Saúde e Bem-Estar

Amanda Milléo

Médicos explicam relação entre açaí e doença de Chagas; há riscos?

Amanda Milléo
06/10/2017 08:00
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(Foto: Bigstock)

O açaí se popularizou, nos últimos anos, em partes do Brasil onde antes era incomum, como no Sul. O aumento no consumo do fruto, no entanto, acendeu o alerta dos especialistas para uma doença que, embora com sintomas tratáveis, não tem cura na fase crônica: a doença de Chagas.
Comer açaí não significa que, automaticamente, a pessoa ficará doente. Mas o fruto costuma atrair uma espécie de inseto, mais conhecido por barbeiro,  cujo intestino guarda os protozoários Trypanossoma cruzi – esses, sim, causadores da doença.
Uma vez moídos junto ao açaí, formando a pasta de cor escura (onde é difícil perceber qualquer corpo estranho), os protozoários são ingeridos e passam a se reproduzir dentro do organismo humano. Instalados no coração e no intestino, músculos estriados onde gostam de ficar, os protozoários geram as sequelas comuns da doença: problemas cardíacos, como a insuficiência, e dilatação do intestino, prejudicando a evacuação.
“Isso pode acontecer com qualquer elemento comestível. Em Santa Catarina, há mais de 10 anos, teve casos em que a doença de Chagas surgiu a partir do consumo do caldo de cana. Em Curitiba e no Sul há pouca incidência da doença, mas o Paraná teve, em anos anteriores, muita transmissão, principalmente no Norte Pioneiro. Com a eliminação do barbeiro, isso praticamente acabou”, explica Alceu Fontana Pacheco Junior, médico infectologista e conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRMPR).
Em todo o Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, surgem entre 100 a 150 novos casos da doença todos os anos, com prevalência na região Norte do país. Mas o alerta cabe a todo o país, especialmente agora, com a entrada das estações mais quentes, Primavera e Verão.
“As pessoas que manipulam o açaí devem ter uma higiene absoluta. Aí se encontra o risco de ingerir o açaí comprado na beira da estrada, ou mesmo o caldo de cana”, reforça Marta Fragoso, médica infectologista do hospital VITA.
Doença de Chagas tem cura?
Dividida em duas fases, na primeira – chamada de aguda – há medicamentos que levam à cura da doença, desde que administrados precocemente. “Existe um remédio chamado benzonidazol [incorporado ao SUS] que pode eliminar, principalmente na fase aguda. Nessa fase, é mais fácil identificar o protozoário e eliminá-lo”, reforça Alceu Fontana Pacheco Junior, médico infectologista.
Ainda na fase aguda, os sintomas do paciente lembram um quadro de infecção tradicional, com febre e mal estar. Na fase crônica, a doença entra em momento chamado de indeterminado, até que manifeste problemas cardíacos ou digestivos.
“É mais difícil eliminar o protozoário nesta fase porque ele está isolado em alguns nichos do organismo e o medicamento pode não fazer efeito. As últimas recomendações do Ministério da Saúde, no entanto, indicam o tratamento, mesmo na fase crônica”, diz o médico infectologista.
De acordo com Marta Fragoso, médica infectologista, boa parte dos diagnósticos da doença de Chagas são feitos tardiamente, quando os estragos são maiores ao coração e intestino. “São tratados os sintomas, porque não há nenhuma medicação específica que possa ser usada de rotina. No caso do cólon, o tratamento é cirúrgico e a insuficiência cardíaca é tratada de forma medicamentosa”, explica.
Congelar o açaí previne a doença?
Infelizmente, não. Durante o 20º Congresso Brasileiro de Infectologia, a médica Maria Aparecida Shikanai Yasuda, pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP), alertou para um estudo que mostrava como o protozoário causador da doença de Chagas consegue sobreviver mesmo sob resfriamento ou congelamento.
A única forma comprovada para prevenir a transmissão da doença é através do aquecimento da polpa de açaí a 43ºC durante 20 minutos.
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