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André Pugliesi
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Ao enterrar o Atlético, Petraglia mostrou que é mesmo homem do seu tempo

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André Pugliesi
12/12/2018 15:01 - Atualizado: 29/09/2023 23:39
Albari Rosa/Gazeta do Povo
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Ao enterrar o Atlético, para uma refundação, na véspera do jogo mais importante do clube nos últimos 17 anos, Mario Celso Petraglia deu mais uma amostra, definitiva, de que é um homem do seu tempo. Alguém que está, para utilizar um termo afetado, conectado ao zeitgeist. Um cartola que sabe, talvez como nenhum outro, e agora emprego expressão bastante antiquada, “surfar na onda do momento”.

A repaginação do Rubro-Negro, ou melhor, o “rebranding”, veio apoiado no que há de mais moderno. Revisionismo histórico primário, carnaval publicitário tosco e autoritarismo travestido de democracia. É um resumo do que se viu na apresentação realizada na Arena da Baixada, na terça-feira (11), à noite.

Não é nenhuma novidade o quanto Petraglia renega o passado e as tradições do ex-Clube Atlético Paranaense. Entretanto, até então, o desprezo do dirigente servia apenas para aborrecer os atleticanos em entrevistas.  Agora não, entrou em ação, é matéria, produto, serviu de impulso para virar de ponta cabeça a identidade de uma agremiação quase centenária.

Para tanto, claro, Petraglia fez questão de reforçar sua revisão, fortemente singular e carregada de preconceitos pessoais, do que se passou nos 70 anos do Atlético antes de 1995, quando tomou o poder. Basicamente, era o nada: um clube de estádio modesto de tijolinhos, uniformes surrados, caloteiro e plagiador. “Temos que reconhecer que Atlético é o mineiro”, vaticinou Petraglia, na terça.

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Sim, em alguma medida faz sentido. Mas há, ainda, outras leituras possíveis sobre o que se viu na Rua Buenos Aires. Apesar das dificuldades, imensas, foi o Rubro-Negro das primeiras arquibancadas de concreto do Paraná, de Caju, a Majestade do Arco, do Furacão de Jackson e Cireno, de Jofre Cabral e Silva, Sicupira, Assis e Washington, Carlinhos Sabiá, do Caldeirão do Diabo, dos Fanáticos.

E mais, muito mais, incluindo, evidentemente, todos os feitos dos quais Petraglia participou ativamente. A abertura da Arena da Baixada, em 1999, as participações na Libertadores, o título brasileiro de 2001 com Alex Mineiro, do campeão mundial com a seleção brasileira Kléberson, e da reconstrução do Joaquim Américo para a Copa na tumultuada parceria com a prefeitura de Curitiba e o governo do Paraná.

Nada disso, no entanto, comoveu o cartolão. Diante do sentimento de milhões, triunfou a febre de um só. Confesso que jamais percebi o menor melindre dos atleticanos com relação ao nome do clube, ou como é chamado, nem sobre o escudo ou camisa. Ao contrário, a sensação que sempre tive é de que são apaixonados pelo Atlético, o símbolo CAP e a jaqueta listrada.

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Já era. O Atlético agora é Athletico, e não será surpresa se passar a ser grafado como Athletico-PR — a letra H não ajuda, só atrapalha, e os nomes realmente diferentes, Furacão e Paranaense, murcharam. O símbolo CAP tomou o mesmo rumo da versão de concreto da velha Baixada: a caçamba de detritos (foi salvo pela organizada). E a camisa listrada será aposentada contra o Junior.

Claro que para entregar o pacotão de mudanças foi fundamental contratar e armar o circo publicitário, erigido, especula-se, em milhões de reais. E depois de dois vídeos desastrados, o primeiro de contornos e narração épica e cenas do exterior de algum banco de imagens sobre um furacão, o outro uma provocação meio non sense com os maiores clubes do país, veio o big announcement. Imagem é tudo.

Mega evento transmitido via web em que a empresa contratada pôde revelar seus métodos, avançados, para reformular a marca, ou melhor, “brand” do Atlético. Visita ao CT do Caju, ida a um jogo do clube, entrevistas via formulário com sócios, contato com jornalistas esportivos, entre outras técnicas e estratagemas do setor. A torcida, de uma forma ampla, não foi consultada.

Por fim, a mudança de identidade, ao mesmo tempo em que refundou o Atlético, serviu para aposentar o Conselho Deliberativo do clube. Às pressas e sob o discurso de “voto de confiança”, e contra o princípio básico da existência do órgão, de deliberação, os “conselheiros” aprovaram, sem ao menos ver, todo o processo de transformação radical.

Evidentemente que não se esperava qualquer aceno de independência, no caso de uma apresentação, considerando o histórico e, até porque, trata-se de um conselho formado integralmente pelo grupo vencedor das eleições. Agora, o suicídio da opinião, foi, sem dúvida alguma, outro momento ímpar e exemplo rematado do que se pode classificar como autoritarismo disfarçado de democracia.

Foi uma noite histórica para o Atlético que, oficialmente, tem mais meio dia de existência (a depender de quando você ler, talvez já tenha “descansado”). Descaracterizado, será Athletico. A despedida, ao menos, pode ser triunfal, com a taça da Sul-Americana. Chance de eventual conquista que alçou o clube, outra vez, a um patamar de destaque nacional e, até, internacional. Só pelo que faz no campo. Não fora dele.

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