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Socialismo, marxismo, capitalismo, nazismo, maoismo, imperialismo, islamismo, comunismo, moralismo... são tantos “ismos” aos quais qualquer um pode optar, mas o Paraná parece ter adotado outro, o abismo. Alguns aplicam o termo para se referir ao precipício em que caíram as finanças estaduais. Outros preferem correlacionar a palavra ao nome de Luiz Abi, o primo de quem se diz ter atuado com grande desenvoltura nos subterrâneos do governo.

Combustível para essa interpretação não falta. O Gaeco levou Luiz Abi preso por suspeita de que, sob sua orientação, uma licitação para contratar oficinas mecânicas para reparo de viaturas policiais teria sido fraudada. Mas os promotores de Londrina que cuidam do caso começam a enxergar ligações dele com outros presos acusados de operar um enorme esquema de sonegação tributária que teria dado prejuízo, estima-se, de R$ 500 milhões aos cofres públicos.

Na última sexta-feira (20), mais 17 personagens dessa história foram presos. Dentre eles, servidores da receita, policiais civis e empresários da área de distribuição de combustíveis. Eles se somam a outros investigados metidos em casos de pedofilia, exploração de prostituição e corrupção ativa e passiva na área da Receita Estadual. Não significa que os crimes – sexo ilegal e sonegação – fossem comuns aos dois grupos, mas os promotores estão intrigados com o fato de que vários nomes cruzavam-se nas duas esferas. E o mais impressionante é que alguns dos investigados faziam parte, oficial ou extraoficialmente, da corte palaciana.

O caminho a ser ainda percorrido pelo Gaeco é longo, mas os promotores começam a puxar liames que datam de 2011 – mesmo ano em que se iniciou o primeiro mandato do governador Beto Richa. Foi em 2011 que aportou no Paraná uma certa Refinaria de Manguinhos, na verdade apenas uma distribuidora de combustíveis.

Impedida de manter suas atividades no Rio de Janeiro por ter sonegado a quantia de R$ 800 milhões em impostos e recusada sua inscrição pelo Fisco paulista, Manguinhos misteriosamente conseguiu se inscrever como contribuinte na Fazenda do Paraná e se instalar em Araucária. Pouco tempo depois, acumulava uma dívida tributária da ordem de R$ 225 milhões, passando a figurar nos primeiros lugares da lista dos cem maiores devedores de impostos para a Fazenda estadual.

No Rio, segundo consta de investigação procedida pelo MP de lá, o dono da refinaria, Ricardo Magro, contaria com a proteção de ninguém menos do que do deputado fluminense Eduardo Cunha, figura hoje nacionalmente conhecida como presidente da Câmara Federal. A bem da verdade: nada se provou contra Cunha, apesar de indícios detectados pelo MP no inquérito 3056/RJ.

No Paraná, o então secretário da Fazenda, Luiz Carlos Hauly, não teria podido resistir ao suposto lobby que Luiz Abi teria exercido em favor de Ricardo Magro, o dono de Manguinhos, mas pelo menos conseguiu evitar que fossem nomeados para postos-chave da Receita Estadual nomes indicados por ele – o que talvez tenha custado a Hauly sua prematura saída do cargo de secretário.

Na última sexta-feira (20), o governador Beto Richa – coincidentemente ao lado de Eduardo Cunha, presente a um evento promovido pela Assembleia Legislativa sobre reforma política – mudou o tom. Quando Abi foi preso e confinado desde a semana passada numa dependência do Corpo de Bombeiros em Londrina, Richa apenas reconheceu nele um “primo distante” e nada mais falou sobre o caso.

Dada a insistência da imprensa, porém, na sexta-feira, o governador foi um pouco mais assertivo ao falar sobre o constrangedor episódio. Disse ele: “Eu nunca me escondi, minha vida é um livro aberto e todos sabem que eu sou intolerante com algo ilícito, sou intolerante com desvio de conduta, muito menos com corrupção”.

De fato, não há acusações formais contra Richa nem pesam sobre ele suspeitas verossímeis de que tenha protegido o “primo distante” em alguma ocasião ou, menos ainda, de que tenha se beneficiado de eventuais condutas impróprias de Abi.

O apego do governador aos valores éticos da administração pública não chega a significar que ele tenha “jogado às feras” o seu parente, mas também não evidencia vontade de ir mais além do que já está fazendo o Ministério Público por meio do Gaeco. Tanto que o líder do governo na Assembleia, deputado Luiz Cláudio Romanelli – por dever de ofício porta-voz do Palácio Iguaçu – tem combatido a proposta da oposição de criar uma CPI para investigar os desvios que teriam causado prejuízo ao Erário de meio bilhão de reais.

E assim ficamos todos nós presos no abismo da ignorância quanto à extensão da verdade.

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