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Cela do 5º Distrito Policial, no Bacacheri, concentra homens que tiveram prisão decretada por deixar de pagar pensão aos filhos | Albari Rosa/Gazeta do Povo
Cela do 5º Distrito Policial, no Bacacheri, concentra homens que tiveram prisão decretada por deixar de pagar pensão aos filhos| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

Pagamento

Dívida persiste com prisão

Os quatro homens que estavam detidos no 5º DP de Curitiba, quando a reportagem esteve no local, imaginavam que a dívida com o pagamento de pensões caducaria com as prisões. No entanto, segundo a lei, a Justiça pode ainda executar e penhorar os bens dos réus, caso os pagamentos não sejam efetuados. E, se a pessoa não tiver bens, de acordo com a advogada Adriana Aranha Hapner, pode ser presa novamente.

Na avaliação da advogada, a falta de informação não é justificativa para o não pagamento. De acordo ela, os réus podem pedir ação de exoneração ou suspensão do pagamento ou até a revisão do valor determinado, caso realmente não tenham condições de pagar. "Não acho que seja falta de informação. É muito fácil de saber. Eles dizem não ter dinheiro, mas, às vezes, conseguem camuflar a informação", comenta. A advogada afirma que, muitas vezes, a ajuda com alimentos é válida também.

Segundo a desembargadora Joeci Machado Camargo, há diversas possibilidades de fazer com que a dívida seja paga. Em alguns casos, conta ela, o valor pode ser sacado até do FGTS ou direto da folha de pagamento do réu. Para a magistrada, nem sempre a solução é a prisão. Segundo ela, a prisão pode ser muitas vezes motivada por ressentimento, o que pode prejudicar os filhos. (DR)

Divergência

Tempo de encarceramento

Na prática, após o terceiro mês de atraso no pagamento de pensão alimentícia, a parte credora já pode ingressar na Justiça para que o devedor seja obrigado quitar a dívida em, no máximo, três dias. Neste período, ele pode explicar ao juiz se já pagou ou o motivo do não pagamento. Caso isso não ocorra, o juiz pode decretar a prisão do devedor. O problema é que há uma divergência jurisprudencial em relação a qual legislação regulamenta a prisão de presos por pensão alimentícia.

O Código de Processo Civil afirma que esses detidos podem permanecer presos entre 30 e 90 dias. Já a Lei 5.478 prevê tempo máximo de 60 dias. (DR)

O que o ex-jogador de futebol Romário, o humorista Zina, ex-integrante do "Pânico na TV", o cantor Waguinho e o baixista Edmilson Salvino têm em co­­mum? Resposta: os quatro já estiveram presos por deixar de pagar pensão alimentícia aos filhos. O pagodeiro Waguinho, como exem­­plo, em 2004, chegou a di­­vidir a cela com acusados de tráfico de drogas e roubo.

Em Curitiba, os pais que deixam de pagar pensão e têm a prisão decretada não ficam misturados a criminosos comuns – o que, aliás, está previsto em lei. Todos são encaminhados ao 5.º Distrito Policial, no bairro Ba­­cacheri, onde ocupam uma cela especial, com banheiro, chuveiro e três beliches. Há ainda outra cela adaptada, que pode ser usada dependendo do número de detidos.

Na semana passada, segundo o delegado Jairo Estorílio, o espaço era compartilhado por cinco homens que deixaram, ao menos temporariamente, de ajudar no sustento dos filhos. A ocupação estava abaixo da média mensal: normalmente oito presos ficam na cela, mas já houve situações em que o total chegou a 15 pessoas. O 5.º DP também recebe detidos da região metropolitana que tiveram a prisão decretada por falta de pagamento da pensão.

Sem dinheiro

A reportagem da Gazeta do Povo visitou a cadeia do 5.º DP na segunda quinzena de novembro. Um vendedor, um operador de máquinas, um descarregador de caminhões e um marceneiro dividiam a cela especial. Os saldos devedores dos quatro variavam entre R$ 7 mil e R$ 33 mil.

A justificativa de todos para deixar de pagar a pensão era a mesma: falta de dinheiro. E as ex-mulheres eram apontadas como responsáveis pela má sorte que se abateu sobre eles: "Ela precisa (do dinheiro), mas estou aqui mais pelo gostinho de ela de me ver aqui", reclamava João*, um dos detidos.

Vendedor autônomo, João era o que mais devia entre os presos: R$ 33 mil. Bem vestido, sapatos de couro, aparentava ser de classe média. "A gente fica nas mãos da ex-mulher", dizia, inconformado. O relacionamento com a ex gerou dois meninos, hoje com 15 e 16 anos, ambos moradores do Norte do Paraná. A dívida, segundo João, não é atual. Em 2005, ano da separação, ele ficou quatro meses sem pagar a pensão. "Aconteceu um imprevisto, não é malandragem. Nesses cinco anos eu sempre depositei, mas em 2005 ficou um tempo sem."

O descarregador de caminhão Renato* estava na cadeia há dez dias quando a reportagem passou pelo local. Ele relatou não ter emprego fixo, o que impedia o pagamento da pensão. Devia R$ 17 mil de alguns meses entre os anos de 2008 e 2009. "Moro na casa da minha irmã, por falta de dinheiro. Mas nunca deixei de cuidar do meu garoto", declarou o pai de um menino de 9 anos.

O operador de máquinas Pedro tem emprego fixo e ganha cerca de R$ 2 mil, mas alega que ficou de­­sempregado um ano e três meses, período em que ficou devendo a pensão. Hoje, Pedro deve para seus filhos R$ 20 mil. Além da filha com a ex-mulher, tem mais dois de outro relacionamento. O marceneiro Luiz*, que deve R$ 7 mil a um dos fi­­lhos, não quis conversar com a reportagem.

Alternativas

A prisão de homens que deixam de pagar a pensão alimentícia é uma forma de coerção, explica a desembargadora Joeci Machado Ca­­margo, especialista na área de família. E os motivos que levam a essa situação geralmente são recorrentes. "Temos três situações. A primeira é o homem que prefere ficar preso a pagar o alimento, às vezes até por uma re­­volta contra ex-mulher. A segunda é o do homem que não tem condições de pagar. E a terceira é o que levou um revés na vida, ficou doente, e está impossibilitado de prover os filhos temporariamente." Em todas as situações, há saídas na Justiça para evitar a prisão, pondera a desembargadora.

Na opinião da presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família no Paraná (IBDFam) e da Comissão de Direito de Família da Ordem dos Advogados do Bra­­sil, seção Paraná, Adriana Ara­­nha Hapner, quem está bem-in­­tencionado toma alguma providência que evita a prisão. Em muitos casos fica claro, porém, que, mesmo com condições de pagar, alguns pais deixam de fazer isso, mas, quando a prisão é decretada, acabam "dando um jeitinho". "Com frequência, ob­­ser­­vamos eles (os ex-maridos e pais) mantendo o mesmo padrão de vida, mas empobrecendo, de uma hora para outra, quando o assunto é o pagamento da pensão", ressalta a advogada.

*Por solicitação dos entrevistados, os nomes usados são fictícios.

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