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Associação vê vantagens na plantação de pinus

O Brasil expande em 47 mil hectares por ano suas florestas de pinus, mas precisaria plantar mais 53 mil hectares para atender às necessidades da construção civil, do setor moveleiro e da indústria de celulose. O déficit obriga o país a importar 150 mil metros cúbicos por mês, vindos principalmente da Argentina. Nas palavras do presidente da Associação Paranaense de Empresas de Base Florestal, Roberto Gava, o setor vive um "apagão florestal". Segundo ele, não se planta mais por falta de planejamento dos governos estadual e federal. O primeiro já está negociando iniciativas para regular novos reflorestamentos.

A situação estaria ainda pior não fossem os 120 mil hectares reflorestados no Vale do Ribeira. "No início diziam que era uma loucura plantar ali", lembra. Hoje a região é o fiel da balança para o setor. Dali saem por mês 400 mil metros cúbicos de pinus, o equivalente a uns 10 mil caminhões ou 500 mil árvores. Gava calcula em 6.400 os empregos diretos no corte de madeira, outros 2.150 na incipiente indústria local e mais 2.600 em municípios de outras regiões graças à madeira que chega do Vale do Ribeira. Ele não aceita as queixas de que o setor pouco retribui aos municípios onde exploram o pinus. E dá uma dica a que reclama.

Na declaração de movimentação econômica, quem beneficiará a madeira pode declarar a origem, dividindo assim o faturamento entre o município produtor e o que beneficiou a matéria-prima. A declaração entre na base de cálculo do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), principal fonte de renda das pequenas cidades. Uma forma de deixar mais recursos na região é incluir as pequenas propriedades na cadeia produtiva do pinus. Gava analisa a floresta como uma poupança verde. A vantagem, diz ele, é que se o mercado não estiver bom, o produtor pode deixá-la de pé, até o preço melhorar.

Gava encontra vantagens para o reflorestamento até na preservação ambiental, em relação a outras culturas. A soja, por exemplo, principal produto de exportação do agronegócio brasileiro, precisa remexer o solo a cada seis meses. "No complexo floresta, quando se mexe é uma vez a cada 20 anos", compara. Ele continua na comparação: a soja ocupa 20% das terras do agronegócio; o milho, 12%; a produção de carnes (gado, suíno e aves), 20%; enquanto o complexo floresta ocupa 3%. Já na balança comercial, o Paraná exportou no ano passado US$ 1,987 bilhão em soja, US$ 1,214 bilhão do complexo floresta e US$ 1,025 bilhão de carne.

Todos os meses 500 mil árvores vem abaixo na margem paranaense do Vale do Ribeira, que somada à porção paulista forma a maior área contínua da Mata Atlântica brasileira. O pinus, espécie trazida da Austrália pela indústria madeireira, já se infiltrou em 10% deste território e sua importância pode ser medida na balança comercial. As empresas de base florestal geram 8.500 empregos diretos no lado paranaense do Ribeira e ajudaram a levar o setor à vice-liderança nas exportações do agronegócio do Paraná. Em 2006, o estado exportou US$ 1,987 bilhão de soja e derivados e US$ 1,214 bilhão do chamado complexo floresta.

Este é o lado bom do negócio, que chega a entusiasmar. Mas há o reverso, oculto e feio, igualmente medido em números. Das 40 grandes reflorestadoras do vale, 32 foram ou estão sendo investigadas pela Procuradoria do Ministério do Trabalho por submeter operários a regime similar à escravidão e outro tanto responde a 381 infrações emitidas pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP) por corte ilegal de madeira, destruição de olhos-d'água e demais crimes ambientais. A escravidão começa na terceirização dos serviços, diz o procurador do Trabalho Gláucio Araújo de Oliveira. Um sistema piramidal que às vezes foge do controle de quem está no topo.

Em geral, o empresário delega ao gerente a tarefa de formar a equipe. Este contrata um empreiteiro, que recorre a outro para arregimentar operários. Nesse meio surge o "gato", quem de fato fará a contratação. Para reduzir despesas, ele submete os peões a condições precárias. Foi assim com 85 deles encontrados em regime de escravidão em maio de 2005 em Tunas do Paraná. Outros 24 foram retirados em dezembro passado de uma fazenda de pinus em Bocaiúva do Sul, na região metropolitana de Curitiba. Além das condições subumanas, eles tinham de gastar todas as diárias, entre R$ 10 e R$ 15, com alimentação e moradia oferecidas pela própria empresa.

Já as autuações do IAP se intensificaram em 2003, com o Programa Força Verde. A fiscalização era coisa rara. Sequer havia um sistema de registro dos autos. O IAP diz ter reduzido o desmate irregular. Não só isso: vê o pinus como melhor opção econômica para o Vale do Ribeira, devido ao declive dos terrenos e à fragilidade do solo. "Se comparada a outras atividades [pecuária, agricultura e citricultura], a exploração de pinus pode ser considerada boa para o meio ambiente pois apresenta menor impacto, apesar do choque visual do corte raso que geralmente ocorre, que é permitido pela legislação ambiental", informa o IAP. Há quem discorde.

As copas verdes e pontiagudas que dominam a paisagem do Vale do Ribeira nem sempre são sinal de vitalidade. O plantio não é ruim, mas traz riscos, segundo o diretor de mobilização da Fundação SOS Mata Atlântica, Mario Mantovani. O risco está na opção pela monocultura. A região segue neste rumo faz tempo, mas só agora começa a se dar conta. A população de hoje paga pela escolha errada de 50 anos atrás, diz o diretor executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), Clóvis Ricardo Schrappe Borges. O plantio de pinus iniciou-se no final dos anos de 1960, quando o estoque em pé da madeira nativa dava sinais de escassear.

Uma das alternativas seria reflorestar a região com espécies nativas, mas não foi esta a escolha. As florestas de pinus, originárias da Austrália, cresciam adubadas pelos incentivos fiscais do governo federal. Naquela época, a ditadura militar exibia em eventos internacionais faixas dizendo aceitar de braços abertos a poluição dos países industrializados em troca de um punhado de dólares. A atitude não poderia resultar em boa coisa. Foi nesta ocasião que mais prosperou um negócio do qual jamais se esquecerão os habitantes de Adrianópolis, um dos municípios mais pobres do paupérrimo Vale do Ribeira.

Pertencente à multinacional Penarroya, a Mineradora Plumbum rasgou as entranhas dos morros de Adrianópolis e extraiu dali uma fortuna equivalente a US$ 226,8 milhões em ouro, prata e chumbo. Ao falir, em 1995, virou as costas e deixou para trás uma montanha de 347 mil toneladas de lixo tóxico, que ainda contamina o meio ambiente e as pessoas do lugar. Parece sina, mas a história está prestes a se repetir. O secretário de Agricultura e Meio Ambiente de Adrianópolis, Elísio Avelar da Silva, vê na indústria do pinus uma Plumbum rediviva. "Eles ficam com o bônus e nós ficamos com o ônus", teoriza.

Já o prefeito Osmar Maia (PMDB) dialoga com números em mãos. O Imposto Sobre Serviços (ISS), que inclui a cota das reflorestadoras, responde por R$ 22 mil dos R$ 380 mil da receita municipal de cada mês. Ou seja, míseros 5,7%. A contribuição que realmente importa – o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – vai para onde se beneficia a madeira. O problema é que quase todo o pinus sai da região na forma de toras. O Vale do Ribeira não passa de "barriga de aluguel" para outros municípios.

Ali, em Doutor Ulysses, cidade de 7 mil habitantes com o segundo pior Índice de Desenvolvimento (IDH) do Paraná, a indústria madeireira pinga R$ 15 mil por mês nos cofres municipais. Mal dá 3% da receita. O que fica é uma miséria diante da exploração dos recursos naturais, queixa-se o diretor do Departamento de Utilidade Pública, Anildo Folle. As empresas, reclama ele, chegam sem avisar, plantam sem anuência da prefeitura, colhem a madeira sem recolher todos os impostos e levam a matéria-prima embora muitas vezes com mão-de-obra importada.

Sobra para os municípios os estragos nas estradas e as filas de doentes. Segundo Folle, operários machucados são deixados na porta do posto de saúde e a prefeitura tem de se virar para levá-los a Curitiba, distante 130 quilômetros. Há também os estragos sociais. A oferta de emprego no corte de pinus fez a população de Tunas do Paraná triplicar em cinco anos. Saltou de 3,6 mil habitantes em 2000, segundo o IBGE, para 13 mil em 2005, segundo a prefeitura. Seria ótimo, não fossem os problemas trazidos pelo inchaço populacional. Não há infra-estrutura para receber toda essa gente, diz a prefeita Nalinez Zanon. O maior problema é a falta de moradia.

O Vale do Ribeira é uma das áreas mais pobres do país, como revela o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Em 32 cidades da região, 500 mil pessoas convivem com alguns dos piores indicadores de renda, de longevidade e educação.

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