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O caminhoneiro Márcio Ferraz incentiva os filhos de 14 e 9 anos a pegar o volante e diz que a filha de 6 anos dirige bem | Dirceu Portugal/Gazeta do Povo
O caminhoneiro Márcio Ferraz incentiva os filhos de 14 e 9 anos a pegar o volante e diz que a filha de 6 anos dirige bem| Foto: Dirceu Portugal/Gazeta do Povo

Jovens flagrados dirigindo são encaminhados para palestras

Embora seja considerada uma medida socioeducativa inovadora no Paraná, o ciclo de palestras sobre trânsito a adolescentes flagrados na direção teve apenas uma turma desde agosto do ano passado, quando foi lançada. Na época, 15 jovens e seus responsáveis participaram do encontro promovido por uma parceria entre a Vara do Adolescente Infrator e o Departamento de Trânsito do Paraná (Detran). Os dois órgãos afirmam que uma nova turma deve ser convocada para assistir a palestras pré-agendadas para o mês de fevereiro. A expectativa é de que outros 15 adolescentes participem da atividade.

Demora

O período eleitoral e o número insuficiente de jovens para montar uma nova turma foram os fatores apontados para a demora entre um ciclo de palestras e outro. De acordo com a técnica judiciária da Vara do Adolescente Infrator, Rosemary Oliva, mesmo passados alguns meses do delito, a demora não compromete a aplicação da medida. Os adolescentes podem cumprir a determinação do juiz até os 21 anos de idade e, dependendo da gravidade do ato infracional, como o envolvimento em acidentes com vítimas, a medida pode ser mais severa.

Curitiba e Campo Mourão - Se na cidade grande adolescentes já saem com o carro dos pais pelas ruas, no interior essa prática é ainda mais recorrente. Márcio Cardoso Ferraz começou a dirigir motocicleta aos 12 anos na propriedade rural onde morava, em Araruna, no Noroeste do Paraná. Aos 13 anos, para ajudar o pai na roça, começou a dirigir o trator da família. A fascinação pela direção levou Ferraz, hoje com 32 anos, a optar pela profissão de caminhoneiro. "Comecei a dirigir cedo por paixão pelo volante e não por necessidade", conta. Ele lembra que enquanto o funcionário não liberasse o volante, não descia do trator. "Era um piolho da máquina, infernizava a vida do funcionário até liberar a direção", diz.

Com dois filhos de 14 e 9 anos e uma menina de 6 anos, Ferraz conta que já começou a incentivar os filhos a pegar o volante. "Quando vamos para o sítio, a menina senta no meu colo e vai guiando o carro, ela dirige bem. Como tive a oportunidade de aprender a dirigir cedo, não vou barrar meus filhos", argumenta Ferraz. Entretanto, apesar de incentivar as crianças a dirigir, ele garante que não vai liberar o carro antes de os filhos tirarem a carteira de motorista. "Se der al­­­­gum problema, serei o responsável. Dirigir é só no sítio, onde não há perigo de atropelar ninguém", diz.

Marcelo (nome fictício) tinha 14 anos, morava em uma propriedade rural, próxima a Campo Mourão, quando seu pai o incentivou a dirigir. O estímulo, segundo ele, era para que quando os pais precisassem de ajuda, ele soubesse dirigir. Na primeira tentativa, enquanto a família dormia, o rapaz bateu no paiol do sítio. "Ele [o pai] ficou muito bravo e disse que me ensinaria a dirigir. Ele me levou na Estrada Boiadeira. Foi lá que eu aprendi", conta.

Hoje, com 43 anos, Marcelo já ensinou o filho de 13 anos a dirigir. "Ensinei por instinto. Ele só anda nas ruas do bairro ou no sítio dos avós. Algumas vezes foi no mercado. Sempre alerto para não abusar da velocidade", comenta. Marcelo acredita que ensinar o filho a dirigir sem ter idade para tirar a carteira também trouxe problemas a família. "Mesmo pedindo para não sair com o carro, nos finais de semana, sou obrigado a esconder a chave."

Do portão para dentro

Em Curitiba, a professora Simone Negrello costuma dialogar com seu filho Felipe Augusto Negrello, 16 anos, sobre a responsabilidade e os riscos que envolvem o ato de dirigir. O adolescente aprendeu a conduzir aos 13, mas isso não significa que ele saia pelas ruas conduzindo o carro da família, atividade que faz apenas no pátio de casa, "do portão pra dentro". Ela conta que em casa todos são adeptos ao pensamento de que toda ação acarreta uma reação. "E às vezes a reação não é tão boa. Eu brinco com meu filho que não tenho dinheiro para bancar o que vem depois e muitas vezes acontecem coisas que o dinheiro não paga", afirma.

Para reforçar o argumento, Simone recorre ao passado da família, que teve casos de adolescentes motoristas. O tio do garoto foi detido algumas vezes por dirigir indevidamente e coube ao avô contornar a situação embaraçosa. "Estes jovens são muito da geração do ‘não dá nada’, eles estão demorando muito para amadurecer", avalia a professora.

Mesmo com a vontade de poder dirigir e contando os anos para começar com o processo de habilitação, Felipe sabe que terá de esperar até os 18 anos e concorda com a determinação da mãe. Para ele, ter acesso ao carro garantiria comodidade e rapidez para ir à escola ou à casa de amigos, mas o risco de ser pego em uma infração ou até mesmo se envolver em acidentes faz com que ele prefira aguardar a idade correta. "É por isso que eu não insisto em sair com o carro", conta o jovem.

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