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Fotos: Hedeson Alves/Gazeta do Povo
Detalhe da Sociedade barracão, na Rua José Maurício Higgins: incêndio, desabamento e rejeição da vizinhança

Hoje (17 de setembro), a matéria das páginas 4 e 5 da editoria Vida e Cidadania, da Gazeta do Povo, mostra os bastidores da Sociedade Barracão – a favela de 150 moradores que diz “não” à Cohab. É um assunto e tanto: grupo sem-teto não quer morar longe, tem noção do que reza o Estatuto da Cidade e resiste ao preço que vai lhes custar a lonjura. O pior saldo é não ter papel para catar, comprometendo a própria sobrevivência.

Da primeira vez que estive na esquina da Rua O Brasil para Cristo com a José Maurício Higgins, no Boqueirão, onde fica a comunidade, tive um choque – acreditem – estético e não propriamente político. Foi há quatro anos. Instalada numa fábrica abandonada, a favela tinha um visual único: casinhas empilhadas, num espaço mínimo, pois era preciso lugar para os 5 mil quilos diários de recicláveis ali guardados e separados pelos carrinheiros..

O pessoal tinha de ser criativo para manter 32 residências – número da época – em pé.
Havia lixo espalhado, claro, e uma situação deplorável para a infância, ali em número assustador: representava quase 50% do grupo. Mas os dilemas da Sociedade Barracão, à época, estava sendo resolvidos com a presença dos ongueiros do Cefúria e com a assessoria jurídica da Terra de Direitos, na pessoa do advogado e ativista Vinícius Gessolo, cuja contribuição à luta pela habitação não pode ser esquecida.

O que mais me chamou atenção, na primeira viagem, foi a casa do carrinheiro Ivan Vaz, dotada de sistema de refrigeração feito com hélices de ventiladores encontrados no lixo. E de calefação, com a ajuda de um fogão a lenha, estrategicamente colocado no meio do barraco. Outro inventor do pedaço era Clóvis Rarafigo, que havia projetado uma moto-carrinho, facilitando suas andanças pela região, sempre em companhia da mulher, que seguia a pé, na parte detrás. Onde anda Rarafigo?

Hoje, nem Ivan nem Clóvis moram mais na Sociedade Barracão e os bons tempos de penúria inventiva parecem ter ficado no passado. “Até a ideia da cooperativa foi abandonada”, diz Eledir Rodrigues, 45, uma das líderes. Uma das – outra perda do grupo foi a unidade, o que poderia ser garantia de sua permanência naquelas bandas do Boqueirão, formando ali a célula de uma comunidade inserida de fato.

Hoje, poucos acreditam que a resistência aos apelos da Cohab – que propõe levar a turma do Barracão para o Ganchinho – vá mudar o destino da comunidade. Resta a esperança de que em novo território, os ex-cooperados do lixo encontrem condições de sobreviver. Eles sabem disso – daí colocarem em sua lista de condições para se mudar a construção de um barracão de lixo no novo bairro. Eles querem um Eco Cidadão, programa da prefeitura já presente em dez bairros. A torcida é para que consigam.

Não vou
A reportagem publicada hoje não contém a conversa que tive dentro do ônibus, rumo ao Ganchinho, com a turma da Sociedade Barracão. O povo de lá é bom de briga:
Da Luz Aparecida Silva Dias, 45 anos, é uma moradora típica da Sociedade Barracão: tem crianças sob seus cuidados, fregueses fixos na região do Uberaba/Boqueirão e não se imagina morando nas lonjuras do Ganchinho onde, aposta, sua vida de carrinheira estará acabada. O que enxerga por trás disso dá para se imaginar. Edna de Campos, 34, imagina sem parar. “Onde vou deixar cinco filhos quando sair para catar papel? Aqui tenho creche”.

A líder Eledir Rodrigues, na Barracão desde o início, também recorre aos pequenos. “Só este ano nasceram duas crianças na sociedade. Como é que fica”, pergunta, sobre a parcela mais suscetível da população local: ao todo seriam 62 crianças sem-teto. Parece contradição: as condições da esquina são péssimas para todas as faixas etárias, quanto mais para a gurizada. Mas não é o que pensam os moradores.

A turma do “não” acha que as casas são boas e que o Parque Iguaçu 3 é um aperto. “Preferimos pagar aluguel”, repete Eledir. O casal Josuel, 30, e Arlem dos Santos Veloso, 37, assina embaixo. “Aqui é bom para tudo. Tem médico. Tem material para reciclar”. “Lá, o Ganchinho, é bom para a prefeitura fazer um cemitério, não para levar a gente. Vamos resistir”, diz Josmar Narciso, 28, em parceria com a mulher Camila da Silva.

Agora é acompanhar o desfecho da história.

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