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A história da tributação se confunde com a própria história da humanidade. Não por acaso, os mais antigos textos já descobertos, pequenas tábuas em escrita cuneiforme, tratavam de tributos.

Muito provavelmente os primeiros saqueadores de tribos já exigiam somas regulares de dinheiro, bens, alimentos ou metais preciosos para garantir a segurança das tribos saqueadas. Para a instituição de governos, ampliando-se as garantias dos indivíduos na mesma proporção dos pagamentos regulares, foi apenas um passo.

Na Roma antiga, existiram diversas espécies de tributos. Alguns não sobreviveram ao nosso tempo, restando apenas notícia histórica, como tributos cobrados sobre o uso do ar e propriedade de janelas (vectigal aerum); propriedade de colunas (ostiarium e colmnarium) e telhas; propriedade de chaminés e expedição de fumaça; em favor do Imperador a cada Ano Novo (strenae).

Vários outros tributos romanos, entretanto, sobreviveram ao tempo e ainda fazem parte do cotidiano, como o imposto sobre sucessão (vicesima hereditatum), a tributação sobre o consumo (vectigal rerum venalium), as taxas de utilização de bem público, pedágio (portorium) e muitos outros.

Como é de conhecimento comum, entre os operadores do Direito, os tributos podem ter função meramente arrecadatória, ou seja, uma função fiscal, mas também podem ter função para direcionar comportamentos, através da intervenção na economia, ao que se dá o nome de função extrafiscal.

Muitas vezes a finalidade extrafiscal do tributo está relacionada com necessidades econômicas, buscando aumentar ou diminuir a oferta e demanda de determinados bens ou serviços. Aumentando-se o preço do produto, busca-se diminuir seu consumo, e vice-versa. A técnica funciona muito em se tratando de produtos cujo consumo é “elástico”, ou melhor, que varia conforme o preço. O consumo de morango, por exemplo, aumenta quando o preço está baixo e diminui quando o preço aumenta. De igual forma, se o preço das passagens áreas sobe, seu consumo diminui, pois muitas pessoas deixarão de viajar ou viajarão por outro meio de transporte. E não existe dúvida que o aumento do preço da água faz com que os contribuintes desperdicem menos.

Os chamados “impostos do pecado”, ou “sin taxes”, como chamam os norte-americanos, são nitidamente extrafiscais, na medida em que a tributação do álcool, tabaco e jogo é realizada para que os consumidores orientem seu comportamento no sentido de consumirem menos álcool, fumarem menos cigarros e investirem melhor seu dinheiro, ao invés de apostarem.

O consumo de álcool e tabaco, por exemplo, gera grande impacto no Sistema de Saúde, seja pelos acidentes automobilísticos, seja também pelo alto custo do tratamento relacionado à falência do fígado e dos pulmões. O jogo, onde ele é permitido, igualmente preocupa os governos, uma vez que pessoas viciadas em jogo podem tomar medidas insensatas para ter mais liquidez financeira e, assim, apostar mais, deixando de se preocupar com a previdência privada, poupança, medicamentos e até mesmo com o bem-estar da família.

Todavia, ao contrário da maioria dos tributos com finalidade extrafiscal, a tributação do álcool, tabaco e jogo trabalha com um elemento diferencial, qual seja, o consumo de tais produtos é “inelástico”, ou melhor, não varia muito, ainda que os preços aumentem, pois normalmente radicado em vício, do qual o indivíduo poucas vezes consegue se libertar.

Apesar da alta carga tributária, não se tem notícia que o consumo do álcool e dos cigarros tenha diminuído em razão unicamente do preço. Ao contrário, além do consumo não ter sofrido grandes impactos em razão da tributação elevada, existem evidências de que os consumidores de álcool acabam substituindo as bebidas por similares mais baratas (e por vezes mais danosas ao organismo), bem como que os consumidores de cigarros apelam para congêneres contrabandeados do Paraguai.

Se o consumo dificilmente cai, principalmente no caso do álcool e tabaco, talvez a solução para se direcionar o comportamento do contribuinte (para que não consuma álcool e não fume) deva ser encontrada fora da tributação (embora sem prejuízo desta), a qual, ao fim e ao cabo, apenas tem conseguido aumentar a arrecadação sem atingir satisfatoriamente a função extrafiscal à qual se lastreou.

Nesse sentido, Uião, Estados e Municípios têm buscado ampliar campanhas de conscientização sobre álcool e cigarro, ao mesmo tempo em que aumentam as multas e penas para quem dirigir embriagado e criam novas zonas em que o fumo é absolutamente proibido.

Esse parece ser o melhor caminho: um trabalho sério e comprometido de conscientização aliado a medidas punitivas, quiçá integrado a medidas criativas. Vale lembrar o célebre paradigma do cinto de segurança. Logo após inventado, e com uso facultativo, poucas pessoas utilizavam. Quando se tornou obrigatório, e os infratores punidos com multa, o percentual de utilizadores aumentou razoavelmente. No entanto, foi apenas quando as empresas foram obrigadas a fabricar veículos com um sistema sonoro ininterrupto de advertência enquanto não se colocasse o cinto de segurança, que o percentual de utilizadores finalmente logrou alcançar a quase totalidade.

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