Comportamento

The New York Times

Amigos que se afastam nas horas difíceis são golpes tão duros quanto o próprio problema

The New York Times
29/04/2017 14:00
Thumbnail

(Foto: Bigstock)

Das mais de 80 mulheres entrevistadas recentemente para um novo livro sobre amizades femininas, muitas falaram com gratidão sobre amigas que compareceram durante períodos conturbados. Uma contou sobre a amiga que veio de uma cidade distante e ficou por uma semana enquanto ela se recuperava de uma cirurgia. Outra descreveu como as amigas se coordenaram, por meio de um site para levá-la para o tratamento de quimioterapia, conseguir que recebesse refeições em casa e para estar ao seu lado nos momentos em que ela não deveria ficar sozinha.
Muitas explicaram a importância das amigas que continuavam ligando, mandando e-mails ou mensagens, mesmo que nem sempre recebessem resposta. Amizade não é apenas a fonte desse conforto; ela também pode ser o resultado. Uma mulher lembra que quando sua mãe ficou muito doente, várias amigas apareceram para ajudá-la nos cuidados com a paciente. Depois que a mãe morreu, percebeu que seu relacionamento com essas mulheres havia ido de um conhecimento amigável para uma sólida amizade.
Essas amizades foram uma surpresa e um presente duradouro. Quase todas que me disseram como as amigas eram importantes afirmaram que algumas das que compareceram não eram quem elas esperavam.
Mas o outro lado dessa moeda pode estar entre os golpes mais duros quando surge uma doença: a decepção quando amigas em quem você achou que poderia confiar não aparecem. Uma mulher cujo marido teve Parkinson afirmou: “Havia amigas, mulheres que pensei que eram minhas amigas que simplesmente desapareceram”. Ela achou especialmente dolorosa a reação de um casal que contava entre os melhores amigos. As visitas da mulher se tornaram esporádicas, e as do marido acabaram. Ela explicou: “Meu marido não aguenta ver o seu desse jeito”. A experiência deixou a mulher pensando no sentido da amizade. “Se um amigo não comparece quando você precisa dele, então o que é um amigo?”, perguntou.
Comparecer quando você precisa dela ou dele certamente é uma parte da amizade. Outra é emprestar o ouvido. A conversa tem um papel mais importante na maioria das amizades femininas do que nas masculinas e, quando os tempos estão difíceis, falar pode ser um alívio. Revelar a um amigo o que está acontecendo faz com que a pessoa se sinta menos isolada e essa moeda também tem outro lado.
Uma mulher com câncer de mama explicou que se sentiu magoada e isolada de amigas cujas questões pareciam formuladas para evitar um destino semelhante. “Você amamentou?” e “Há outras pessoas com câncer na sua família” foram perguntas que soaram como tentativas de garantir que elas eram diferentes, e por isso estavam seguras.

Quando você está sozinha no seu câncer

A cantora de música folk Marcy Marxer, de Maryland, estado nos Estados Unidos, escreveu uma lista de coisas bem pouco úteis que as pessoas disseram quando ela contou que tinha câncer. Algumas foram questões como “Quais são as suas chances?” ou, uma maneira menos direta de dizer a mesma coisa, “Qual o seu estágio?“.
Outros comentários eram conselhos “Químio? Não faça isso. É veneno de rato. Vou te mandar um livro sobre o que comer“, ou mais especificamente, “Você deveria beber suco de cebola“. Outras ainda eram observações com o objetivo claro de encorajar ou tranquilizar, mas que na verdade não fizeram nenhum dos dois, como”Pense positivo” e “Você vai ficar bem“.
Mesmo os gestos mais apreciados podem se tornar complicados pelos estresses herdados de todas as relações humanas. Uma mulher me contou que foi ajudar uma amiga que vivia sozinha e estava se recuperando de uma condição médica séria. A amiga ficou agradecida pela ajuda, mas estava acostumada a fazer as coisas do seu jeito. Ela não conseguia esconder sua irritação quando a amiga usava por engano as panelas erradas, servia as refeições em pratos que ela reservava para ocasiões especiais e preparava receitas tão suaves que ficavam praticamente sem gosto.
Sua frustração se igualava à da amiga doente, por ter que ouvir que devia fazer de maneira diferente coisas que ela estava sendo extremamente generosa em fazer. Quando ouvi sobre como esses gestos generosos e palavras bem intencionadas podiam ser compreendidos de modo errado, fiquei preocupada com o fato de que também devo ter inadvertidamente dito ou feito coisas de maneira inadequada. E isso explica por que muita gente acaba se calando: é difícil saber o que será bem vindo e o que vai irritar ou machucar.
E a mesma coisa que podemos dizer a uma pessoa em um contexto pode ser errada para outra, ou para a mesma em outra situação. Quando o medo de dizer ou fazer a coisa errada lhe deixa tentado a não dizer nem fazer nada, algo que pode ajudar é lembrar que apenas o ato de estender a mão para o outro já pode significar muito.
Para quem se sentiu ferido pelo que parece ser um fracasso da amizade, ajuda lembrar que pode não ser nada disso. Tendemos a assumir que nossas maneiras de mostrar carinho são evidentemente corretas. Mas uma série de influências culturais; etnia, região, classe e estilos de família afetam como mostramos nosso afeto.
Uma mulher que contou para sua amiga próxima que a mãe havia sido hospitalizada e se sentiu magoada porque a amiga nunca perguntou sobre a doença da mãe. Ela teve a impressão de que a amiga não se importava. Quando a mulher confessou seu desapontamento, a amiga explicou que havia aprendido com sua família que não era educado perguntar sobre assuntos pessoais. Se as pessoas quiserem lhe contar, elas o farão espontaneamente. Não perguntar foi sua maneira de ser uma amiga atenciosa.
O que você faria se amigos que pensou que compareceriam se mostram silenciosos? A maioria de nós tende a se sentir magoada e não dizer nada. Pode valer a pena tentar procurá-los. É possível que o silêncio deles não seja porque eles não estão pensando em você, mas porque estão com medo de parecer intrometidos. E perguntar sobre eles é uma maneira de dizer: “Ainda sou a mesma amiga de antes e espero que você também“.
Leia mais