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Mil dias pelas Américas: aventura na Ilha do Diabo
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Fotos: Arquivo pessoal
Réplica de Ariane 5 no Centro Espacial Francês em Korou, Guiana Francesa.

Por: Ana Biselli e Rodrigo Junqueira

Apenas em meados do século 20 que a Guiana foi designada um departamento francês, quando se tornou o Centro Espacial Europeu. Assim, vários engenheiros, técnicos e cientistas de todas as partes começaram a povoar Korou, que hoje abriga em torno de 20 mil pessoas e é a cidade que mais cresce naquele país. O centro de lançamento é considerado um dos mais bem localizados no mundo, dentre os 16 existentes. Responsável por colocar em órbita mais de 50% dos satélites comerciais nos últimos 20 anos, o Projeto Ariane está comemorando o 200.° lançamento. Ariane é um foguete lançador descartável construído pela empreiteira EADS Space Transportation sob a supervisão da Agência Espacial Européia. Vale a pena a visita ao Centro Espacial, em Korou, um ótimo programa para um dia chuvoso de viagem.


Cela de Colônia Penal das Îles du Salut, Guiana Francesa.

A cidade em si não possui muitos atrativos, sua arquitetura colonial francesa e a ausência de edifícios maiores – de no máximo três andares – fazem com que pareça uma maquete. Embora bem organizada, é também uma das mais pobres do país. Localizada há 60 km da capital, Cayenne, fica às margens do Rio Kourou, de onde partem os barcos para a Îles du Salut. Em meados do século 18, logo após ter perdido o território canadense para os ingleses, o primeiro-ministro da França organizou uma expedição para colonizar a Guiana Francesa. Na sua visão, se os ingleses iam dominar a América do Norte, então a América do Sul seria francesa! Para isso, eles precisavam ter uma base sólida na América do Sul. A expedição Kourou trouxe para a Guiana Francesa em torno de 13 mil pessoas, a maioria homens, porém metade morreu logo nos primeiros meses, vítimas de febre amarela e malária. A expedição foi um fracasso. Os poucos mais de 200 homens que restaram ficaram nas Îles du Salut, ou Ilhas da Salvação, pois assim se distanciavam dos mosquitos e doenças que encontraram no continente.

As Ilhas da Salvação são também conhecidas como Ilhas do Triângulo, por serem três a formarem o arquipélago: Île Royale, Île St. Joseph e Île du Diable. Quase um século depois, a França voltou aos planos de ocupação da região, mas agora a utilizando como Colônia Penal. Foram mais de 20 mil presos trazidos da Europa para cá a partir de 1854, quando foi assinada a lei do transporte de presos, dividindo-os entre os presos comuns, presos políticos e os inimigos do Rei Napoleão III. Alguns presos ilustres passaram pelas Îles du Salut, dentre eles Papillon e Alfred Dreyfus, hoje considerado o símbolo da luta contra o anti-semitismo na França. As prisões foram fechadas ainda em meados do século 20, depois de um exaustivo trabalho feito pelo jornalista Albert Londres, de denuncia das condições subumanas a que eram submetidos os presos franceses.


Ilha do Diabo, onde ficaram presos Papillon e Dreyfus. Îles du Salut, na Guiana Francesa.

Hoje as dependências da Île Royale, antes celas do presídio, são ruínas abertas à visitação. A casa do diretor virou um museu que nos conta em detalhes a sua história e outras instalações foram adaptadas para serem usadas como restaurante e albergue. Quem busca conhecer a história da Guiana irá adorar e quem prefere a beleza natural irá se surpreender e ficar encantado com a flora e a fauna do lugar.


No porto das Îles du Salut, Guiana Francesa.

Seguimos viagem para uma região habitada pelos ameríndios da tribo Kalina. Awala-Yalimopo é famosa por ser um dos mais importantes berçários para tartarugas marinhas na costa da América. Os costumes da tribo ainda são mantidos na região, a maioria dos moradores vive em cabanas indígenas feitas de palha, dormem em redes, mantém suas tradições gastronômicas e festivas. Os turistas entram no clima, dormindo em redes, sob uma cabana ameríndia, algumas com banheiros privativos. Awala-Yalimopo chega a receber mais de 13 mil visitas ao ano de kawanas (tartarugas na língua kalina) das mais diversas espécies, a tartaruga de couro, a verde, oliva e outras, que chegam a pesar mais de 700 quilos e ter 2 metros de comprimento. O melhor período para ver este espetáculo é de setembro a abril, quando a praia fica repleta de tartarugas cavando seus ninhos. Ainda assim, durante o ano todo, ainda podem ser vistas algumas desovas. As tartarugas são notívagas, então a principal atração aqui é uma caminhada noturna pela praia.


Praia de Awala-Yalimopo na fronteira da Guiana Francesa com Suriname.

A estrada de Yalimopo para Saint Laurent du Maroni é mais movimentada. Chegamos lá com chuva e novamente encontramos aquele clima de cidade fronteiriça e portuária, muita pobreza, lixo nas ruas e pessoas zanzando de um lado para o outro em águas internacionais. Seguimos para um lugar que iria nos apresentar mais algumas décadas de tristezas e histórias gravadas em suas paredes. St Laurent du Maroni começou a ser construída nos idos de 1860 e foi a maior colônia penal da Guiana Francesa. A colônia ficou tão absurdamente populosa que, tempos mais tarde, se tornou uma cidade, com direito a uma prefeitura especial.


Nossa cabana particular no estilo ameríndio na praia de Awala-Yalimopo, Guiana Francesa.

No dia seguinte, cruzarmos a nossa segunda fronteira, agora em direção ao Suriname. No porto de St Laurent du Maroni, já nos desenha a pluralidade cultural do novo país. Ouvimos pelo menos seis línguas, é assim a vida nesta fronteira, francês, creole, holandês, sranan tongo, inglês, português, afinal como diria o sábio Chacrinha, quem não se comunica se trumbica! Após duas horas de burocracias e espera na fronteira em Albina, finalmente conseguimos entrar naquele país!


Feira livre no mercado central de St Laurent du Maroni, na Guiana Francesa.

Albina ficou conhecida no Brasil pelo incidente ocorrido no natal de 2009 entre garimpeiros surinameses e brasileiros, onde várias mulheres foram estupradas e alguns garimpeiros brasileiros mortos. Cento e cinquenta quilômetros e três horas depois, cruzamos a imensa ponte sobre o Rio Suriname e adentramos à caótica Paramaribo. Carros indo e vindo de todos os lados, detalhe: aqui a mão é inglesa!


Catedral em estilo colonial holandês, em Paramaribo, Suriname.

Paramaribo, também conhecida como Parbo, é uma cidade em estilo colonial, construída no início do século 17 pelos ingleses e reconstruída pelos holandeses um século depois, após mais de 400 casas no centro da cidade serem destruídas por um incêndio. Às margens do Rio Suriname, é a maior cidade com mais de 250 mil habitantes e inclusive um bairro majoritariamente brasileiro. O idioma oficial é o holandês, mas o sranam tongo é o mais falado nas ruas, uma mistura de inglês, português, holandês e dialetos africanos. A cidade é orgulhosa de sua mesquita e sinagoga que convivem pacificamente lado a lado. A catedral em estilo holandês também é uma atração, toda construída em madeira. A estação seca no Suriname não poderia estar mais molhada, logo descobriremos as belezas naturais que o nosso vizinho holandês tem a nos oferecer.


Mesquita e sinagoga convivem pacificamente lado a lado em Paramaribo, Suriname.

Próxima Semana
Vamos explorar o interior do Suriname, no Parque Nacional de Brownsberg, reserva natural no meio da floresta amazônica surinamesa. Paramaribo será também a base para a nossa segunda investida ao Caribe. Voaremos para as ilhas de Trinidad e Tobago em busca de sol, sombra e água fresca.

Acompanhe a viagem de Ana Biselli e Rodrigo Junqueira semanalmente em nosso blog. Também acesse o site dos aventureiros: www.mildias.com.

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