• Carregando...
Sérgio Souza: ele toma posse no lugar de Gleisi no Senado às 16 horas. | Priscila Forone/ Gazeta do Povo
Sérgio Souza: ele toma posse no lugar de Gleisi no Senado às 16 horas.| Foto: Priscila Forone/ Gazeta do Povo

Opinião

O problema dos suplentes

A suplência dos senadores brasileiros é um tema que desperta indignação entre os eleitores, cronistas políticos e entidades da sociedade civil que monitoram as atividades políticas e parlamentares. A crítica aponta para o fato de que os suplentes dos senadores titulares não conquistaram nenhum voto dos eleitores, porque não aparecem nas campanhas perante o eleitor e são via de regra figuras praticamente ocultas nas candidaturas como um todo.

Para que situar o assunto em um quadro mais amplo, convém discuti-lo no contexto dos pressupostos da democracia representativa. As democracias modernas funcionam com base no casamento entre voto popular e a representação – isto é, a delegação das preferências dos cidadãos aos representantes eleitos. Essa simbiose entre voto popular e representação é uma resposta institucional – precária e imperfeita – para produzir ao mesmo tempo: eficiência governamental e legitimidade política.

O primeiro item quer dizer: os políticos eleitos precisam tomar decisões, solucionar impasses, escolher entre alternativas e decidir problemas coletivos de interesse da comunidade. Espera-se que os governantes tomem decisões e produzam políticas públicas.

O segundo almeja que os mandatos dos políticos carreguem em alguma medida as aspirações, anseios ou preferências dos seus eleitores. Que tenha certo conteúdo popular, da base da sociedade. Espera-se que os políticos decidam, mas que o façam perante os "constituintes" do seu mandato – aqueles que o elegeram.

Para que essa simbiose se complete, é preciso que haja clareza quanto ao quê se decide e quem é o responsável. Se a política se reveste de extrema complexidade e um alto grau de especialização dos assuntos, é de se esperar que o elemento de menor controle por parte do eleitor é aquele que diz respeito ao conteúdo das decisões – o quê se decide. Um controle mais estreito deveria se dar sobre aquele que decide – o mandatário.

O atual mecanismo da suplência do Senado brasileiro afeta, assim, o elemento da legitimidade política ao entregar o cargo a indivíduos desconhecidos que o eleitor efetivamente não escolheu. Por mais que a ciência política brasileira tenha descoberto que os suplentes se comportam de forma muito parecida com os titulares (mantendo as mesmas posições em plenário), a base da representação está prejudicada. O conteúdo da decisão – o quê – parece não se alterar, mas o eleitor se sente traído ao ver que a cadeira é ocupada por um indivíduo que não recebeu votos e que, portanto, não tem a quem prestar contas.

O terceiro item – a responsabilização das autoridades – conclui afirmando que se os dois anteriores não são atendidos, o eleitor pode retirar seu apoio na eleição seguinte, escolhendo outro candidato.

Luiz Domingos Costa, cientista político e professor do Grupo Educacional Uninter

Figuras de pouco destaque no quadro político nacional, os suplentes de senador ganharam os holofotes nos últimos dias. A senadora paranaense Gleisi Hoffmann (PT) assumiu a chefia da Casa Civil e deixou sua cadeira no Senado para o desconhecido advogado Sérgio Souza (PMDB). Sem ter tido um único voto, ele toma posse hoje, no plenário do Senado, às 14 horas, num dos mais altos cargos da República.

Para o cientista político Luiz Domingos Costa, da Uninter, a presença dos senadores-suplentes pouco ou nada altera o cenário político, já que eles tendem a reproduzir as posições dos titulares, a quem são ligados politicamente. No entanto, há uma problema de legitimidade da representação, já que eles não tiveram votos durante a eleição. "O eleitor não quer apenas que um político tome decisões, quer também alguém que o represente de alguma forma", explica Costa.

De acordo com o cientista político, a situação é bem diferente da dos vices dos cargos do Executivo – que, em tese, tem a mesma função única de substituir o titular. Na maioria das campanhas eleitorais, os vices ganham alguma atenção da mídia, são chamados para debates e acompanham os titulares no palanque. Enquanto isso, os suplentes de senador raramente aparecem. Geralmente, são pes­­soas com importância nos bastidores das eleições, mas com pouca experiência eleitoral.

Prova disso são os suplentes dos senadores paranaenses. Os primeiros-suplentes de Roberto Requião (PMDB) e Alvaro Dias (PSDB) são, respectivamente, os empresários Chico Simeão, da BS Colway, e Wilson Matos, do centro universitário Cesumar. Ambos ajudaram no financiamento das campanhas: de acordo com dados da Justiça Eleitoral, Simeão contribuiu com 28% de toda a verba de campanha de Requião: um total de R$ 857 mil. Já Matos foi mais modesto, e contribuiu com R$ 50 mil da campanha de Alvaro. No entanto, nenhum dos dois jamais teve um cargo eletivo antes da suplência a senador.

Atualmente, a comissão do Senado para Reforma Política aprovou uma proposta de reduzir de dois para um o número de suplentes de senadores. Além disso, eles serviriam apenas para ocupar a vaga do titular em caso de afastamento temporário. Em caso de renúncia ou morte, seriam realizadas novas eleições.

Para o cientista político Luiz Domingos Costa, é uma mudança insuficiente, já que a figura do "senador sem votos" continua existindo. Ele diz que o ideal seria que o candidato não eleito mais votado assumisse a vaga, como ocorre com os deputados. Outra possibilidade seria a vacância do assento. Isso tenderia a valorizar mais a figura do senador, já que desencorajaria a renúncia para que assumam outros cargos.

Já para o cientista político Octaciano Nogueira, da Univer­­­sidade de Brasília, o sistema de suplentes é necessário para manter a representação estadual equilibrada na Congresso. "O Senado é a Casa que representa os estados, e por isso funciona de forma diferente. Sem a existência de suplentes, os estados poderiam ficar sub-representados", comenta. No en­­tanto, o cientista político acredita que a proposta da Comissão de Reforma Política é negativa, por indicar a realização de novas eleições em caso de renúncia ou morte – o que, de acordo com ele, seria custoso para o estado e trabalhoso para o eleitor.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]