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A terrível e iminente invasão comuno-hippie-LGBT
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Dia desses Curitiba apareceu no noticiário nacional sem ser pela Lava Jato – e o governador também não tinha mandado bater em ninguém com cassetetes. Dessa vez, a cidade ganhou visibilidade graças a uma trapalhada da bancada evangélica de Curitiba.

Os vereadores criaram toda uma comoção para impedir um “Dia da Diversidade” numa pré-escola. Os pais foram instruídos a mandar as crianças de roupas coloridas – e a bancada imaginou, nas palavras de Gregório Duvivier, que se tratava de uma “paradinha gay”. Estava criado o pré-escola sem partido.

O que ficou engraçado é que na verdade a escolinha estava apenas usando personagens da Turma da Mônica para ensinar o amor ao próximo, independente de cor ou credo. Imagina-se que os vereadores não tenham nada contra isso (mas vá saber…).

A patetada foi apenas o último sintoma de uma certa histeria que vem tomando conta do debate nacional sobre educação. Há todo um movimento para convencer você de que seus filhos correm perigo na escola. Perigo, deixe-se claro, de serem pervertidos pelos professores.

Aparentemente, haveria uma conspiração comuno-hippie-LGBT de inspiração gramsciana destinada a criar pequenos Che Guevaras do século 21 que não apenas tentariam derrubar a burguesia do poder como também trabalhariam para transformar o Brasil numa orgia em que ninguém é de ninguém.

Há método nesta loucura. Todo político que deseja se eleger com uma plataforma ideológica precisa convencer seu eleitor de que ele corre perigo. Para emplacar uma plataforma ambientalista é preciso lembrar que o planeta está superaquecendo. Para ganhar o voto do operariado não custa reforçar o quanto os empresários podem ser perversos. Para convencer alguém a votar num liberal o melhor caminho é dizer que todo Estado tende ao stalinismo. E assim por diante…

Os evangélicos crescem nos parlamentos de todo o Brasil – e em grande parte porque conseguiram criar um vilão que justifique sua necessidade. Esse vilão é o esquerdista-que-deseja-acabar-com-a-tradicional-família-brasileira. E sobre seu cadáver deverá erguer-se a república cristã brasileira.

Talvez a luta mais reveladora sobre o tema nos últimos anos tenha sido na discussão dos planos de educação. Os religiosos pelejaram com unhas e dentes para evitar que se incluísse qualquer tema relacionado a “gênero” na pauta das escolas. Inventaram uma tal “ideologia de gênero” que era mais fatal do que vento encanado, mortífera como um gole de leite com manga.

Aparentemente, os adeptos de tal ideologia querem convencer meninos e meninas (quanto mais cedo melhor) de que é preciso sublimar a biologia e viver um mundo abstrato em que toda forma sexualidade deve ser não apenas vivida, mas adorada como um bezerro de ouro.

Pode ser que haja alguém pensando assim. Tem até quem pense que a terra é plana e que o nazismo era um tipo de marxismo. Certamente, porém, a epidemia de professores doidões obcecados por sexualidade, Gramsci e feminismo é um exagero.

O que de fato se quer quando se fala em discutir gênero nas escolas é ensinar que algumas pessoas são homossexuais. Que este é um fato da vida e que permanecerá sendo, não importa se você goste ou não. Que é preciso respeitar as mulheres, os gays, os transexuais e que violentar essas pessoas é tão errado quanto violentar os direitos de um homem branco heterossexual.

Parece muito?

Não acho que isso seja capaz de desestabilizar uma sociedade. Mas sem um vilão qual é o herói possível?

James Baldwin, uma das principais vozes da cultura negra americana dizia que o “problema do negro” nos Estados Unidos era na verdade muito mais do que um problema das pessoas de pele escura. Era um problema do país. E um problema dos brancos.

Não se tratava de saber quando os brancos iriam “aceitar” os negros. E sim de saber por que é que na cabeça de algumas pessoas (dos brancos, ou pelo menos da maioria deles) as pessoas precisavam ser divididas em brancos e negros. Porque essa não parece ser uma necessidade inescapável.

No dia em que os brancos começassem a se aceitar, a se ver como pessoas que podem conviver com as outras sem precisar criar uma identidade forjando um outro, aí sim o problema poderia ser resolvido.

Você não precisa negar que há brancos e negros. É um fato da vida, e permanecerá sendo. Você também não precisa negar que há gays, ou outras formas de sexualidade. Mas um mundo em que isso não fosse um critério de classificação entre “nós” e “eles” certamente seria melhor.

Mas para isso seria preciso primeiro que não tivéssemos tanto medo uns dos outros. Que não víssemos na sexualidade alheia uma forma de agressão ao nosso modelo de vida. Que entendêssemos que há vários caminhos possíveis para a felicidade e que, não havendo dano a terceiros, cada um deveria poder tentar seguir seu plano sem que isso nos tirasse o sono.

Meus filhos crescerão sabendo que os outros são dignos de seu amor independente de cor, de credo, de origem, e também de orientação sexual. E aprenderão a duvidar de toda teoria conspiratória que transforma os outros em vilões. Porque normalmente os vilões são justamente os responsáveis pela demonização alheia.

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