Moda e beleza

Marina Mori

Do básico ao protesto: entenda qual é a simbologia por trás da roupa preta

Marina Mori
03/03/2018 17:00
Thumbnail

Da esquerda para a direita: a ativista Rosa Clemente, Natalie Portman, Michelle Williams, America Ferrera, Jessica Chastain, Amy Poehler, Meryl Streep, Ai-jen Poo e Saru Jayaraman. Foto: Tara Ziemba / AFP | AFP

Desde que as atrizes de Hollywood apareceram vestidas de preto no Globo de Ouro, em janeiro, tudo indicava que 2018 seria um ano marcado pela luta contra o assédio. E assim tem sido. Ainda é março e o evento norte-americano abriu não apenas a série de premiações da indústria do entretenimento como também possibilitou que todos os olhos voltados ao red carpet pudessem ver além dos trajes de gala.
Sem precisar erguer a voz, atrizes e atores elegeram alguns símbolos para demonstrar apoio à campanha Time’s Up, criada para proteger vítimas de assédio na indústria do entretenimento.
No Grammy, usaram uma rosa branca; no Bafta, o “Oscar britânico”, voltaram ao preto total. Entre as participantes do protesto, atrizes como Angelina Jolie, Meryl Streep e Jennifer Lawrence. O próximo – e mais importante – ocorre neste domingo, 4. Qual será o símbolo de resistência adotado pelas atrizes e atores durante o Oscar 2018?
Globo de Ouro 2018. Da esquerda para a direita: Jessica Chastain, Millie Bobby Brown, Angelina Jolie, Blake Lively, Jessica Biel. Fotos: Reprodução / Pinterest
Globo de Ouro 2018. Da esquerda para a direita: Jessica Chastain, Millie Bobby Brown, Angelina Jolie, Blake Lively, Jessica Biel. Fotos: Reprodução / Pinterest

Por que o preto foi a cor escolhida para os protestos de Hollywood

Se a cor escolhida tivesse sido outra, o impacto não seria tão grande, avalia a professora do curso de Design de Moda do Senai e coordenadora de projetos de criação, Daniela Nogueira. “Ele tem uma simbologia muito forte de posicionamento. Como as atrizes estão em um lugar com uma visibilidade absurda e, por serem quem são, o preto forma uma espécie de exército”, explica.
Mas não só. Segundo ela, a cor preta (ou a “não-cor”, como também foi chamada pelo artista russo Kandinsky) teve inúmeros significados ao longo da história. Poder, negócios, negação, força. Em cada período, uma simbologia foi associada ao preto, desde que ele passou a fazer parte das roupas – o que ocorreu por volta dos anos 1.400, quando os espanhois descobriram o pigmento nas Américas.

“Uma coisa é certa: o preto tem uma conotação de austeridade. Em épocas mais difíceis, ele sempre aparece no traje”, afirma a personal stylist Fernanda Marochi.

Todo movimento, seja ele velado ou não, gera um tipo de informação e discussão, continua a profissional, que também já ministrou aulas de história da moda. “Elas conseguiram mobilizar a atenção por estarem todas vestidas com uma cor que carrega tanto simbolismo.”
No Grammy, o protesto ficou por conta da rosa branca. Mesmo assim, muitas atrizes mantiveram a “não cor” como parte do look, como Miley Cyrus, Heidi Klum. Fotos: Reprodução Instagram
No Grammy, o protesto ficou por conta da rosa branca. Mesmo assim, muitas atrizes mantiveram a “não cor” como parte do look, como Miley Cyrus, Heidi Klum. Fotos: Reprodução Instagram

Luto ou luta?

Apesar de o preto ser associado ao luto nas sociedades ocidentais – tradição que, aliás, surgiu durante o período vitoriano (século 19), quando a Rainha Victoria vestiu a cor durante sete anos após a morte de seu marido -, o significado não deve ser associado aos protestos de Hollywood, segundo Daniela.
“A cor representa, na verdade, uma luta. A escolha (das atrizes) foi feita para unificar, porque o preto é uma cor que consegue unificar ou isentar uma ideia em detrimento de outra”, afirma a especialista.
Retrato da rainha Victoria. Durante seu reinado, o preto ganhou popularidade não só por conta do luto, mas também porque a monarca tinha forte apreço pela cor. Foto: Reprodução Flickr / The Lost Gallery
Retrato da rainha Victoria. Durante seu reinado, o preto ganhou popularidade não só por conta do luto, mas também porque a monarca tinha forte apreço pela cor. Foto: Reprodução Flickr / The Lost Gallery

Críticas

Apesar de o movimento ter reunido centenas de participantes, algumas pessoas não aderiram ao preto e apareceram no red carpet com outras cores, como as atrizes Barbara Meyer e Blanca Blanco. Segundo Daniela, a “pressão” em tornar a decisão unânime é perigosa.

“Desde a Idade Média, o preto passa a ideia de uma organização extremamente fechada, em que ninguém pode entrar. Por isso, quem não estava usando a mesma cor no red carpet foi praticamente excluído, como se não concordasse com o movimento.”

Algumas, de fato, não concordaram. As atrizes francesas Catherine Deneuve e Ingrid Caven, por exemplo, assinaram em janeiro um texto criticando o “puritanismo” das norte-americanas. Em vez de se vestirem totalmente de preto, as francesas estão usando o skinny scarf, que deriva do plastron. A peça, de seda ou mousselina, era usada pelos homens que queriam se destacar na sociedade. Hoje, é tendência de moda. “Pode ser uma forma de elas mostrarem que elas também têm suas lutas”, propõe a especialista.
Foto: Pinterest
Foto: Pinterest

Protestos? Entenda o caso

Quando as primeiras acusações de assédio sexual que ocorriam dentro de Hollywood foram divulgadas, nos últimos meses do ano passado, foi uma questão de dias até que a pólvora se alastrasse pelas redes sociais de todo o mundo. Dezenas de atrizes – entre elas, Angelina Jolie, Gwyneth Paltrow e Meryl Streep – se uniram e compartilharam relatos de opressão e abusos que expuseram os “figurões” da indústria cinematográfica.
Entre eles, um dos produtores mais influentes do meio, Harvey Weinstein; o ator Dustin Hoffman; o chefe de animação da Disney e da Pixar, John Lasseter, e o produtor Brett Ratner. Foi impossível dizer que nada aconteceu, e elas fizeram questão de manter o assunto nos trending topics. A atriz americana Alyssa Milano encabeçou o movimento no Twitter, que reuniu milhares de denúncias através da hashtag #MeToo (eu também).
LEIA TAMBÉM