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Cunha (com o papel na mão): primeira grande derrota do “todo-poderoso” presidente da Câmara. | Zeca Ribeiro/Agência Cãmara
Cunha (com o papel na mão): primeira grande derrota do “todo-poderoso” presidente da Câmara.| Foto: Zeca Ribeiro/Agência Cãmara

financiamento de campanhas

Após decidir manter o atual sistema de votação para deputado e vereador, o plenário da Câmara começou a analisar as propostas de financiamento de campanha. Havia três alternativas: duas de financiamento misto (público e privado, com possibilidade de doações de pessoas e empresas; e público e privado com proibição de empresas financiarem candidatos)e uma proposta de financiamento eleitoral exclusivamente público. Até o fechamento da edição, a votação ainda não havia terminado.

A Câmara Federal rejeitou nesta terça-feira (26) à noite o “distritão” como formato de eleição para deputados e vereadores. Apenas 210 parlamentares se posicionaram a favor do modelo – outros 267 foram contrários. Eram exigidos 308 votos. Isso significa que o modelo atual de votação deve ser mantido, já que outros dois modelos propostos (lista fechada e distrital misto) também foram rejeitados na mesma sessão. A votação pode ser encarada como uma derrota para o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que tentou por todos os meios aprovar o “distritão”.

Financiamento privado de campanha é rejeitado

Numa decisão surpreendente, o plenário da Câmara rejeitou na madrugada desta quarta-feira (27) incluir na Constituição a permissão de que as empresas financiem as campanhas políticas. Capitaneada pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e pela oposição, a proposta teve apenas 264 votos a favor, 44 a menos dos 308 necessários.

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Votação favoreceu o “distritão”

Para garantir a aprovação do “distritão”, até mesmo a ordem da votação foi usada como arma pelo presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ao colocar sua proposta favorita como penúltima a ser votada, o presidente permitiu que partidos já comprometidos com outros sistemas mantivessem em plenário suas posições, mas sem prejudicar seus planos. Na prática, esses partidos fizeram um jogo duplo: deram um voto inútil para mostrar a seus filiados e um voto valiosíssimo para mostrar fidelidade ao homem mais poderoso do Brasil na atualidade.

De longe, parecia uma ideia arriscada: caso o voto em lista fechada ou o distrital misto conquistasse 308 votos, a carta do “distritão” automaticamente sairia do baralho. Entretanto, a jogada estava longe de ser um blefe. Ainda que não tivesse os votos suficientes para aprovar o “distritão”, o presidente contava desde o princípio com votos suficientes para derrubar qualquer proposta que não lhe agradasse – nesse caso, o número mágico é 206.

O PCdoB é um bom exemplo de como funcionou esse jogo. Historicamente, o partido sempre defendeu a adoção de listas fechadas. Ao público externo, seria difícil explicar uma mudança súbita de posição. Assim, Cunha propôs o seguinte acordo: na primeira votação, o PCdoB defenderia e votaria pelo voto em lista fechada. A proposta seria derrubada – logo, esse voto seria absolutamente inútil. Na votação do “distritão”, o partido apoiaria como uma espécie de segunda opção – o que de fato aconteceu.

Negociação similar foi feita com o PSDB. O partido já havia fechado questão sobre o voto distrital misto. Entretanto, a bancada divergia em relação ao que fazer caso o distrital misto não fosse aprovado. Jogando o “distritão” como última opção viável, Cunha permitiu que o partido liberasse seus deputados – podendo, assim, atrair parte deles para sua bancada.

Cunha negou que isso favorecesse um ou outro modelo. “Não tem essa de privilegiar uma ou outra proposta. Quem tiver 308 votos, leva”, afirmou. No final, apesar das articulações, colocar o “distritão” no final da lista não garantiu a aprovação da proposta defendida por Cunha.

Distritão misto

Uma proposta no mínimo curiosa foi apresentada de última hora pelo PDT: o “distritão misto”. Por esse sistema, que não é usado em nenhum lugar do mundo, metade dos deputados é eleita por lista fechada, e outra metade no sistema “distritão”. A proposta acabou sendo retirada de votação por acordo entre os líderes partidários. (AG e CM)

Desde o início do ano, Cunha defendeu uma reforma política ao redor desse modelo – no qual os candidatos mais votados são eleitos, independentemente do partido. Esse sistema jamais foi discutido seriamente no passado, por um motivo simples: trata-se de um modelo caro, pouco representativo, pouco democrático e que não é usado em nenhuma democracia séria. Mas Cunha tentou de todas as formas exercer seu poder para garantir os 308 votos necessários para que esse modelo seja adotado.

Pedra e laranja

A pedra no caminho de Cunha era o relator do projeto, Marcelo Castro (PMDB-PI). Apesar de ser um colega de partido, Castro cometeu dois “deslizes”: o primeiro foi montar um relatório independente. O segundo foi, publicamente, se posicionar contra o “distritão” – apesar de incluí-lo no relatório. A solução do presidente foi ignorar o relatório apresentado e, de última hora, nomear um aliado próximo, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para exercer esse papel em plenário.

Maia pareceu ser pouco mais do que um “laranja” de Cunha. Nas reuniões de liderança, era o presidente quem tirava todas as dúvidas sobre cada item que seria votado – citando de cabeça trechos das propostas. Além disso, citava de forma precisa fatos sobre a comissão da reforma política, da qual nem sequer fez parte.

Eliminado o primeiro obstáculo, Cunha se empenhou em conquistar mais votos para sua proposta – e minar alianças entre seus adversários. Ao PCdoB, que costumeiramente vota junto com o PT, garantiu apoio para evitar a aprovação da cláusula de barreira e do fim das coligações em eleições proporcionais – medidas que prejudicariam o partido. Deu certo: o partido, na tarde desta terça, aderiu à bancada do “distritão”.

Por volta das 17h, o deputado Sandro Alex (PPS-PR) recebeu uma ligação de Maia. O novo relator dizia que faltavam somente cinco votos para garantir a aprovação do “distritão”. Pediu os votos do partido, que defendeu o voto distrital, em troca da garantia de que três bandeiras do partido seriam votadas: o fim do voto obrigatório, um novo modelo de reaproveitamento de sobras eleitorais e a proibição de que deputados deixem seus cargos para exercer cargos no Executivo. Desta vez, o acordo não colou. O PPS se posicionou contra a proposta.

Cunha negou ter se movimentado para favorecer o “distritão”. Para ele, a avocação da matéria para o plenário é apenas uma demonstração de boa vontade para realizar a reforma. “Muitos passam o ano inteiro falando em votar a reforma política, mas na hora fazem justamente de tudo para não votar porque não é a reforma que eles querem”, declarou o presidente, alfinetando o PT.

Em duas horas de sessão, Cunha e seus aliados derrubaram, por goleada, as duas primeiras propostas votadas: de voto em lista fechada e de voto distrital misto. Entretanto, por volta das 22h, os deputados rejeitaram também o “distritão”. A Câmara deve concluir a votação da reforma ainda nesta semana, e o texto segue para o Senado.

PT articulou bloco para se contrapor ao presidente da Câmara

A reforma política voltou a colocar Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como principal adversário do PT. Às vésperas da votação, o partido teve de abandonar sua plataforma histórica de reforma política, que envolve a adoção do voto em lista fechada e o financiamento exclusivamente público, para tentar barrar o “distritão”. Acuado, o partido se aliou com partidos de oposição, como o PPS, o PSol, o PSB e segmentos do PSDB.

Candidato derrotado por Cunha à presidência da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP) deixou claro que o partido preferia manter o atual sistema do que adotar o “distritão”. “Entre aprovar uma contrarreforma e não aprovar nada, estamos considerando a segunda opção”, disse. Ele também criticou a mudança de relator feita na última hora, algo que ele disse nunca ter visto em mais de 20 anos de mandato.

Em plenário, o deputado Alessandro Molon (PT-RJ) fez apelos para que o PSDB ouvisse o senador Aécio Neves (PSDB-MG), que disse recentemente que o “distritão” é “o caminho mais rápido para o retrocesso”. Ele também frisou que apenas três países do mundo adotam o sistema. Os tucanos ficaram divididos em relação a essa questão.

Relator do projeto em plenário, Rodrigo Maia (DEM-RJ) retrucou dizendo que o financiamento exclusivamente público, defendido pelo PT, também não é usado em praticamente nenhum lugar do mundo, e disse que o PT tem “a campanha mais rica, alimentada pelo mensalão e pelo petrolão”.

Apesar de conseguir aglutinar vários partidos importantes, a frente “anti-distritão” teve sucesso. Juntos, PT, PSol, PR, PRB e PSB somaram 179 votos – e puderam contar ainda com parte do PSDB e de dissidentes de outros partidos. (AG e CM)

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