Comportamento

Carolina Werneck

Um pouco artista, um pouco amigo: professor estrela de um cursinho de Curitiba

Carolina Werneck
14/10/2017 17:00
Thumbnail

O professor de química Giba Lavras já teve 870 mil alunos. Foto: Instagram/Reprodução | Carolina Werneck Bortolanza

“Educar é conviver”, repete muitas vezes o professor Gilberto de Campos Lavras, ou simplesmente Giba, ao longo de quase uma hora de conversa sobre educação. Com 870 mil alunos no currículo, ele é uma das estrelas de um dos maiores cursinhos de Curitiba. Sucesso com os estudantes, com os pais e com os outros professores, o mestre de química garante que nunca teve problemas com alunos em sala de aula.
Nascido em São Paulo, Giba veio para Curitiba em 1995, a convite do Positivo. Nos últimos 22 anos, ele tem exercitado sua simpatia em terras paranaenses, dando aulas para adolescentes de vários cantos do Brasil. “É uma riqueza muito grande você ter pessoas diferentes, que pensam diferente. Às vezes você tem alunos de todos os estados do país e até de outros países. O aluno precisa ter um nome, não um número. Assim como, na natureza, prevalece a biodiversidade, a heterogeneidade das pessoas é fundamental para o desenvolvimento de cada um.”
A fala gentil, mas acelerada, conquista rápido os corações dos jovens, ainda que a química não seja uma matéria simples de ser ensinada. O truque, Giba conta, é fazer o aluno entender que vantagem ele leva em escutar o que o professor tem a dizer.
“O aluno faz uma pergunta e você não pode menosprezar a dúvida dele. O professor não tem esse direito, porque às vezes aquela dúvida que parece simples, para aquele aluno é o elo de todo o conhecimento. Às vezes ele deixa de construir uma carreira por causa de uma resposta assim”, avalia.
Cada aluno é importante
O cuidado e o carinho no trato com cada um dos que passam por sua sala de aula vêm da vivência profissional do professor. Ele sabe quando os pais, muitas vezes sem querer, pressionam demais os filhos por resultados positivos.
“Dê um tempo para o jovem amadurecer. Às vezes o filho era o melhor aluno do colégio no interior. Ele tem potencial, mas tem que ter um ambiente favorável para crescer. Aqui no cursinho tem pessoas de todos os estados do Brasil querendo a mesma coisa que ele.”
Manter a atenção para com a turma é, de acordo com o professor, outra chave para cultivar o respeito mútuo. Como muitos de seus alunos vêm de fora de Curitiba, ele afirma estar sempre tentando dar apoio emocional a eles. “Tenho alunos do Acre, Roraima, da Bolívia. Muitas vezes o cara não tem nem com quem conversar aqui. É comum você começar a conversar no corredor e o cara chorar e te abraçar.” Essa compreensão e o ombro emprestado fora da sala de aula constroem mais que relações hierárquicas de professor-aluno. Constrói amizades.
É o caso de Amanda Garcia Leal. Vinda de Paranavaí há três anos para cursar o ensino médio, a jovem de 17 anos diz que vê Giba como um verdadeiro amigo. Principalmente para o pessoal que vem para cá e não está com a família, ele sempre está disposto a apoiar, dar ajuda quando precisa. Ele tem um papel de mais que um professor, ele entende o que os alunos estão passando.”
Em sua conta no Instagram, Giba está sempre cercado de alunos e colegas de trabalho. Foto: Instagram/Reprodução
Em sua conta no Instagram, Giba está sempre cercado de alunos e colegas de trabalho. Foto: Instagram/Reprodução
Educação básica e responsabilidade social
“O governo tem que investir em educação básica, não privilegiar só a faculdade. Para que nós não tenhamos essa diferença social terrível. Falta um salário digno para os professores. O ensino básico tem que pagar bem todo mundo. É muito triste ver o salário que eles passam para os professores.” 
Para Giba, é no início da vida escolar que se igualam as condições para que todos os estudantes possam atingir os mesmos níveis de excelência quando forem mais velhos. Enquanto os professores do ensino básico não forem valorizados, ele diz, o país seguirá afundando.
Orientar o jovem para que ele tenha condições de entender até onde é capaz de chegar é outro passo fundamental para o professor. “Às vezes o jovem não sabe o que fazer porque ele não tem ideia do que pode fazer.” Ele conta que, sempre que possível, faz questão de lembrar às suas turmas que a oportunidade que elas têm não é comum.
“É o tal negócio: a gente está bem, mas teve toda uma estrutura para isso. Não esqueçam jamais que somos um por cento do país que tem acesso a poder escolher o que vai fazer. Então a gente tem que ter uma grande responsabilidade para com o pessoal que está carente.”
Giba e Anta
É notável a alegria que Giba emprega no exercício da profissão que escolheu. Até para tornar a química mais acessível para os alunos, ele criou o personagem Anta, que o acompanha há mais de uma década. “Eu pensei ‘como fazer esse pessoal se interessar por química?’ Aí comecei a trabalhar com o cotidiano.”
O boneco verde é outro sucesso. Em sua conta no Instagram, o professor aparece muitas vezes acompanhado dele ou de produtos de uma linha exclusiva inspirada nele.
Usar o humor foi a saída encontrada para que os jovens não se dispersassem nem mesmo quando o professor precisa se virar para o quadro. “Professor, sua aula é um momento mágico, a gente tem um papel fundamental neste país. Se você a prepara com carinho, cada aula é um mundo diferente, embora a matéria seja a mesma. O professor tem que pulsar na mesma frequência do aluno”, aconselha.
Alguns vídeos postados no Youtube demonstram na prática como funciona essa interação entre Giba e Anta. Música, piadas, tiradas irônicas, tudo é válido para passar o conteúdo de uma forma mais didática.
Gente, gente, gente
A grande inspiração para outros professores se dá, talvez, pela paixão que ele nutre pelo contato com os estudantes. Ex-jogador de handebol, ele chegou a fazer parte da seleção brasileira, mas deixou o esporte para se dedicar totalmente à química.
Ele afirma ter aprendido com a mãe que “se o melhor é possível, o bom não é suficiente”. E tem outras boas frases na ponta da língua.
Uma delas, também repetida à exaustão, diz que “só de um amplo trabalho comum, em que se entrecruzem conhecimentos, métodos e experiências, é que se colherão frutos que deem não apenas o sabor da polpa, mas também, e principalmente, a promessa de sementes e raízes para um futuro melhor.” Essa ele atribui a um grande amigo de sua mãe, José Reis. Também diz ter aprendido muito com um professor seu, Geraldo Camargo de Carvalho. Cita o pai e a irmã com muita consideração, fala de ex-alunos, ex-colegas de trabalho.
A soma de tudo isso só poderia resultar em um profissional apaixonado por transmitir conhecimento. “Eu adoro pessoas, nasci para lidar com gente.”
LEIA TAMBÉM: