Comportamento

Talita Boros Voitch

Ele pediu demissão para ficar com o filho; conheça pais cada vez mais presentes

Talita Boros Voitch
12/08/2017 18:00
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Daniel Vetrone, pai do Tom, pediu demissão do trabalho para passar as tardes com o filho, de 11 meses (Foto: Hugo Harada / Gazeta do Povo)

Na casa do produtor audiovisual Daniel Del Bel Vetrone, de 33 anos, quem pediu demissão para cuidar do filho Tom, com o fim da licença-maternidade da mulher, foi ele. “Eu tinha um bom emprego com um bom salário. Estava bem colocado no mercado, mas naquele momento eu pensei nele. O Tom precisava mais de mim do que eu precisava da carreira”, diz Daniel.
A decisão do casal em optar para que um dos dois parasse de trabalhar aconteceu depois que Tom, hoje com 11 meses, teve meningite aos 17 dias de vida. “Antes disso achávamos que ele iria para a escolinha com quatro meses e pronto. Com a meningite a coisa mudou”, lembra Daniel. A escolha pela demissão de Daniel se deu pelo fato de que o casal considerou que ele obteria mais rendimentos trabalhando de casa do que a mulher Maeva Morais Vetrone, que é jornalista.
Daniel decidiu pedir demissão para cuidar de Tom com o fim da licença maternidade de Maeva. (Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo)
Daniel decidiu pedir demissão para cuidar de Tom com o fim da licença maternidade de Maeva. (Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo)
Com o pedido de demissão, a empresa onde Daniel trabalhava fez uma contraproposta e ofereceu para que ele trabalhasse apenas meio período. Daniel então cumpre expediente das 7h30 ao meio-dia na empresa e cuida de Tom a partir das 13h até 19h30, período que Maeva está trabalhando. “Eu faço tudo que a minha mulher faz. Cozinho, dou a fruta. Inclusive quem leva no pediatra sou eu. É importante para ele saber que o pai dele também sabe cuidar de tudo em casa. Assim o Tom vai crescer tendo o exemplo”, diz.
Não é mais do que a obrigação?
Há quem diz (quem não concorda?) que “fazer isso não é nada mais do que a obrigação”, mas devemos admitir que a mudança do papel do homem/pai dentro de casa é um fenômeno recente. E que os homens que incorporaram integralmente essa nova ordem e são cumpridores de suas responsabilidades como pai merecem, sim, reconhecimento.
A presença ativa dos homens na educação dos filhos permite que as crianças tenham acesso ao universo masculino e suas peculiaridades no ambiente doméstico. O fenômeno é tão recente que ainda faltam estudos científicos que mostrem o impacto disso na próxima geração de adultos criados dentro desse modelo.
Apesar disso, os especialistas concordam em apontar os benefícios dos pais presentes no desenvolvimento dos filhos, principalmente em relação à linguagem mais assertiva, comum dos homens, e às brincadeiras mais desafiadoras propostas normalmente pelos pais. Isso é o básico.
“A participação do pai é fundamental porque traz equilíbrio dentro da estruturação da mente da criança. Com a ausência é criada a noção de que o masculino não pertence ao mundo doméstico”, afirma o psicólogo clínico Akim Rohula Neto, especialista em psicologia corporal e de famílias. Segundo ele, a existência de dois modelos (homem e mulher) complementares e atuantes ajudam a criança a desenvolver uma percepção da pluralidade na forma de se relacionar com o mundo.
Apego de pai
Jean acredita que a sua geração de homens entende a importância do pai participativo. (Foto: Crazy Little Thing/Arquivo Pessoal)
Jean acredita que a sua geração de homens entende a importância do pai participativo. (Foto: Crazy Little Thing/Arquivo Pessoal)
O bancário Jean Oliveira, de 37 anos, sempre se preocupou em ser um pai atuante e dividir com a mulher, Carol Oliveira, todos os cuidados com as filhas Alice, de 4 anos, e Olívia, de 1 ano e 5 meses. “Sempre dei banho, troquei fralda. Sempre estive próximo. A mãe se cansa bastante no começo porque é muito demandada pelo bebê, principalmente pela amamentação. Então eu participava o máximo que podia para permitir que a Carol descansasse”, conta.
Embora a primogênita Alice tenha sido um bebê que acordava pouco à noite, Jean conta que fazia toda a “preparação” pré-amamentação para facilitar para a mulher. “Era sempre eu que levantava, acalentava e, se fosse o caso, levava a Alice até a cama para a Carol dar de mamar. Depois pegava, fazia arrotar e colocava de novo no berço”. Jean diz acreditar que a sua geração de homens é mais receptiva, entende a importância do pai em casa e é mais atuante nas tarefas domésticas.
A família vive há quatro meses o dilema da distância: Jean recebeu uma promoção no trabalho e foi transferido para Rio Negro (a cerca de 110 km de Curitiba), na divisa com Santa Catarina. O plano inicial chegou a ser ir e voltar todos os dias de Curitiba para não penalizar as filhas, mas no fim a ideia ficaria pesada no orçamento doméstico.
“O afastamento foi terrível. Tanto para mim quanto para elas. Nas primeiras semanas eu senti muito. Cheguei a chorar à noite no quarto sozinho”, lembra Jean. Agora os Oliveira pretendem alugar uma casa para todos passarem as semanas juntos, em Rio Negro, e os fins de semana em Curitiba. “Vale tudo para ficarmos pertinho”, diz.
O papel mudou?
Os pais de hoje em dia estão bem mais participativos na rotina do que há alguns anos. Se a geração de 30 e poucos anos foi criada por homens que trabalhavam fora e pouco (ou quase nada) se envolviam nos cuidados com as crianças, os ventos mudaram. O papel dos homens em relação à família foi ampliado nos últimos 20 anos, mas mais fortemente em menos de uma década. Se antes eles vivenciavam a paternidade apenas como provedores e disciplinadores, hoje os pais fazem tudo o que as mães também fazem, com o bônus de fazerem de um jeito próprio – o que é bastante enriquecedor para as crianças.
“O papel do pai mudou principalmente porque o papel da mãe mudou. As mulheres saíram de casa e foram para o mercado de trabalho. Então foi compulsório que o papel do pai fosse revitalizado e assumisse um novo contorno. Por isso quando pensamos na mudança do papel do homem em casa devemos antes pensar na mudança no papel das mulheres na sociedade”, explica a psicóloga Rita Calegari do Hospital São Camilo, em São Paulo.
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