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A China In Box amargou sua primeira derrota no Judiciário, após seguidas vitórias em litígios contra concorrentes que utilizavam expressões semelhantes, como, por exemplo, “UAI IN BOX”, “MINEIRO IN BOX” e “MASSA IN BOX”. No último dia 18 de fevereiro, a juíza da 39ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) rejeitou a ação de violação de marca proposta pela China In Box, pertencente à Trend Foods Franqueadora Ltda., contra uma empresa que usa a marca “Detox In Box”. A decisão reverberou durante dias na mídia e ainda recebeu elogios de três grandes doutrinadores nacionais, neutros em relação ao caso.

A razão para tamanha mobilização se encontra não só na quebra de uma sequência de vitórias da China In Box, mas principalmente pela técnica da decisão monocrática.

Na sentença, a juíza fez uma profunda análise do negócio de cada uma das partes, destacando que “produtos comercializados pelas partes não são idênticos e tampouco semelhantes. A autora atua no ramo de fast food oriental, vendendo refeições isoladas a preços acessíveis, enquanto a requerida comercializa kits de comida natural montados sob encomenda, visando à desintoxicação do organismo mediante programas de alimentação individuais que duram sete dias”.

Quantos aos serviços e produtos identificados pelas marcas em disputa, a magistrada constatou “diferenças em relação aos preços de venda de cada um, ao trade dress (exposição visual da marca e dos produtos) e até mesmo do atendimento ao consumidor, na medida em que requerida exige contato constante com os clientes”.

Da mesma forma, a sentenciante examinou o público alvo envolvido no alegado conflito, destacando que este não se confunde, por não ser “crível que alguém encomendaria um programa para desintoxicação do organismo acreditando ter encomenda comida chinesa”.

Com relação ao grau de semelhança das marcas, a julgadora reconheceu que não houve usurpação do prestígio do sinal da rede chinesa, já que “a distinção existente nas marcas nominativas (China e Detox) indica ao próprio consumidor que os produtos comercializados pelas partes servem a propósito completamente diferentes, não sendo plausível a presunção de que a clientela da requerida a tenha associado à marca da autora”.

Nada obstante, o tempo de uso da marca, a legitimidade e a fama da ré também foram aquilatados pela juíza ao asseverar que “os documentos acostados aos autos demonstram que a marca da ré foi construída, sobretudo, por publicidade em revistas e sites que tratam sobre a beleza, corpo e saúde, possuindo fama em seu ramo de atuação”.

Por fim, ao analisar o grau de distintividade intrínseca das marcas, a juíza atestou que o sinal da rede chinesa é sugestivo, pois “indica uma característica do produto comercializado, comida oriental em ‘caixa’”.

Como se pode notar, a magistrada aplicou na prática os critérios para análise de conflitos de marcas já consagrados pela jurisprudência, mas o fez de forma sistemática e escalonada.

Em nosso artigo O Teste 360° de Confusão de Marcas (Revista da ABPI nº 132, de outubro de 2014), já apontávamos para a necessidade de sistematização dos critérios de análise de colidência de signos distintivos, cuja efetividade restou ora comprovada pela brilhante decisão da magistrada.

Com efeito, após um apanhado geral da jurisprudência nacional nas duas últimas décadas, listamos naquele trabalho sete critérios principais na apuração das circunstâncias que permeiam a análise de confusão (seis dos quais foram aplicados pela decisão em pauta).

Os critérios do que convencionamos chamar de Teste 360° de Confusão de Marcas, ou simplesmente Teste 360°, são:

a) Grau de distintividade intrínseca das marcas;

b) Grau de semelhança das marcas;

c) Legitimidade e fama do suposto infrator;

d) Tempo de convivência das marcas no mercado;

e) Espécie dos produtos em cotejo;

f) Especialização do público alvo;

g) Diluição.

Nenhum desses elementos deve necessariamente se sobrepor aos demais, sendo certo que, isoladamente, o resultado da avaliação de um único critério não confirma nem elimina a colidência das marcas sob exame.

A sistematização e o escalonamento da análise de cada item do teste são relevantes. Ademais, o grau de relevância de cada elemento deverá ser sopesado pelo examinador diante do caso concreto, após a análise de todas as circunstâncias em conjunto (360°).

Como resultado, casos aparentemente semelhantes podem chegar a resultados diametralmente opostos, vide, por exemplo, a acertada decisão no conflito da Detox in Box.

A decisão ainda está sujeita a recurso para as Câmaras de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, mas a técnica de análise desfilada pela magistrada deve seguir de norte para situações de aparente conflito de marcas.

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