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O princípio da proporcionalidade, implícito ao ordenamento jurídico pátrio, analisado conjuntamente com a ideia de razoabilidade, existe como um instrumento de limitação do poder estatal, notadamente no exercício da função jurisdicional do Estado. Isto, pois, através desse princípio verifica-se a adequação/necessidade do ato praticado (decisão judicial), bem como a prevalência de determinados bens ou direitos protegidos e atingidos pela atuação do Estado, em detrimento de outros.

No caso da decisão proferida pelo Juízo da Vara Criminal de Lagarto/SE, onde foi determinada a interrupção dos serviços de comunicação do WhatsApp, percebe-se – independentemente do teor da ordem judicial não atendida e das demais nuances processuais, naturalmente desconhecidas ante o segredo de justiça estabelecido ao processo – que a sanção aplicada é desproporcional e desarrazoada, pois, no conflito entre o interesse do Estado em perquirir o cometimento de ilícitos e o direito da sociedade à comunicação, ceifou o direito da sociedade através de um ato de pouca adequação e necessidade.

Ambos os interesses em conflito são legítimos sob a ótica Constitucional, entretanto, o Estado possui outros mecanismos de investigação criminal que podem contribuir para a investigação em curso, sem que haja violação aos direitos de terceiros, de tal forma que não se pode imputar ao WhatsApp toda a força probatória da investigação criminal em curso na cidade de Lagarto/SE.

O WhatsApp integra um conjunto de instrumentos sociais de comunicação já incorporados pela sociedade, inclusive pelo próprio Poder Judiciário – a 7ª Vara Criminal Federal de São Paulo/SP, através da Portaria nº 12/15, adotou a intimação de partes e advogados através do WhatsApp, reconhecendo-o como meio idôneo de comunicação, conforme prevê o artigo 370, §2º, do Código de Processo Penal – sua abrangência em território nacional é inquestionável, assim como sua utilização para serviços públicos e privados.

Dessa forma, ainda que a Lei nº 12.965/2014 permita a suspensão e até mesmo a proibição das atividades da empresa, a análise do serviço prestado pelo WhatsApp e dos elementos citados elide a proporcionalidade, a adequação e a razoabilidade do ato, pois a sanção supostamente imposta à uma empresa afetou diametralmente direitos de terceiros e do corpo social. Admitir eventual proporcionalidade na decisão, seria admitir a possibilidade de suspender os serviços postais dos Correios ou o corte de sinal telefônico em todo território nacional diante da suspeita da prática de ilícitos por esses meios, o que, evidentemente, é inadmissível.

A ausência de indispensabilidade dos dados do WhatsApp, a existência de outros meios de investigação e de coerção para cumprimento da decisão e a afetação aos direitos de terceiros retiram, integralmente, a proporcionalidade da decisão que interrompeu os serviços do WhatsApp em território nacional. Não se pode conceber um Estado Democrático de Direito sem que haja correlação entre as decisões do seu Poder Judiciário e o princípio da proporcionalidade.

*Márcio Nicolau Dumas é advogado, mestre em ciência, gestão e tecnologia (UFPR), ex-presidente da Comissão de Direito e Tecnologia da Informação da OAB/PR.

**com colaboração de Adalberto W. Alcântara.

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