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Produtor de Carambeí, que fornece para uma das unidades que teve exportações suspensas: mercado espera que países compradores continuem a cobrar explicações | Albari Rosa/Gazeta do Povo
Produtor de Carambeí, que fornece para uma das unidades que teve exportações suspensas: mercado espera que países compradores continuem a cobrar explicações| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

O mês de março parece ter entrado definitivamente no calendário da pecuária brasileira. Na última segunda-feira (5), a Polícia Federal (PF) prendeu Pedro de Andrade Faria, ex-presidente de uma gigante em crise: a BRF, maior processadora de alimentos do país e maior exportadora de frangos do planeta. O motivo: acobertar fraudes em relação à presença de salmonela nas aves produzidas pela companhia. Foi o ápice da Operação Trapaça, desdobramento da Carne Fraca que, coincidência ou não, foi deflagrada pela mesma PF em março do ano passado.

Entre erros e acertos, o fato é que as investigações em 2017 fizeram minguar um ano que prometia ser de recuperação para o setor de proteína animal, após a crise de abastecimento do milho na safra anterior. Levantamento do Agronegócio Gazeta do Povo, elaborado com base na diferença entre as expectativas do mercado e o que foi efetivamente exportado pelo Brasil, aponta que as perdas provocadas pela queda nos embarques chegam a US$ 2,74 bilhões.

Isto porque, quando a Carne Fraca explodiu pela primeira vez, mais de 40 países impuseram restrições ao produto brasileiro. Em alguns casos, como a União Europeia, as importações foram canceladas completamente, independentemente da empresa. Os europeus, aliás, podem servir de termômetro para medir a atual “febre” no mercado internacional. Eles foram os primeiros a cobrar esclarecimentos sobre o novo escândalo, seguidos por Hong Kong, o quinto mercado mais importante para o frango brasileiro. Desta vez, entretanto, o embargo ficou restrito a plantas da BRF.

Transporte de frangos para a unidade da BRF em CarambeíAlbari Rosa/Gazeta do Povo

“Acho que esse pedido de esclarecimento é padrão. Tudo que envolve questões sanitárias exige essa preocupação, algumas vezes é muito mais formal do que prático, por se tratar de contaminação, algo delicado”, avalia a consultora da Agrifatto, de São Paulo, Lygia Pimentel.

Em linha, o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, acredita que até mais pedidos do tipo devem chegar ao Ministério da Agricultura (Mapa) nos próximos dias. “O setor entende que os impactos desta etapa da operação devem se resumir às plantas suspensas pelo Mapa no processo investigativo”, afirma.

Como consequência direta da Operação Trapaça, além de ter fechado os cinco laboratórios que fraudavam amostras, o Mapa suspendeu as exportações dos três frigoríficos envolvidos - dois em Goiás e um no Paraná, em Carambeí - para os 12 destinos que restringem a presença de salmonela na carne, entre eles a União Europeia. Juntas, estima-se que as unidades possam abater 1 milhão de cabeças de frango por dia, algo em torno de 14% da capacidade total da BRF. “É difícil saber quanto tempo [durariam as suspensões], mas dá para tirar como base o ano passado, que levaram de 20 a 30 dias”, diz Lygia Pimentel.

Mercado em choque, mas nem tanto

O fato de o escândalo se concentrar em uma única companhia é um dos pontos que faz os analistas acreditarem que o baque não será tão grande quanto em 2017. Além disso, o mercado se apoia no fator “delay”: por mais que as fraudes da salmonela tenham sido divulgadas apenas nesta semana, boa parte da investigação foi feita em cima de materiais obtidos pela PF na primeira etapa da Carne Fraca.

“Desde então, a própria União Europeia, juntamente com Hong Kong e outros países realizaram missões de inspeção no sistema produtivo brasileiro, em um total de 13 missões oficiais, bem como incontáveis missões privadas”, salienta Turra. “Os países tendem a entender mais como uma consequência. As empresas estão provavelmente mais cuidadosas, a investigação segue prendendo gente”, complementa a consultora da Agrifatto.

Questão de imagem

Entretanto, ainda que a empresa seja uma só, a BRF é a companhia que mais exporta frango no mundo, respondendo por aproximadamente 40% dos embarques brasileiros, que foram de 3,94 milhões de toneladas (in natura).

E linha de produção já pisou no freio. “Acho que as coisas ficaram mais moderadas agora porque, no fundo, o governo agiu antes de acontecer, isso é notório”, pondera Sérgio De Zen, pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Universidade de São Paulo (USP). “É muito difícil saber a reação dos compradores. O que é uma pena é que isso sempre implica em quebra de confiança, e toda quebra tem um preço muito alto.”

Com consumo de frango no Brasil batendo praticamente no teto, o setor depende essencialmente das exportações para expandir. E se mercados começarem a se fechar daqui em diante, o produtor vai sentir o peso. “Isso implicaria em excesso de oferta interna, derrubando o preço do frango e de outras carnes”, explica De Zen. “Com certeza, vai ter um choque. É difícil dizer como vai ser. O momento é de esperar.”

“Dentro do quadro fiscal, a empresa tem apresentado dificuldade e a operação veio em péssima hora. Mas como é um desdobramento, acho que as pessoas estão até um pouco menos atentas do que no ano passado, uma repetição do assunto. Acho que em longo prazo a empresa consegue superar essa crise”, completa Lygia Pimentel.

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