Comportamento

Amanda Milléo

“2017 é o ano de saber perder”, diz psicanalista Marcelo Veras

Amanda Milléo
23/01/2017 17:00
Thumbnail

(Foto: VisualHunt)

No último mês de 2016, era comum encontrar pelas timelines nas redes sociais as súplicas por um ano mais “leve” e “tranquilo” em 2017. Embora o ano passado tenha acumulado uma série de acontecimentos negativos, essa sensação de “termine de uma vez” é bastante comum a todos os fins de ano, principalmente porque é a forma que as pessoas têm de tentar corrigir as rotas, realizar desejos e esquecer as experiências ruins.
Leia mais
O Viver Bem conversou com o psiquiatra e psicanalista Marcelo Veras, membro da Associação Mundial de Psicanálise e ex-diretor geral da Escola Brasileira de Psicanálise para saber como tornar 2017 o mais tranquilo possível.
Marcelo Veras é psicanalista e psiquiatra, membro da Associação Mundial de Psicanálise e ex-diretor geral da Escola Brasileira de Psicanálise (Foto: Divulgação)
Marcelo Veras é psicanalista e psiquiatra, membro da Associação Mundial de Psicanálise e ex-diretor geral da Escola Brasileira de Psicanálise (Foto: Divulgação)
O desejo por mais “leveza” no ano-novo foi um dos principais pedidos vistos nas redes sociais. O que cada pessoa poderia fazer para tornar 2017 mais leve, de fato? 
Acredito que qualquer coisa apenas pode ser “leve”, se ela não for varrida para debaixo do tapete. Por mais difíceis que as situações domésticas sejam, ocultá-las não as tornará melhores. É como o momento em que preferimos nem abrir o extrato bancário porque sabemos que ele está negativo. Ora, o fato de não abrirmos o extrato não quer dizer que o saldo ficará positivo, e como prejuízo ainda nem teremos como tecer uma estratégia para sair do buraco porque optamos pela ignorância. Pois 2017 é um ano para fazer cálculos, saber perder algo para recuperar algo depois. Isso implica que os mais leves serão aqueles que saberão lidar com frustrações. Os que não sabem vão sofrer muito mais.
Algum ano acaba ‘bem’? Com o desejo de que ‘continue’?
Sem dúvidas há anos que acabam bem, mas é importante lembrar que não vivemos em gavetas, em anos separados, isso é apenas um artifício para que possamos calcular melhor como nos localizar em nossas memórias. No fundo vivemos exclusivamente em um eterno presente. A questão é que o imediatismo amplificado pelas redes sociais transformaram o presente em uma espécie de “hiper-presente”. São tantas informações ao mesmo tempo que não temos sequer o tempo para recuar e verificar se o ano foi bom ou não. É preciso um certo tempo e distanciamento para poder fazer um julgamento dos efeitos. Muitos acontecimentos que, em princípio parecem bons, a posteriori se mostram ruins, e vice versa. Só podemos dizer que um anos foi bom ou ruim, no final das contas, após um certo tempo.
É possível que essa sensação de que ‘2016 termine logo’ possa ter sido maior pelo uso das redes sociais?
Está provado que hoje o maior canal de leituras de notícias, inclusive as que circulam nos jornais, é via o Facebook. A questão é que o Facebook não tem linha editorial, ele é um grande rio em que as notícias passam na corrente e cada um se agarra a que pode representar sua boia de salvação. Ele não é uma verdadeira abertura ao outro, e sim uma tentativa de salvar o mesmo, o antigo mundo de ideias e julgamentos que ruiu. A questão é que, para o pior e o melhor, temos que aprender a surfar nesse mundo de redes paralelas, que nos opõe frontalmente aos que pensam totalmente o oposto de nós. Percebemos rapidamente que não estávamos preparados para essa confrontação, e qualquer pensamento diferente é rapidamente visto como ameaçador.

“Hoje todos passam por uma espécie de exigência superegóica de ter que manifestar suas opiniões em um grande tribunal universal que são as redes sociais. O mais impressionante é que muitas dessas pessoas não se manifestam por desejo, e sim por culpa de não mostrar seu engajamento no mundo” – Marcelo Veras, psicanalista e psiquiatra.