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Milho safrinha espalhado no chão em fazenda do Mato Grosso. | Reprodução/
Milho safrinha espalhado no chão em fazenda do Mato Grosso.| Foto: Reprodução/

Começaram a surgir as impressionantes imagens de montanhas de milho armazenadas a céu aberto no Mato Grosso, principal produtor de grãos do País. Neste ano, a primeira situação de estocagem ao ar livre foi registrada na fazenda Tupi Barão, do grupo multinacional El Tejar, no município de Ipiranga do Norte.

Deixar o milho colhido ao relento pode ser resultado de uma simples conta que não fecha: estimativas mais conservadoras mostram que o Brasil deve fechar o ciclo 2016/2017 com uma supersafra de 220 milhões de toneladas de grãos, podendo chegar até 238 milhões, se valer a última projeção do IBGE. A capacidade de armazenamento, no entanto, é de 168 milhões de toneladas, cerca de 60% do total produzido.

“Enquanto tivermos este déficit de estocagem, não será a primeira nem a última vez que veremos isso. O que acontece é que o milho sempre vai ser preterido no armazenamento, quando competir com a soja”, aponta o diretor-executivo da Associação dos Produtores de Soja do Brasil, Fabrício Rosa, lembrando que a soja dá mais rentabilidade para o produtor.

O milho safrinha, que hoje não cabe nos armazéns do País, ganhou esse apelido devido à pouca representatividade do cultivo de inverno quando foi introduzido na década de 70, mais como uma prática de proteção do solo do que por seu potencial comercial. Pois a tal safrinha virou safrona e responde atualmente, só no Paraná, por 67% da produção anual de milho.

No desafio de administrar duas safras por ano cada vez maiores, as cooperativas e armazéns mantêm a prática de “dar o tombo” nos estoques, ou seja, terminam de despachar uma colheita justamente na hora em que a outra está chegando. Às vezes, no entanto, o sistema encavala e os grãos batem à porta, mas não tem lugar para guardar. “Por sorte, a previsão é de ausência total de chuva no Mato Grosso nas próximas semanas, então não deve haver muito prejuízo na qualidade deste milho deixado a céu aberto”, aponta o consultor Aldo Lobo, da corretora Granopar.

Pressa para vender

Sem ter onde guardar a colheita, os produtores acabam vendendo no pico da safra, quando, naturalmente, os preços são menores. No Mato Grosso, a estrutura de armazenamento não dá conta sequer de metade da produção, enquanto no Paraná o índice chega a 75%, o que ainda gera problemas. “Todo dia tem gente querendo vender soja ou milho com pressa para retirar”, diz Aldo Lobo. Uma alternativa nesses casos, segundo ele, é escoar os grãos pelo porto de Rio Grande, no Rio Grande do Sul. “Para Paranaguá, é preciso programar a carga e esperar alguns dias. No Rio Grande dá para descarregar de imediato, por que lá eles não têm milho safrinha e é mais comum ter silo nas fazendas para esperar a melhor hora de vender”.

A solução para armazenagem não virá a curto prazo. No Brasil, segundo a Aprosoja, apenas 14% dos produtores têm silos próprios, contra 40% na Argentina e 60% nos EUA. O atual Plano Safra criou uma linha de crédito com juros de 6,5% ao ano para tentar estimular a expansão dos silos. “Ainda é muito caro para o produtor, pessoa física, fazer este tipo de investimento. Estamos incentivando no Mato Grosso a formação de grupos, de consórcios de investimento, como já é feito entre os produtores no Paraná”, diz Fabrício Rosa, da Aprosoja. Segundo os cálculos da associação, com um sistema próprio de armazenagem, a cada quatro safras ganha-se uma. Isso acontece pela diminuição das perdas da correria na colheita, pelo maior controle da comercialização (venda na época certa) e pela possibilidade de balancear a qualidade do produto, controlando, mediante misturas, o percentual de grãos com inconformidade (que rebaixa o preço).

Do jeito que funciona hoje, muitos produtores não têm a opção estratégica de esperar o melhor preço para venda. “O ideal seria ter um espaço para carregar 20 a 30% da produção, esperando um preço melhor. Mas como o produtor rural tem que honrar compromissos e pagar as contas, ele acaba vendendo nos períodos de pico e ganha menos pelo que produz”, resume Pedro Loyola, economista da Federação da Agricultura do Paraná.

Para o analista da agência Safras e Mercados, Paulo Molinari, o investimento na ampliação da capacidade de armazenagem é uma obrigação permanente, mas não existe logística que resolva quando todos esperam para vender somente após a colheita. “O produtor ainda vende a sua safra como 30 anos atrás, ou seja, sempre depois que colhe”. Para arrumar o gargalo de armazenagem, seria preciso reeducar o mercado quanto às formas de comercialização. Para corroborar esse ponto de vista, Molinari observa que até o mês de junho o Paraná tinha negociado apenas 50% da safra de soja e, o Mato Grosso, menos de 30% da safrinha de milho. “Isso aconteceu mesmo tendo havido preços excepcionais, em 2016, para a safra nova de 2017. A tomada de decisão na comercialização não pode ser dada apenas pela velha tradição de colher, segurar para vender mais tarde apostando em algo que pode não surgir. Se os preços estão bons em relação aos custos, a comercialização antecipada tem que ser realizada”, conclui Molinari.

A reportagem do Agronegócio da Gazeta do Povo não conseguiu contato com os administradores da fazenda Tupi Barão para saber o motivo da estocagem do milho a céu aberto. O vídeo, que circula nas redes sociais, foi feito por um operador de máquinas.

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