Comportamento

Carolina Werneck

Humorista ganha o Brasil falando de Curitiba: “coisas bizarras acontecem aqui”

Carolina Werneck
03/10/2017 18:00
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As piadas sobre o comportamento do curitibano deram origem a uma série. Em "Portugal descobrindo o Brasil", o comediante apresenta piadas sobre as cidades em que faz seus shows. Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo | Gazeta do Povo

Diogo Portugal é desses curitibanos cuja história é intrínseca às ruas da cidade. Criado em uma rua do centro que leva o nome de seu avô, Clotário Portugal, o humorista morou por muitos anos em um edifício que homenageia sua avó, Anita Portugal. Tanta intimidade com a capital deu a ele o laboratório perfeito para amadurecer suas observações divertidas sobre o cotidiano de seus habitantes.
“Eu aprendi a fazer comédia com o público mais exigente e chato, que é o de Curitiba”, brinca Portugal. Mesmo depois de 17 anos de carreira, a capital continua sendo uma de suas personagens preferidas. “Muita coisa de Curitiba virou meme. A menina que bebeu na balada, o mendigo gato. Coisas bizarras acontecem aqui. Aí você começa a ver que Curitiba é estranha.” Das observações dos trejeitos e manias dos curitibanos nasceram os primeiros textos de humor.
“Curitibano não fala com ninguém”
Em um vídeo postado recentemente em sua página no Facebook, o comediante brinca que “a gente se orgulha dessa fama que a gente tem. É como se você morasse no Country Club do Brasil”. Foi com piadas como essa que ele se solidificou como referência da comédia na cidade, muito antes de ganhar o restante do país. “Eu peguei a fase da comédia em que a gente só aparecia na televisão. Então fiz muito show em Curitiba sendo conhecido só na cidade mesmo.”
Para ele, o comportamento fechado do curitibano típico transformou a capital no laboratório perfeito para as artes cênicas. Some-se a isso o Festival de Teatro de Curitiba, realizado desde 1992, e será possível compreender melhor a importância da cidade no cenário nacional desse tipo de trabalho. O teste funcionaria mais ou menos assim: como o público é muito exigente, quando uma peça agrada por estas bandas provavelmente agradará em outras paragens.
Portugal afirma que, no resto do país, há uma receptividade para com quem é de Curitiba que o próprio curitibano pode não notar. “É uma cidade meio que de primeiro mundo, comparada com outras regiões. Então todo mundo fica impressionado quando você diz que é de Curitiba. Mas o curitibano é aquele cara que sabe que a cidade é bem falada no Brasil todo e faz que não liga pra isso”, diverte-se. Ele avalia que o comportamento arredio dos nativos daqui tem a ver com o clima frio. Nos shows que faz em Curitiba, porém, já percebeu uma mudança significativa. Com a vinda de muita gente de fora para a capital, o perfil dos habitantes vem mudando, na opinião do humorista.
Diogo avalia que o sotaque é outra característica forte do curitibano. “Só comecei a ter a percepção disso depois que saí de Curitiba. Eu fico uma semana na cidade e volto completamente curitibano, inclusive falando o ‘daí’. Para o curitibano, ‘daí’ é pontuação, mas, para quem é de fora, é algo que você vai complementar”, comenta, rindo.
Também foi por aqui que o comediante alcançou o que diz considerar uma das maiores conquistas da carreira. Em 2003 o festival de comédia Risorama foi realizado pela primeira vez. “O Risorama é um dos maiores atrativos do festival [de teatro] de Curitiba. E começou com a ideia de fazer um intercâmbio com gente que não era da cidade.” Em 2018 serão 15 anos trazendo apresentações de humoristas famosos e nomes ainda desconhecidos do grande público.
"Cria" de Curitiba, Diogo Portugal morou boa parte da vida no centro da cidade. Foto: Pedro Serapio/Gazeta do Povo
"Cria" de Curitiba, Diogo Portugal morou boa parte da vida no centro da cidade. Foto: Pedro Serapio/Gazeta do Povo
Portugal descobrindo o Brasil
Das brincadeiras com essas “curitibanices” surgiu uma série batizada de “Portugal descobrindo o Brasil”. Sempre que desembarca em uma cidade para fazer show, ele entra em contato com os locais atrás de histórias, sotaques e situações corriqueiras que possam virar risadas. “Isso funciona bem porque o ser humano tem isso, ele gosta de se ‘autozoar’, é legal brincar com as coisas de si mesmo.” Já são quase 100 cidades presenteadas com essas piadas personalizadas.
O público, em geral, reage bem ao conteúdo humorístico feito com um pé no local, mas há vezes em que a ideia não agrada. Recentemente, em Petrolina, Pernambuco, o texto apresentado por Portugal foi motivo de polêmica com a cidade vizinha, Juazeiro, que fica na Bahia. O humorista brincou com a rixa existente entre as duas cidades e muita gente não gostou. Um vereador de Juazeiro chegou a apresentar uma moção de repúdio contra Diogo. Em terras paranaenses, no entanto, algo assim nunca aconteceu. “Acho que é porque, como eu sou de Curitiba, eu tenho total liberdade para zoar com as coisas da cidade. Isso porque são coisas das quais eu faço parte, então eu tenho a liberdade poética”, opina.
Ideias, ideias, ideias
Com a popularização do Youtube, criado em 2005, as piadas feitas nos palcos passaram a estar facilmente disponíveis não apenas para o público, mas para os próprios humoristas. Portugal diz utilizar a ferramenta como uma espécie de prateleira de produtos. Com séries específicas sobre assuntos variados, ele consegue organizar o próprio conteúdo de modo que possa revisitá-lo sempre que necessário. “Eu vou escrevendo textos de uma maneira frenética porque acho que isso me torna vivo no mercado. E as pessoas começam a consumir como se fosse uma coluna de jornal.”
E a agenda está sempre cheia. Às quartas-feiras, o humorista normalmente grava o “Papo de Quarta”, com celebridades e figuras do humor. Quinta-feira é dia de gravar o “Luciana by Night”, talk show da apresentadora Luciana Gimenez que ele ajuda a escrever. Na sexta ele participa do “Comédia ao Vivo”, espetáculo que está em cartaz em São Paulo há dez anos. Os shows fora de São Paulo em geral são encaixados durante os finais de semana. Nos intervalos de todos esses compromissos, Portugal ainda arruma tempo para fazer shows em eventos corporativos e tocar a “Portugal Produções”, produtora de conteúdo que fundou na capital paulista. “Neste momento também estou oferecendo um produto para um canal a cabo. Seria um reality show em que celebridades se arriscam a fazer comédia stand-up”, conta.
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