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Dona Netinha, aos 82 anos, viúva há 13, gerencia uma lotérica e faz cursos | Henry Milléo/ Gazeta do Povo
Dona Netinha, aos 82 anos, viúva há 13, gerencia uma lotérica e faz cursos| Foto: Henry Milléo/ Gazeta do Povo

Sem largar a aliança

Poucos apostadores da Lotérica Princesa, em Ponta Grossa, sabem que, por trás de todas aquelas cabines de atendimento, Maria da Conceição Figuei­­redo está em plena atividade. Aos 82 anos, ela faz o controle diário de todos os jogos. Na mão esquerda, a aliança revela o casamento de uma vida inteira. "Jamais arrumaria um marido igual", diz Dona Netinha, como é chamada entre os amigos.

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"Olé!" na solidão

Idosos tendem a sentir de maneira muito mais forte a ausência do companheiro. Para contornar a solidão, o psicólogo Guilherme Falcão dá algumas dicas para enfrentar esse momento de maneira menos dolorosa. Filhos também podem ajudar nesse processo de mudanças. Confira:

1 - Participar de grupos sociais – "O idoso que não sai de casa e ficar só em frente à televisão, por exemplo, tende a ficar com medo do mundo", alerta o psicólogo. Segundo ele, cultivar amizades e uma rede social é fundamental para a saúde mental e física do idoso. "Os grupos de terceira idade têm efeito terapêutico", afirma.

2 - Renovar os laços familiares – Se a viuvez pode ser um bom momento para estreitar alguns laços familiares, falar sobre essa possibilidade futura com antecedência pode ajudar na superação posterior. "Às vezes, os próprios filhos boicotam o novo casamento dos pais. Por dependência. O que a gente recomenda: que os idosos conversem sobre isso até antes da viuvez, com o próprio cônjuge e os filhos", aconselha o especialista.

3 - Manter a autonomia – Outro aspecto importante após a viuvez é não se prender à proteção dada pelos filhos. "A dica é que os filhos não fiquem querendo superproteger. É preciso incentivar a independência, estimular para que os pais participem de outras atividades. Quanto mais tentam proteger, mais o idoso fica dependente, tanto física quanto emocionalmente", diz Falcão.

4 - Aceitar uma nova união – Caso seja da vontade do idoso, a chance de casar novamente não pode ser descartada. Uma nova união pode dar ao idoso a chance de compartilhar o dia a dia e aprender ainda mais. "O que percebo é o seguinte: quando a pessoa teve um bom casamento, há tanto o receio de ter na segunda união um mau casamento quanto a vontade de casar novamente para repetir a boa experiência". Após o casamento, a sexualidade fica por decisão do casal. "Essa história de que o idoso não sente mais desejo, por exemplo, é mentira".

5 - Investir em novos projetos – "Pela questão social e financeira, muitos idosos hoje em dia até voltam a trabalhar", observa Falcão. Com a viuvez e o tempo mais livre na terceira idade, o idoso pode investir em projetos que antes não tinha tempo de executar. Assim, além de superar a dor, é possível até descobrir um talento novo. "A falta de atividade pode gerar uma situação de estresse", diz o especialista.

  • Odete e José: viúvos recém-casados
  • Morte precoce do marido de Sônia a levou a assumir a família

Ponta Grossa - O casamento de Maria Odete Oliveira, 54 anos, e José da Rosa, 61 anos, foi um capítulo à parte na vida dos dois. Viúva havia mais de dez anos, Odete não tinha planos de procurar um novo parceiro – e estava seguindo a ideia à risca. Ainda abatido na época pela perda recente da esposa, José também não esperava engatar um novo relacionamento. "Falei para os meus filhos que ia viver só para os netos. E então eu a conheci", relata, apaixonado.

Juntos desde outubro do ano passado, o casal representa algumas diferenças comuns entre homens e mulheres no modo de encarar a viuvez. A experiência tende a ser ainda mais difícil na terceira idade, quando o falecimento indica a ruptura de décadas de união e parceria. Odete foi casada por 27 anos; José, por 38. Ambos tiveram filhos com os antigos companheiros.

"A reação do idoso à viuvez depende de como a família encara a dor e o sofrimento", explica o psicólogo e gerontólogo Gui­­lherme Falcão, da seção paranaense da Sociedade Brasileira de Geriatra e Gerontologia (SBGG). As diferenças de gênero são a característica mais visível do processo. Embora elas estejam em maioria entre os idosos viúvos – só o Brasil tem 3 milhões de mulheres a mais do que homens, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) –, são eles que mantêm ativa a tradição de subir ao altar.

Dos mais de 25 mil casamentos com pessoas viúvas de todas as idades nos últimos anos, 16 mil tinham como um dos noivos um homem viúvo. Destes, pouco mais da metade tinha mais de 60 anos quando partiu para a segunda ou terceira união. Ou seja: enquanto 8 mil homens se uniram de novo a outras mulheres, em sua maioria solteiras, a maior parte das viúvas idosas continuou só (veja box).

É o caso de Sônia Ferreira, 63 anos. Ela perdeu o marido aos 48 anos. "Meu marido se acidentou. Foi uma viuvez precoce e eu não estava preparada", conta. A superação do luto veio acompanhada das responsabilidades com a família. "O meu caçula tinha acabado de entrar na faculdade na época. Eu tive de lutar com unhas e dentes e mandar ver", relata Sônia, que trabalhava como costureira.

Hoje, com os três filhos já formados, ela participa de projetos de voluntariado e diz que não pretende se casar novamente. O calendário de atividades é dividido entre visitas a pessoas carentes como uma das líderes das pastorais da Criança e da Pessoa Idosa, os cuidados à saúde do pai e as antigas costuras. Quando não está com os amigos ou a família, Sônia também se dedica a cuidar da casa, onde mora sozinha. "Tenho minha vida própria", afirma.

Eles por elas

O psicólogo Guilherme Falcão explica que a diferença de comportamento entre homens e mulheres tem características que se acentuam na terceira idade. "O homem tem mais dificuldade de interagir socialmente. Ou ele casa mais rápido ou ele fica preso no panorama familiar", analisa Falcão. "Já a mulher tem o baque da perda, mas busca outras coisas para fazer. Ela procura se ocupar para trabalhar a dor que ela está sentindo e amplia a participação social", relata.

Para Falcão, independentemente da variação entre os gêneros e dos planos a seguir, o idoso precisa entender a morte como algo natural. Segundo ele, compreender que a viuvez é parte do processo da vida é o primeiro passo para obter a segurança necessária para trilhar novos caminhos. Essa forma de comportamento ajuda, inclusive, a manter a saúde do idoso em dia. "A medicina psicossomática explica isso. Se a gente fica emocionalmente fragilizado, o nosso organismo também fica. Daí o aparecimento de algumas doenças".

Os filhos e netos também têm papel fundamental para a superação do luto. O especialista recomenda que os familiares não passem a fazer tudo pelo viúvo só por causa dessa situação. "Esse ‘fazer tudo’ só piora a saúde do idoso, que precisa de autonomia", alerta o gerontólogo.

Unidos como nunca, Odete e José acabam de formar uma nova família com base nesses conselhos. O casamento foi celebrado com pompa e circunstância. Só não teve mesmo sol e chuva, na contramão do provérbio popular. "Mas teve dama de honra na igreja e tudo", brinca a noiva.

O novo "sim"

O casamento de idosos viúvos é diferente entre homens e mulheres. Eles, em geral, partem para a segunda ou terceira união muito mais rápido do que elas. Veja os dados da pesquisa de Registro Civil feito pelo Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE), em 2007:

Homens

16.294 foi o total de casamentos com homens viúvos, de todas as idades, registrados no último levantamento do IBGE. Destes, 8.877 homens tinham mais de 60 anos quando decidiram se casar de novo. Pelo menos metade desse grupo escolheu para a união mulheres solteiras. O restante se dividiu entre viúvas e divorciadas.

Mulheres

No mesmo estudo, só 3.478 mulheres viúvas com mais de 60 anos casaram de novo. E 60% delas – ou 2.023 – subiram ao altar com homens também viúvos. A pesquisa ainda mostra que elas têm outras particularidades. Enquanto eles casaram com mulheres de idades variadas, elas preferem homens com mais 60 anos.

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