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Confesso, um tanto constrangido, que história do Brasil nunca foi um de meus grandes campos de interesse. Minha desculpa, em princípio, é a mesma de tanta gente em relação à matemática: não gostava porque, na escola, a disciplina era ensinada em paralelo à realidade, sem qualquer conexão com o preço do pão d’água. Justificativa frágil, inclusive porque no colégio tive professores capazes de somar rigor e beleza, deixando o romantismo de lado na hora da avaliação. Eu nunca me interessei por história do Brasil porque gostava muito mais dos assírios e dos babilônicos, lista de faraós na ponta da língua para a disputa que nunca veio.

Eu não fazia ideia da quantidade de lances e questões envolvidos na transferência da corte portuguesa para o Brasil

Ao longo dos anos, esse distanciamento perdeu força por causa da leitura de não historiadores de ofício, figuras como Euclides da Cunha, Sérgio Buarque de Holanda, Nelson Werneck Sodré e Luís da Câmara Cascudo. Cascudo, aliás, merecia ser redescoberto por nossos jovens até para que eles tivessem uma noção de todas as cores que deixamos escapar por entre as ruas da metrópole.

Nos últimos dias, minha estima pela história do Brasil ganhou um belo reforço graças à leitura de A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis, da antropóloga e historiadora Lilia Scharwcz. Comecei a ler por causa do tema – o nascimento da nossa Biblioteca Nacional – e acabei envolvido por episódios como o terremoto que destruiu Lisboa em 1755, a ascensão do Marquês de Pombal ao poder de fato e a fuga da família real portuguesa ao Brasil, em novembro de 1807. Não fazia ideia, por exemplo, da quantidade de lances e questões envolvidos na transferência da corte. Até então, o episódio parecia apenas uma tremenda demonstração de covardia, uma conduta que combinava perfeitamente com a representação mambembe do país construída graças à estima dos nossos políticos pela sobrevivência.

Também curti imensamente vislumbrar o choque de contato entre os nobres portugueses – protagonistas de uma das mais curiosas cortes da Europa, situada entre o tridentinismo e as Luzes – e os brasileiros. Dá para imaginar, por exemplo, como foi, para o séquito real saindo meio amarfanhado de navios precários, encontrar o povaréu mulato e colorido, fruta madura na mão, na primeira parada em Salvador. Pode-se entender, inclusive, por que temos tantos reis e rainhas em nosso carnaval, como bem observou a própria Lilia Schwarcz em uma entrevista para a Revista da Biblioteca Nacional.

Em síntese: leitura boa, que faz pensar e até estimula o leitor a escrever. Haverá coisa melhor no mundo das ideias?

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