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Outro dia, por conta dessas estranhas constelações mentais que moldam as conversas da hora do cafezinho, vi-me envolvido em um bate-papo sobre a política chinesa do filho único. Como sou conhecido por minha estima pela cultura sínica, acabei virando uma espécie de conselheiro informal sobre temas daquele outro lado do mundo. Acionado raramente, mas sempre à mão para passar a receita do pato de Pequim. Exatamente como aconteceu naquele instante.

“E aí, Rodrigo, o que você acha dessa história?” Como não achava nada, dei uma enrolada e voltei para a bancada de trabalho rapidinho. Mas fiquei encafifado. Eu até havia lido alguma coisa sobre o assunto, mas não lembrava direito dos detalhes. Resolvi saber mais.

Fato é que os chineses andam às voltas com uma questão interessante. Desde 1979, quando a política do filho único foi imposta, eles conseguiram frear a bomba demográfica. E a expectativa de filhos por família, que chegava a quatro, caiu para 1,6, muito próxima da do Brasil (1,8). Típica de países mais próximos de um mundo urbano, em que as mulheres estudam mais e trabalham fora de casa, do que de um cenário rural de mães em casa, muitos filhos e alta taxa de mortalidade infantil.

Desde 1979, quando a política do filho único foi imposta, os chineses conseguiram frear a bomba demográfica

Hoje, a China tem 1,4 bilhão de habitantes, e o número deve avançar pouco nos próximos anos. Isso, ao mesmo tempo em que a população com mais de 65 anos aumenta consideravelmente. Ela já representa 15,5% do total e, em 2050, deve chegar a 25% – uma bagatela de 350 milhões de pessoas. Com tanta gente caminhando para fora do mercado de trabalho, é preciso fortalecer a população economicamente ativa.

Por causa disso, nos últimos anos o governo amenizou a lei em certos casos, permitindo, por exemplo, que casais formados por filhos únicos tenham um segundo bebê. Nas áreas rurais, famílias cujo primeiro filho seja menina (o que, para a cultura machista chinesa, é motivo de preocupação quanto à sobrevivência do sobrenome, que é transmitido pela linha paterna) também podem tentar uma segunda criança.

Difícil, mesmo, é convencer as mulheres, em especial as das cidades, ao segundo filho. E, com uma sociedade mais crítica, impor uma regra forçando o aumento da família não parece ser uma opção para o governo. Um belo problema.

No dia seguinte, decidi desfilar meus novos conhecimentos na hora do cafezinho. E os colegas, que falavam do Corinthians, não deram a menor bola: “Agora não, Kung-Fu”, desdenharam. É a tal maldição do especialista. Como não entendo nada de futebol, voltei para a bancada rapidinho. Até que o Corinthians jogue na China, desconfio, fico na geladeira.

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