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Leon du Toit, seu filho Johannes du Toit, Vladimir Poluboyarenko e Mikhail Baranov: agricultores brancos sul-africanos estão sendo incentivados a se mudar para a Rússia. | Amie Ferris-Rotman/The Washington Post
Leon du Toit, seu filho Johannes du Toit, Vladimir Poluboyarenko e Mikhail Baranov: agricultores brancos sul-africanos estão sendo incentivados a se mudar para a Rússia.| Foto: Amie Ferris-Rotman/The Washington Post

Leon du Toit respira lentamente a brisa que sopra no final do verão nos campos de uma fazenda de gado leiteiro, não muito longe de Moscou. “O cheiro é parecido com o da minha terra”, diz o sul-africano, de 72 anos. Isso é exatamente o que as autoridades russas querem ouvir.

Du Toit lidera uma ofensiva na África do Sul com um objetivo muito particular: atrair sul-africanos brancos para uma mudança de 13 mil km de distância, em direção à Rússia rural. Os pontos atrativos são terras férteis abundantes, relativa segurança e um país que se agarra aos valores cristãos tradicionais.

O que não é dito - mas claramente entendido - é como isso se encaixa perfeitamente na política de identidade do presidente russo Vladimir Putin. O Ocidente pode ver Putin em grande parte como um adversário estratégico e militar. No entanto, dentro da Rússia, boa parte de seu apoio vem da ideia da Rússia como guardiã de uma ordem branca, cristã e antiga - rejeitando o modelo ocidental de tolerância, “sem gênero e infértil”, nas palavras de Putin em 2013.

Tais comentários ajudaram a elevar a estatura de Putin entre populistas e movimentos políticos impulsionados por nativistas no Ocidente. E, dentro da Rússia, eles dão fôlego ao discurso de pessoas de dentro da política, como Vladimir Poluboyarenko, um representante do governo da região de Stavropol, no sul da Rússia. Poluboyarenko assumiu a liderança na organização de viagens à Rússia para sul-africanos brancos dispostos a considerar a imigração.

Problemas

O esforço é motivado por muitas variáveis. Há declínio da população russa e preocupações com a influência do Islã nas fronteiras do país. Acrescente-se a isso o desconforto entre alguns agricultores brancos da África do Sul enquanto o país debate a possível redistribuição de terras para corrigir os desequilíbrios raciais durante o apartheid.

Poluboyarenko alega que financia as viagens dos sul-africanos com suas próprias economias, mas tal atividade certamente precisaria da bênção do Kremlin. De acordo com um relatório do ano passado do Pew Research Center, menos de 10 mil sul-africanos vivem atualmente na Rússia. Em abril, o país cancelou as exigências de visto de turista para os sul-africanos.

“Quero que eles saibam que a Rússia também pode ser seu país-mãe”, diz Poluboyarenko, que auxilia o ombudsman de direitos humanos no centro agrícola de Stavropol.

Du Toit, que é pregador missionário, está pensando na oferta dos russos. Ele e seu filho de 39 anos, Johannes du Toit, vieram em missão de reconhecimento. Os brancos ainda possuem a maioria das terras na África do Sul, apesar de representarem menos de 10% da população de 56 milhões de habitantes. Mas du Toit compartilha o temor de alguns fazendeiros brancos de que a trajetória política da África do Sul, como a questão da propriedade da terra, não tende a lhe ser favorável.

Numa tarde nublada, os homens do du Toit foram conduzidos através de uma campina repleta de alfafa. Du Toit inclinou-se e pegou algumas folhas, que começou a mastigar. Seus anfitriões olhavam, um tanto hesitantes, antes de aplaudir a ação do mais velho du Toit.

Poluboyarenko levou seus visitantes para conhecer uma faixa da zona rural russa por vários dias, apresentando-os aos agricultores locais. “Entendemos que nosso governo deve ouvir a maioria das pessoas”, afirma Johannes du Toit.

A suposta situação dos brancos sul-africanos chamou a atenção do presidente norte-americano Donald Trump no mês passado. Depois de assistir a um programa sobre o assunto na Fox News, ele pediu ao secretário de Estado, Mike Pompeo, que estudasse o que chamou de “matança em grande escala” de fazendeiros brancos e a questão do governo sobre a desapropriação de terras.

O Kremlin, que mantém laços estreitos com o governo da África do Sul depois de anos de apoio na época da Guerra Fria ao partido do Congresso Nacional Africano (ANC), ainda não comentou oficialmente as propostas de redistribuição de terras.

Mas os sul-africanos brancos recebem tempo na televisão estatal. “A mídia global, o Twitter e outros mecanismos - e é claro aqueles com motivos especiais - espalharam uma visão distorcida da declaração formal de intenção do Congresso Nacional Africano em relação à expropriação”, disse Wandile Sihlobo, pesquisador chefe da Câmara de Negócios Agrícolas da África do Sul, falando sobre as propostas de redistribuição de terras.

“Mas também não temos uma comunicação clara dos formuladores de políticas”, acrescentou Sihlobo, “o que alimenta o medo e a desinformação”.

Ajuda

Não há dados oficiais sobre o número de sul-africanos que se mudaram para a Rússia ou estão considerando isso. Poluboyarenko, no entanto, é uma voz proeminente sobre o assunto. Ele ganhou atenção no início deste ano depois de ajudar uma família alemã de 11 pessoas, indignada com a educação sexual nas escolas ocidentais, a se estabelecer na Rússia.

Dirigindo-se aos du Toits em sua fazenda leiteira “Motherland”, em Kosyakovo, cerca de 100 quilômetros a Sudeste de Moscou, o diretor geral Mikhail Baranov disse ao pai e ao filho: “Vocês podem ter certeza de uma coisa. Vocês não encontrarão o liberalismo aqui, mas sim os valores da família.”

Tal sentimento poderia ter apelo para o grupo de sul-africanos brancos que se chamam de Boers, que significa “fazendeiro” em holandês. Eles são descendentes dos colonizadores holandeses que vieram para o sul da África no século 17 e têm uma identidade enraizada na Igreja Reformada Holandesa, na língua africâner e em uma história compartilhada de pioneirismo.

O ancião du Toit recorda sua primeira viagem à Rússia em 2006, quando visitou uma igreja em São Petersburgo. “Eu apenas olhei para todas as pessoas afins e chorei”, disse.

Para o agricultor sul-africano Adi Schlebusch, o renascimento religioso da Rússia sob Putin foi um fator decisivo na decisão de sua família de emigrar. “O retorno dos valores cristãos é uma grande motivação para nós”, disse Schlebusch.

Em outubro, Schlebusch, de 29 anos, sua esposa e os dois filhos pequenos planejam fazer as malas e se mudar para Moscou, onde ele vai ensinar inglês. Depois de voltar para casa de sua primeira visita à Rússia, em julho, o agricultor falou com outras famílias de sua província natal. Ele estima que cerca de 25 famílias estão pensando seriamente em se mudar para a Rússia.

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