forma que a minha consciência não me cobre mais tarde.

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