Moda e beleza

Adriano Justino

Conheça curitibanas cheias de estilo depois dos 60 anos

Adriano Justino
08/02/2015 05:00
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Regina Vogue: estilo descolado e muita personalidade aos 70 anos.

Particularmente hoje, não é possível dizer que a moda ignora as mulheres assim que elas fazem 60 anos – idade em que o governo brasileiro, por exemplo, passa a classificar os cidadãos como “idosos”. Afinal, elas estão em alta. Uma prova é que a marca Dolce&Gabbana as estampou na campanha de primavera-verão de 2015, que tem como tema a família. Também a Céline escalou a escritora Joan Didion, 80 anos, para ser um dos rostos da grife. Ou seja, a indústria reconhece um mercado nessas mulheres que têm dinheiro para gastar e apreço por sua autoimagem (ainda que, contraditoriamente, mantenha a juventude no pedestal). Mas isso não significa que está mais fácil para elas ter a moda a seu favor.
Um dos motivos: ao fazer 60 anos, mesmo mulheres que foram estilosas a vida toda podem entrar em parafuso. Deparam-se com uma série de limitações saídas de manuais e da boca de consultores . “Não mostre os braços”; “tape as pernas”; “reveja o decote”; “fuja do ridículo”. O fato é que as mulheres que se tornam conhecidas por seu estilo de se vestir são as que mais ignoram receitas, como nota-se na fala das entrevistadas nas páginas a seguir. Algumas se vestem de jeito muito parecido com o da juventude; outras alteraram uma ou outra coisa, em especial para ter conforto ou para refletir amadurecimento.
A jornalista de moda Regina Guerreiro, 74 anos, defende que as mulheres devem mudar sua imagem se for para se sentirem bem, o que exige autoconhecimento. “Não acredito muito em regras, sabe? O que muda é a vida. Muda o ritmo, mudam as obrigações, mudam os compromissos. Mudam as paixões, principalmente”. Foi o que levou Regina a abolir uma marca registrada: o cabelo chanel com franjinha, hoje um curto grisalho com nuca batida e franjão. “Sou outra mulher, outro corpo, outra pessoa. Quero que o mundo veja essa pessoa que me tornei, depois de muitas idas e vindas, erros e acertos, perdas e ganhos”.
Autora do livro A Bela Velhice, a antropóloga Mirian Goldenberg acredita que as novas gerações de “velhos” estão cada vez mais bonitas e felizes porque fazem o que gostam. E a forma mais visível disso é o estilo de se vestir. “O que introjetamos sem questionar, acabamos reforçando. Vencemos isso escolhendo roupas de que gostamos, independentemente do que querem que façamos”, diz ela. “Segundo a pesquisa que faço desde 2007, as pessoas que envelhecem bem são as que seguem a sua vontade.”
A CRIATIVA
Aos 70 anos, a atriz Regina Vogue usa blusas com transparências, calças legging, botinhas, jaquetas de couro e acessórios no cabelo. Quase tudo em seu guarda-roupa é vermelho, preto ou branco. Ela define seu estilo como “cigano” – nômade, criativo, artsy. Assim como ela, que aos 16 anos entrou para o circo e tomou gosto pela liberdade. “Invento roupa, mudo, corto, vou pirando com as minhas coisas.”
A atriz na foto que estampa a edição impressa do Viver Bem: personalidade.
A atriz na foto que estampa a edição impressa do Viver Bem: personalidade.
Como escolhe que roupa vestir?
De acordo com o meu estado de espírito. Não gosto de me vestir como senhora, com blazer e saia igual. Preciso me sentir à vontade. Por exemplo, adoro vestido tipo melindrosa, com cintura lá embaixo. Fica muito bem em mim. Há como ficar elegante com roupa “jovem”, é só ter bom senso. Por outro lado, não gosto de joias, brilhos, nem de estampas de bicho.
A idade mudou algo no seu estilo?
Acredito que não muito. Nos anos 1960, eu usava saia rodada com delineador nos olhos e lenço no cabelo. Era igual à Amy Winehouse! Hoje uso saia, mas coloco meia-calça para sair à noite. O cabelo sim, mudou muito. Digo que é dependente químico: no dia em que eu parar de usar química, vai cair.
Teve a influência de alguém para achar o seu estilo?
Eu tinha tias lindas, vaidosas. Uma vez, eu devia ter uns 14 anos, roubei um vestido pink de uma delas, com uma fenda na perna, para ir a uma festa.
A MODERNA
A empresária Rosil Lago, 73 anos, vive de roupas esportivas (é dona de um spa), mas adora modelos modernos. Tem paixão por suas peças da Gloria Coelho (como o vestido da foto, com gola de neoprene recortado) e de Clô Orozco. “Quem me auxiliou, me deu base, foi a Vera Casagrande, uma estilista de quem tenho muitas peças até hoje”, lembra. “Já minha mãe era uma mulher caseira, mãe de dez filhos, nunca teve tempo para essas coisas.”
A empresária Rosil Lago gosta de modelos modernos, de grifes famosas.
A empresária Rosil Lago gosta de modelos modernos, de grifes famosas.
Como define o seu estilo?
Gosto de roupas práticas, que não podem a minha liberdade, e de roupas “de vanguarda”, descontraídas. Não gosto muito de cores, prefiro branco e preto. Fui mudando meus gostos. Antes eu era muito influenciada por mídia, amigas, e hoje ninguém mais determina nada. Minha personalidade está solidificada, sei bem o que quero e não adianta impor. Uso poucos vestidos curtos. Prefiro longos, caftans e camisas de seda.
Passou a seguir regras depois de certa idade?
Não saio mais com saltos 15 [centímetros] no dia a dia por segurança, mas acho lindo. Uso em ocasiões em que não preciso ficar muito de pé. Vejo moças andando de salto na calçada e não faço mais esse sacrifício. Sapatilha é a minha preferência.
Faz diferença ser de marca ou não?
Faz quando eu gosto da grife. Vejo mais a qualidade. Minha paixão são os óculos, escuros e de grau, e tenho peças que compro quando viajo, não de lojas especializadas. Compro o que gosto.
A EXÓTICA
Questionada sobre como (e se) fez a transição de estilo da juventude à maturidade, a divertida Linda Bruder, 68 anos, reconhece: “acho que passei direto”. Psicóloga aposentada, desde muito cedo optou por usar só o que gosta. “Nunca segui moda, sempre tive o meu estilo. Até as pessoas falavam que eu parecia muito exótica e tal, mas é porque eu gosto”, diz.
A psicóloga Linda Bruder sempre se manteve fiel ao seu estilo, sem seguir a moda.
A psicóloga Linda Bruder sempre se manteve fiel ao seu estilo, sem seguir a moda.
Como define o seu estilo?
Eu diria que é “grande” [risos]. Nunca conseguiria usar tailleur, joias e óculos pequenos. Gosto de saia longa. Até saio de curto, mas não parece a mesma coisa. Tenho bijuterias grandes porque não adianta para mim ter pulseirinha. Já coloco quatro ou cinco.
Qual o segredo para ter estilo próprio?
Minha mãe faleceu com 89 anos e parecia ter 70 porque se arrumava muito bem. O outro segredo é estar de bem com a vida. O único problema que existe de fato é a morte, o resto são coisas contornáveis.
Acha que é preciso ter muita roupa para se vestir bem?
Não. E não precisa gastar muito. Eu até sou consumista, mas não saio para comprar roupa. Elas “aparecem” no meu caminho. Fui outro dia à lavanderia e acabei comprando um vestido de R$ 50 em uma loja do bairro. E usei por anos o cabelo comprido, mas me inspirei nos cortes que vi em Londres e decidi cortar. Gastei R$ 30 em um salão no Santa Quitéria.
A DISCRETA
“É Cavalli. Mas não gosto de tudo dele, escolho bem.” Assim Meri Buschle, 78 anos, descreve o vestido tubinho que usava para esta reportagem, discreto se comparado com as criações que fizeram a fama do estilista italiano. Dona de ateliê nos anos 1980, Meri mantém a curiosidade para tudo relacionado à moda: gosta de fuçar araras, ler etiquetas, tocar tecidos. O estilista preferido, porém, continua sendo o elegante Yves Saint Laurent.
Meri Buschle continua apaixonada por moda aos 78 anos.
Meri Buschle continua apaixonada por moda aos 78 anos.
Como começou a se interessar por moda?
Desde pequena. Uma vez, eu devia ter uns 11 anos, minha mãe nos levou, eu e minhas irmãs, a um ateliê para encomendar vestidos. A costureira me mostrou um modelo, que seria para todas nós, mas eu não quis. Queria outro. Minha mãe disse que não ficaria bom, mas bati o pé. Acho que isso nasce com a pessoa e você amadurece ou não.
Alguém inspirou você?
Sempre me lembro da minha avó. Aos 70 anos ela só andava de tailleur, sempre com brincos, linda, numa época em que essa idade era considerada “de velhinha”. Ela sempre dizia: “Minha filha, quem não se enfeita, se enjeita!”.
Mudou o seu jeito de se vestir por causa da idade?
A numeração das roupas é confusa desde que inventaram isso de 36, 42… quando eu era moça, as roupas eram estruturadas, com números certos. O corpo vai mudando e fica mais difícil [achar a modelagem certa]. Mas continuo usando muita coisa de antes, só mudo a moda. Porque roupa com enchimento não dá mais [risos].