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Rafael Bortolasso e a mãe Shirle, no Jardim Santa Rita, Tatuquara: doações para manter adolescente em escola diurna | Pedro Serápio/Gazeta do Povo
Rafael Bortolasso e a mãe Shirle, no Jardim Santa Rita, Tatuquara: doações para manter adolescente em escola diurna| Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo

Aluno tem direito a escolher turno

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação dá direito ao aluno trabalhador estudar no período noturno. Porém, segundo ressalta a promotora de Justiça Hirmínia Dorigan de Matos Diniz, coordenadora do Centro de Apoio de Proteção às Promotorias de Educação do Ministério Público Estadual, o adolescente deve ter a opção de escolha sobre qual período pretende estudar. "O noturno tem de ser uma exceção para a pessoa que necessita trabalhar durante o dia. O estado tem de oferecer preferencialmente as vagas durante o período diurno, principalmente se os adolescentes ficam expostos à violência", diz.

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  • Veja o número de vagas ofertadas no ensino médio diurno de 2007 a 2009

Pais de adolescentes estão obrigados a matricular seus filhos no período noturno por não encontrar vagas nas escolas públicas para o ensino médio durante o dia. O problema foi constatado em Curitiba, São José dos Pinhais e no município de Ipiranga, nos Campos Gerais. São pelo menos 228 adolescentes que estão fora da escola porque têm medo de estudar à noite. Os dados são do Ministério Público Estadual e de quatro conselhos tutelares de Curitiba. A Secretaria de Estado da Educação não tem registros oficiais dos casos e tem como meta atender 100% da demanda para o ensino médio diurno até 2010. Porém, a secretaria não informou qual o número de adolescentes que preferem estudar durante o dia.

Só na capital, o medo tirou 173 adolescentes dos bancos escolares neste início de ano letivo. O número refere-se a casos verificados pelos conselheiros tutelares nas regiões do Pinheirinho, Cidade Industrial, Bairro Novo e Boa Vista. O prejuízo pode ser ainda maior, pois nem todos os conselhos contabilizaram os dados, como no caso do Portão e Santa Felicidade. A conselheira tutelar do Bairro Novo, Silvana Bernardino, explica que a falta de estrutura física é a justificativa dada pelas escolas da região onde atua. "A prioridade é dada para a oferta de matrícula até a 8ª série, que é obrigatória. Mas a obrigação do estado é oferecer educação continuada. Essa é uma das causas da maior evasão no ensino médio. O acolhimento não existe nem na matrícula", diz.

A evasão do ensino médio é um dos principais desafios da educação pública brasileira. As taxas de evasão e repetência nacionais chegam a 32,6%, segundo o censo de 2007 do Ministério da Educação. A estimativa do MEC é que pelo menos 6 milhões de adolescentes com idade entre 15 e 17 anos estão fora das salas de aula do ensino médio. "É difícil ver o jovem querer estudar e não conseguir", diz Silvana.

Medo da violência

A adolescente Juliana (nome fictício), 16 anos, está fora da escola porque não conseguiu se matricular de manhã, no segundo ano do ensino médio, no Colégio Estadual Padre Cláudio Morelli, no Umbará. Transferida no fim do ano passado por mudar de bairro, a estudante teve prejuízos no rendimento escolar, o que culminou em sua reprovação. "Ela ia muito bem nos estudos, nunca tinha perdido nenhum ano até começar a estudar à noite", diz a mãe da menina, a auxiliar de cozinha Mariana, 40 anos (nome fictício).

O medo da violência e a dificuldade de adaptação levaram Juliana a desenvolver um início de depressão. Nem o atestado médico garantiu o direito à vaga durante o dia para a adolescente. A mãe recorreu ao Conselho Tutelar do Bairro Novo, que está encaminhando o caso ao Ministério Público Estadual. "Ela chora muito e tem medo de ir para a escola. Só que à noite eu teria de pagar transporte escolar para ficar mais seguro e não tenho condições porque meu marido está desempregado. São 30 minutos de caminhada, e a maior parte do caminho é mato. Por causa disso também estou arriscada a perder o Bolsa Família", diz a mãe.

Já o estudante Rafael Bortolasso, 15 anos, precisou contar com a ajuda de amigos e familiares para continuar os estudos. Morador do Jardim Santa Rita, no Tatuquara, não conseguiu transferência para o 2º ano do ensino médio diurno no Colégio Estadual Guilherme Maranhão. Há um mês a família de Rafael mudou-se do município de Santa Amélia, na Região Norte, para Curitiba. "Tenho medo. Já fui assaltado aqui durante o dia, imagine à noite", diz.

A diretora auxiliar do colégio Ana Margarete Alcaide explica que a prioridade é ofertar o ensino fundamental durante o dia. Das 800 vagas para o ensino médio que dispõe o colégio, 200 são para o período da manhã e as outras 600 para o turno da noite. "Falta estrutura física. Isso que o colégio foi reformado recentemente e ganhou um prédio novo há dois anos. Mas a região cresceu muito rápido", diz.

A mãe de Rafael, a empregada doméstica Shirle Bortolasso, 36 anos, conta que garantiu a vaga de seu filho para o turno da manhã no Colégio Estadual Narciso Mendes, no Xaxim. O adolescente vai precisar pegar três ônibus para vencer o percurso todos os dias até chegar à escola. "Foi o único jeito que consegui para não deixar o menino sem estudo. Não tenho condições de pagar a passagem dele. Mas acho que vou conseguir doação", diz.

Outros casos

No município de Ipiranga, segundo a promotora de justiça Hirmínia Dorigan de Matos Diniz, 55 adolescentes da zona rural estão sem estudar porque suas famílias têm medo de mandar seus filhos à noite para a escola. A preocupação é com a falta de segurança. "Mesmo com transporte escolar os pais têm medo", diz. Segundo a diretora de administração escolar, Ana Lúcia Schullan, o problema em Ipiranga é pontual e deve ser resolvido com a implantação de um turno intermediário para atender esses estudantes até que uma escola em construção seja concluída.

Em São José dos Pinhais, o diagramador Marcelo Jaques, 35 anos, conta a dificuldade que teve para encontrar vaga para a sua filha Amanda, 14 anos, durante o dia. "Agora conseguimos a matrícula em outro local, mais perto de casa, só que ainda à noite. Ainda acho perigoso, mas não posso deixar minha filha fora da escola", diz. A apreensão de Marcelo é com relação à segurança de sua filha. "É complicado. Acho que deveria ser proibido estudar à noite antes de completar 18 anos", diz.

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Serviço

A Secretaria de Estado de Educação mantém um serviço exclusivo para receber reclamações sobre vagas na rede estadual. O número é 0800-643-2643.

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