Comportamento

Dayane Saleh, especial para a Gazeta do Povo

Mentirinhas do dia a dia comprometem credibilidade e podem indicar doença

Dayane Saleh, especial para a Gazeta do Povo
08/06/2017 17:49
Thumbnail

Foto: Bigstock

Ano que vem nós casamos. No próximo feriado a gente viaja. Eu vou parar de fumar este mês. Nunca mais vou comer chocolate. Na próxima segunda-feira começo a academia. Juro que te amo. No próximo semestre vou me dedicar mais aos estudos. Promessas aparentemente inocentes feitas no dia a dia podem se tornar patológicas e indicar que o mentiroso, ainda que se ache inocente, precisa de ajuda.
Projeções exorbitantes são características de pessoas sonhadoras que carregam um extremo otimismo em relação ao futuro. O problema é que a vida real não corresponde às expectativas e o sonhador se torna um grande mentiroso. Isso porque ele quer agradar os outros e não sabe lidar com a realidade e ter paciência. Outras vezes, as promessas são apenas desculpas para não se perder o outro, com objetivo de mantê-lo sob seu domínio, sem refletir sobre seus erros e procurar melhorar como ser humano.
Segundo a psicóloga Eloá Andreassa, quem muito promete é “infantil e manipulador”. “Esse sujeito sempre abre novas possibilidades, prometendo mundos e fundos, mas quase nunca termina. Ou seja, cumpre”, explica a profissional especializada em terapia de casais e relacionamentos entre pais e filhos. Ela conta que, se esse comportamento não for corrigido no início da vida, a pessoa pode se tornar o famoso “cafajeste”, aquele que promete maravilhas para o parceiro mas sempre deixa a desejar.
“Isso demonstra uma incapacidade de assumir responsabilidade. O outro está sempre esperando que aquela projeção seja realizada, mas quando chega o momento não acontece”, diz Andreassa que complementa afirmando que tais promessas causam frustração e desgaste na relação. A profissional dá alguns exemplos de atitudes comuns desses “mentirosos”. “Pode ser aquele ciumento que estoura com o parceiro, aquele que vive atrasado e deixa familiares, amigos ou o parceiro esperando. Essa também é uma atitude comum em quem tem histórico de uso de drogas e consumo de álcool”, detalha.
Quem faz muitas promessas é uma pessoa que não sabe ser sincera e diz o que o outro quer ouvir. “Ele faz isso para se livrar de uma situação que não quer enfrentar ou mesmo para causar uma ilusão no outro”, conta. A consequência é o desencantamento e, consequentemente, o término daquele relacionamento amoroso ou afastamento quando for uma relação entre familiares ou amigos. “De um lado, é preciso ser realista ao que se pode fazer e, do outro, é necessário avaliar se aquilo que foi prometido tem condições de ser cumprido”, alerta a psicóloga.
No artigo “Eu, tu, nós e a busca do ‘eu’ nos relacionamentos amorosos“, a psicóloga e pedagoga Nívia Kuhn trata sobre as fases das relações em declínio entre casais, em que compara ao paraíso, purgatório e o inferno. Depois de entregar-se completamente, o sujeito passa a buscar sua individualidade por meio da liberdade. Quando as brigas começam, promessas são estratégias usadas para manter o relacionamento.
“O fogo ardente da paixão é substituído pelo fogo das brigas, do ciúme, das traições, do controle, da possessão, da dependência, do apego, da simbiose quase patológica a que a relação foi elevada. Nessa etapa, tenta-se de tudo: terapia de casal, apelo a religião, idas ao psiquiatra, promessas de mudança (…)”.
Amigos e familiares
Para agradar a criança, às vezes os pais prometem situações que não estão necessariamente programadas e não tem um indicativo de que realmente podem acontecer. Outras, são desapontamentos pequenos, que desmoralizam as figuras materna e paterna perante o pequeno. “Por exemplo, um dos dois promete uma viagem à Disney, ou que vai no parquinho jogar futebol. São duas situações distintas, mas que se não forem levadas a sério causam decepção“, explica Andreassa.
Ao longo dos anos, o filho vai se desencantando e criando uma visão negativa dos progenitores, considerando-os mentirosos. A profissional aponta que é diferente quando acontece alguma emergência que impossibilita o cumprimento da promessa, nesse caso, deve-se explicar a situação à criança. “Quando a decepção é causada por um motivo real e justo. é mais fácil de o filho se conformar“, complementa.
Segundo a psicóloga, aquele que recebe a promessa cria expectativas e, quando percebe que aquele sonho não será realizado, passa a desacreditar na pessoa. “Além de usar de má fé por deixar outros iludidos e enganá-los, esse mentiroso acaba por perder a credibilidade”, finaliza.  Entre os amigos, a pessoa fica conhecida como irresponsável, culminando no fim da confiança.
Seja qual for o relacionamento, cumprir e não prometer leva à descrença. Como na fábula “O Garoto Pastor e o Lobo“, em que o menino pastor sempre emite alertas falsos do lobo se aproximando das ovelhas e, quando diz a verdade, não tem mais credibilidade. Tome cuidado para não desgastar suas relações com desculpas e atalhos.
LEIA MAIS: