Comportamento

Rafael Costa

Terminal Guadalupe vira cenário de vídeos para humorista curitibano

Rafael Costa
18/10/2017 18:00
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Foto: Glauber Gorski/Divulgação

“O Terminal Guadalupe é como uma Las Vegas… depois do apocalipse. Só sobraram os mendigos, os viciados, as prostitutas, os passageiros que vêm e vão da Região Metropolitana e o comércio de cabelo. Há tanto cabelo no Terminal Guadalupe que poderia se acabar com a calvície do mundo.”
Este é o Terminal Guadalupe segundo o detetive particular Leonel Bizinelli, um dos personagens do ator e comediante paranaense Fábio Silvestre. “O pior detetive da República de Curitiba” estreou nos palcos neste ano e deve ganhar uma websérie inspirada nos filmes noir em 2018.
Silvestre, que também assina os roteiros, já divulgou três vídeos no Facebook. São “experimentos” para encontrar a linguagem ideal para a produção, explica. Neles, o anti-herói flana pelo terminal, fila tocos de cigarro, janta pastel, vomita no meio-fio.
É uma figura inspirada no universo subterrâneo do Guadalupe que entrou para o imaginário curitibano. Um lugar de passagem, perigoso e degradado, frequentado por todo tipo de gente e visitado por criaturas estranhas — às vezes comparadas a alienígenas, às vezes a zumbis.
“A gente tira muito sarro do Guadalupe por uma série de coisas, mas sempre enxerguei como um filme noir”, diz Silvestre, em entrevista ao Viver Bem.
Guadalupe faz parte da história do “detetive”
O comediante conta que deve muito ao terminal e suas figuras mais folclóricas, que inspiraram outros personagens além do Detetive Bizinelli. Sua relação com a cidade passa por ali.
Foi no terminal, que liga a Região Metropolitana ao Centro de Curitiba, que o ator pegou seu primeiro ônibus. Silvestre saiu de Ponta Grossa para estudar artes cênicas na Faculdade de Artes do Paraná (FAP) em 1993. Antes de se mudar para a capital, posou na casa de uma tia em Colombo.
“Ter circulado por ali foi essencial para o meu trabalho. Se tivesse um cronista exclusivo do Terminal Guadalupe, ele teria um material riquíssimo”, diz, citando pedintes, donos de lanchonetes, loucos, mendigos simpáticos, vendedores ambulantes e cobradores de ônibus com a unha do mindinho comprida, corrente de ouro e palito de dente de boca.
Não à toa, um de seus personagens mais conhecidos é o motorista de ônibus Bigode, que ficou conhecido nacionalmente no programa A Praça É Nossa, do canal SBT.
“É um apanhado de vários motoristas — muitos, que vi no Terminal Guadalupe”, conta.

Mudanças
Na percepção de Silvestre, no entanto, o lugar foi se transformando nestes quase 25 anos. Ficou mais asséptico e perdeu alguns de seus tipos mais caricatos — e temidos, pelo menos antes das 23 horas.
“O negócio era mais brabo logo cedo”, lembra. “Hoje, mesmo quando estamos filmando, temos que procurar o Guadalupe da nossa memória, porque ele está mais limpo, organizado”, conta.
Nas lembranças do comediante, o terminal era uma representação mais localizada dos problemas da cidade, que acabariam se espalhando e desfazendo o mito de “modelo” que era associado a Curitiba na época.
“Quando cheguei, Curitiba vivia uma espécie de era de ouro. Havia um certo orgulho da cidade. O Guadalupe era ainda mais distante da cidade modelo, um dente cariado na boca da cidade sorriso ”, teoriza.
Para ele, o Guadalupe que ainda serve como cenário para uma história como a de seu novo personagem deve ficar no passado.
“Hoje, vejo a discussão do projeto de revitalização, de transformação em um centro de turismo religioso. E tenho a sensação de que aquele Guadalupe vai morrer de alguma forma”, prevê.
“A tendência é que vire uma memória. Uma memória afetiva, por mais que tiremos sarro, porque faz parte da história de muita gente que viveu na região.”
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