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O presidente da Câmara dos Deputados suspenso, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ainda que não exerça o mandato, detém o poder sobre a consciência dos 225 parlamentares do “Centrão” e manipula aquela Casa como quer. Como conseguiu essa proeza só os vícios do sistema explicam. A sangria desatada descoberta na Operação Lava Jato envolvendo o grosso do sistema partidário, o toma-lá-dá-cá nas relações entre Executivo e Legislativo e as práticas patrimonialistas da burocracia estatal ajudam a compor o quadro de falhas graves da democracia brasileira. O diagnóstico do problema é conhecido. Mas ninguém concorda com as soluções, muito embora elas existam e esteja nas mãos dos cidadãos.

Com a grandiloquência de quem tudo quer mudar para que fique igual, as propostas frequentemente giram em torno de alterações legislativas de regras eleitorais, de mecanismos de representação, de sistema político. Tudo muito bonito, mas muito difícil e de resultado incerto. Certamente seria bom que algumas regras mudassem, que o sistema fosse mais aberto ao debate e os partidos não fossem capturados pelos oligarcas que surgiram após a redemocratização. Apostar nisso, entretanto, significa acreditar que os atuais mandatários do povo aceitariam de bom grado que os cidadãos retirassem deles as fatias de poder que apropriaram como fosse patrimônio pessoal.

A minha proposta é que a gente invada esse sistema. Antes de explicar “qual é o plano”, é necessário dizer que há duas categorias sociais de cidadãos relevantes para a análise: a dos comentadores de redes sociais e a dos ativistas “makers”. Os primeiros são irrelevantes para ajudar diretamente nas mudanças, mas importantes como microformadores de opinião. Os segundos são aqueles que realmente geram a transformação – eles já existem se organizam em coletivos, aliam tecnologia à aplicativos cívicos, estudam democracia e propõem mudanças, fiscalizam contas e licitações públicas. Juntos, todos são imbatíveis, especialmente quando os comentadores não se transformam em cegos militantes promotores da boçalidade partidária.

A ideia é que, a partir de um consenso “sobreposto” mínimo, fosse possível formar um movimento amplo nas 27 unidades da federação que partilhassem dos mesmos valores e propósitos. Por consenso “sobreposto” me refiro a uma ideia que empresto do filósofo John Rawls, e para a qual dou minha própria interpretação – uma concordância mínima sobre princípios e valores que todos devem seguir para proporcionar a liberdade de uma comunidade.

Um consenso mínimo dessa natureza permitiria que a gente focasse naquilo que é comum – uma defesa intransigente de valores e princípios, independentemente se os infratores são petistas, tucanos, peemedebistas ou qualquer outro membro dessas siglas. Fora o povo da moral flexível – “os integrantes do meu partido podem ser corrupto, mas, aos outros, o rigor da lei” – ninguém de mente sadia aceita desvio de dinheiro público, troca de apoio por benesses ou outras práticas patrimonialistas. Praticou ilegalidade, que seja preso sem o apoio do partido. Essa visão protege as legendas dos maus elementos que estiverem a dominá-las. A partir dessa concordância mínima hoje é possível a gente construir uma rede barata de apoio, práticas e pressão a todos que violarem esses princípios em qualquer lugar do país.

Não mais acontecerá um Eduardo Cunha. A rede dos ativistas vai pressionar sempre que preciso todos os deputados, entupir suas caixas de e-mails, telefonar à exaustão para seus gabinetes, fazer protestos, chamar para o debate e divulgar suas posições fisiológicas em suas bases eleitorais até que não reste mais voto a ser conquistado. E os comentadores vão poder exercer o que fazem de melhor, divulgar, discutir, retroalimentar a rede e, talvez, pegando gosto pela coisa, se tornem ativistas “makers” fortalecendo um movimento que vai, na prática “hackear” o sistema.

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