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Zequinha é uma criatura fina, daquelas que as moças do escritório, para inveja geral da nação, chamam de “querido”. Gente boníssima, sempre elegante e perfumado. Perfumado até demais, de fato. Verdadeiro assediador nasal, vetor aromático de alergias, segundo os críticos. Maldades à parte, o fato é que Zequinha se amarra numa fragrância. Não pode ver uma loja de aeroporto que já some lá dentro em busca das melhores essências. Conta-se no cafezinho que, uma vez, foi ao Egito e desapareceu. Teria sido encontrado dias mais tarde saindo, meio amarfanhado, do antigo mercado do Cairo, com os bolsos vazios e a frasqueira cheia de vidrinhos ambarinos.

Quando ia ao Paraguai, então, voltava escoltado pelo Paco Rabanne e pelo Calvin Klein. Com o dólar nas alturas, não tem viajado e anda até meio tristonho por isso, mas só por ser obrigado a ficar longe do dernier cri perfumístico – o armário do banheiro dele, imagino, é a própria despensa alquímica.

Pois ele entra na sala e, emitindo aquele sorriso misterioso, olha de lado e pergunta: “Sentiu?” Opa, senti – desde a esquina. “Sim, mas não consigo identificar. Seria... madeira?”, você arrisca, só para produzir o mote da esperada confissão condescendente. “Fougère Royale. Samambaia. Nem produzem mais”, floresce. Samambaia. Naquele momento, com efeito, Água Verde, Batel e parte do Centro aderiram ao Fougère Royale.

Zequinha se amarra numa fragrância. Não pode ver uma loja de aeroporto que já some lá dentro em busca das melhores essências

Com tamanho conhecimento, bem que Zequinha poderia dedicar-se profissionalmente à perfumaria. Largar esse negócio de contabilidade e lançar, sei lá, uma “Linha Z”. Só não vai por aí, alega, por não ter nariz para tanto. Tolice – falta apenas acertar na calibragem. Desconfio, enfim, que ele seja mais um “gourmand olfativo” do que qualquer outra coisa.

Pois outro dia chegou ao escritório cheirando a nada, exatamente como o personagem de Patrick Süskind em O Perfume. Nem mesmo a sabonete Phebo, constatei. Trabalhou como sempre, gentil e solícito, mas, em certa dimensão, não estava lá. Foi quando percebi a grandeza das representações humanas: Zequinha era ele e o seu perfume; sem perfume, não era ele. O povo até cochichou na cozinha, mas acabou quieto de tamanha inquietação.

No dia seguinte, glorioso, Zequinha voltou cheirando como há muito Curitiba não sentia. Samambaia, tabaco, sândalo e crisântemo combinados em uma névoa bizantina. Alegria geral. O gap da véspera entrou para o rol dos mistérios insolúveis que merecem ser esquecidos. E todos espirraram felizes pelo resto da semana.

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