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Arnaldo Alves/Arquivo Gazeta do Povo
Arnaldo Alves/Arquivo Gazeta do Povo| Foto:

Edital estabelece o dia 17 de agosto para o leilão do Hospital Evangélico e da Faculdade Evangélica

Duas instituições tradicionais nas áreas de saúde e do ensino de medicina do Paraná estão bem próximas de iniciar um novo capítulo de sua história. Após três anos de intervenção e muitas idas e vindas, a justiça publicou o edital em que prevê a data de 17 de agosto para o leilão do Hospital Evangélico e da Faculdade Evangélica, ambas acometidas pelo mal das dívidas incontroláveis.

O edital, assinado em 15 de junho pelo juiz Eduardo Milleo Bacarat, da 9ª Vara do Trabalho de Curitiba, estabelece preço mínimo de R$ 205.994.575,67 para o leilão em lance único. No documento, o magistrado considera “a imperativa necessidade de atender ao interesse público na busca da solução mais justa e útil à sociedade”.

Para o estabelecimento de valores, Bacarat considerou bens materiais (imóveis e móveis, inclusive biblioteca) e imateriais (marcas e cursos), além de laudo econômico elaborado pela Caixa Econômica Federal.  Para o hospital foi estipulado o valor de R$ 141,2 milhões, incluindo os bens móveis. O valor da faculdade ficou em R$ 63,6 milhões. A totalidade dos recursos do leilão será destinada para o pagamento dívidas.

Os bens de maior valor do hospital, avaliados em R$ 81 milhões, são o terreno e o edifício, situados entre as ruas Augusto Stellfeld e Desembargador Otávio do Amaral, no bairro Bigorrilho. Outro terreno, anexo ao do hospital, foi avaliado em R$ 6 milhões. Há ainda um terreno no Balneário Canoas, em Pontal do Paraná, e três no bairro Santa Felicidade (Curitiba), com preço estimado em R$ 1,1 milhão.

O valor estipulado para “marcas, patentes e cursos de graduação e pós-graduação” da Faculdade Evangélica foi de R$ 15 milhões. A faculdade tem um curso de graduação em Medicina e 28 cursos de pós-graduação. Os bens imóveis da faculdade (edifício e um terreno situados na Rua Padre Anchieta, em Curitiba) tiveram valor estabelecido de R$ 19,2 milhões. Outro terreno, na mesma localidade, foi avaliado em R$ 16,88 milhões.

Foto: Divulgação/Hospital Evangélico

Doença crônica

O leilão traz a expectativa de solução para a doença crônica que abateu o hospital. Ameaçado de fechamento por várias vezes nos últimos anos e em estado falimentar, a instituição criada em 1945 com a fundação da Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba acumula uma montanha de dívidas que chega aos R$ 400 milhões.

A maior parte dessa gigantesca dívida apareceu publicamente depois da intervenção judicial. Uma auditoria independente contratada pelos interventores constatou uma série pendências que não constavam nos balanços anteriores. A partir daí, conforme determina a lei, a instituição passou a fazer os chamados ajustes de exercícios anteriores, isto é, passou a reconhecer dívidas anteriores. Os efeitos dos ajustes podem ser observados nos balanços publicados no período. O passivo não circulante, por exemplo, que é composto por dívidas com vencimento após o final do exercício contábil (de longo prazo), saltou de R$ 171 milhões em 2014 para R$ 344 milhões em 2017.

Além do reconhecimento das pendências anteriores, nos últimos três anos os interventores cortaram despesas e negociaram dívidas vencidas e a vencer para poder manter o hospital funcionando. Com a redução de custos operacionais, readequação de dívidas relacionadas a instituições financeiras e a utilização de precatório do governo federal para pagamentos acordos e ações trabalhistas, a instituição saiu de prejuízo na operação anual de R$ 140 milhões em 2015 para lucro de R$ 25,9 milhões em 2017. O passivo circulante – composto de obrigações de prazo mais curto, teve significativa redução. Passou de R$ 170 milhões em 2014 para R$ 112 milhões no ano passado.

A melhora nos resultados é uma das apostas da equipe de administradores do hospital e da faculdade para atrair investidores ao leilão do próximo mês. Com a faculdade em situação controlada e com perspectiva de lucro e o hospital próximo de um equilíbrio, cresceu o otimismo. Pode significar a saída da instituição da UTI e o início de uma recuperação para, a médio prazo, receber alta.

O leilão

Os interessados em participar do leilão devem depositar caução de R$ 5 milhões à Justiça. A entrega dos envelopes poderá ser feita até 17 de agosto, na 9ª Vara do Trabalho de Curitiba, que fica na avenida Vicente Machado, 400, 5º piso. O horário de atendimento é das 13h às 17h. O leilão será realizado às 10h de 17 de agosto, no auditório anexo ao mesmo fórum designado para a entrega dos envelopes.

O arrematante poderá optar em pagar à vista ou em 60 parcelas, que serão reajustadas. Se optar pelo pagamento parcelado, o arrematante deverá pagar o sinal no valor equivalente a 20% do valor da arrematação no prazo máximo de 02 (dois) dias úteis, contado da data do leilão.

Estrutura

Além dos prédios, terrenos e equipamentos, o hospital e a faculdade dispõe de uma ampla infraestrutura:

 Hospital Evangélico

– 439 leitos, distribuídos em 9 andares (383 leitos para pacientes do SUS e 56 para convênios e particulares)

– 39 leitos de UTI Adulto

– 25 leitos de UTI Neonatal

–  Unidades de internação clínica, cirúrgica e pediátrica

– 3 centros cirúrgicos: geral, obstétrico e de queimados

– 16 salas cirúrgicas

– UTI adulto I e II

– UTI coronariana

– UTI neonatal

– Maternidade com 40 leitos

– Pronto socorro adulto, pediátrico, clinico e cirúrgico

– Banco de leite humano

– Banco de pele humana

– Serviços de apoio diagnóstico e terapia

– Centro de oncologia e quimioterapia

– Ambulatório para consultas eletivas

Faculdade Evangélica

– Curso de graduação em Medicina, com 120 vagas (60 vagas no primeiro semestre e 60 no segundo)

– 28 cursos de especializações médicas

– Programa de doutorado e mestrado em princípios da cirurgia (194 títulos de mestrado e 43 de doutorado até 2017)

– Instituto de Pesquisas Médicas – IPEM, destinado à pesquisa clínica e experimental em animais de pequeno e médio portes.

– 2 centros cirúrgicos para pequenos animais

– Laboratório para marcação tumoral

– Laboratório de imunoistoquímica

– 2 biotérios

Cerimônia de fundação do Hospital Evangélico, no Bigorrilho, em 1945. Foto: Arquivo do hospital

Uma história de mais de 70 anos

A história da Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba, mantenedora do Hospital Evangélico e da Faculdade Evangélica, está intimamente ligada à história de Curitiba. Fundada por iniciativa do médico e pastor da Igreja Presbiteriana Parísio Cidade em 1945, quando a capital tinha pouco mais de 150 mil habitantes – grande parte deles vivendo em áreas rurais, distritos e colônias – a sociedade contou com recursos de diversas igrejas e também de moradores da cidade para comprar o terreno no Bigorrilho e construir o hospital.

A inauguração foi em 5 de setembro de 1959. Um grande acontecimento para toda a cidade. O destino fez com que o primeiro paciente fosse o prefeito Iberê de Matos, que sofreu um pequeno acidente na mão quando participava do ato inaugural.

Dez anos depois, em 1969, tiveram início as aulas do curso de medicina na Faculdade Evangélica, que funcionava anexa ao Hospital.

“O resultado positivo (da intervenção) é que mantivemos o hospital funcionamento, atendendo a população, renegociamos dívidas do FGTS por meio de parcelamento. Hoje estamos pagando o FGTS do mês em dia e também a parcela do atrasado. Conseguimos colocar os salários em dia, pagando até o quinto dia útil do mês; isso não ocorria há mais de 10 anos.”

Marcos Antonio Brenny, diretor-geral da Faculdade Evangélica e diretor financeiro do Hospital Evangélico.

 ENTREVISTA

O administrador hospitalar Marcos Antonio Brenny entrou para o time de interventores do Hospital Evangélico e da Faculdade Evangélica em 4 de novembro de 2015. Antes dessa data as duas instituições já estavam sob intervenção judicial, desde 16 de dezembro de 2014. Hoje responsável pelas finanças do hospital e a direção geral da faculdade, Brenny faz um balanço positivo dos três a nos de trabalho da equipe. Na entrevista a seguir, o diretor relata a situação em que estava o hospital quando ele assumiu e fornece detalhes do trabalho que foi feito para manter o atendimento ao público e pagar os salários dos funcionários. “Havia problemas de todos os tipos. Se não tivesse ocorrido a intervenção, o hospital teria sido fechado ainda em 2014”, diz. Veja trechos da entrevista:

Por que o hospital chegou a essa situação, de ter que ir a leilão?

O hospital vinha de longa data sofrendo efeitos de tabelas defasadas, medidas de gestão não adequadas, que culminaram com atrasos sistemáticos de pagamentos de direitos trabalhistas, como salários, férias, 13º, FGTS e INSS. Havia dívidas homéricas com fornecedores. Em 2013, o Ministério Público entrou com uma ação civil pública, pedindo a intervenção no hospital e na faculdade, que não apresentavam condições de honrar seus compromissos. A intervenção passou a vigorar a partir de 16 de dezembro de 2014.

Qual é o resultado da intervenção?

O resultado positivo é que mantivemos o hospital funcionamento, atendendo a população, renegociamos dívidas do FGTS por meio de parcelamento. Hoje estamos pagando o FGTS do mês em dia e também a parcela do atrasado. Conseguimos colocar os salários em dia, pagando até o quinto dia útil do mês; isso não ocorria há mais de 10 anos. Hoje os cerca de 1.400 empregados recebem seus salários até o quinto dia útil do mês, o INSS está em dia, as férias estão sendo pagas conforme a lei. No passado, quem passou pela gestão, se tivesse aderido ao Programa Pró-SUS, poderia ter obtido benefícios fiscais, que é um programa de remissão de dívidas. Com um esforço descomunal conseguimos a adesão ao programa Pró-SUS, que dá direito a benefícios fiscais, e isso estamos pagando os impostos regularmente. Hoje temos todas as certidões, tanto, federal, estadual como municipal. Com apoio do MPT e do juízo da intervenção, pagamos cerca de R$ 90 milhões em dívidas trabalhistas por meio do recebimento de precatórios do passado. Conseguimos ter um controle maior sobre a operação do hospital, cumprindo metas, inclusive as metas estabelecidas com a Prefeitura de Curitiba.

E em termos financeiros?

Se formos falar de resultados financeiros, no primeiro ano, em 2015, tínhamos um prejuízo bruto de R$ 140 milhões. Em 2016, o furo ficou em R$ 56 milhões. Em 2017, houve reversão e obtivemos R$ 26 milhões de lucro.

Por que então a crise?

Porque em contabilidade, resultado de balanço é diferente da situação financeira da instituição, que tem dívidas passadas acumuladas.

A dívida hoje é menor do que antes da intervenção?

Ao assumir o hospital em 2015 colocamos uma auditoria para avaliar tudo que existia dentro do hospital. A conclusão foi que muitos provisionamentos que deveriam ter sido feitos para pagamentos de dívidas não haviam sido feitos. Então, quem olhava para o balanço via um hospital sem dívida, o que não era a realidade. Em 2016, começamos a identificar, como manda a lei, uma série de situação que, contabilmente, se chama ajuste de exercícios anteriores. Isso significa reconhecer dívidas anteriores, que não constavam nos balanços. A lei manda reconhecer essas dívidas, nós tínhamos de reconhecer. Se compararmos, então, o valor da dívida após o reconhecimento das dívidas anteriores, vai-se verificar que vem caindo. Isso é fato, a dívida vem caindo após a intervenção.

O valor mínimo estabelecido para o leilão é suficiente para pagar todas as dívidas do hospital?

O valor atribuído na avaliação de bens e direitos do hospital e da faculdade é superior ao das dívidas trabalhistas, mas não existem somente dívidas trabalhistas. Há dívidas com fornecedores, com tributos, com FGTS e outras dívidas. Esse valor mínimo não cobre todas as dívidas do hospital. Se falarmos nas maiores cifras, temos cerca de R$ 75 milhões em dívidas trabalhistas, cerca de R$ 38 milhões com FGTS, e mais de R$ 75 milhões com fornecedores.

Qual o cenário que o senhor vê para o futuro do hospital?

Vejo um cenário extremamente muito positivo. Quando a gente olha hoje a situação do hospital, vemos que ela nos permite respirar. A operação hoje está praticamente em equilíbrio (receitas e despesas correntes), quando falamos em resultado primários, está caminhando para o equilíbrio. A virada em termos de receita e despesas que a gente previa, quando fizemos a adesão ao Pró-SUS, era 2018. Hoje eu diria que, ao retirar a dívida bancária e as demais dívidas, por ser uma aquisição originária, livre de ônus, a operação ficará equilibrada. E qualquer que seja o comprador, vai querer fazer investimento, oferecer mais serviços e, com isso, aumentar receita.

A faculdade também tem problemas financeiros?

É importante ressaltar que a faculdade depende do hospital e vice-versa. É uma faculdade com conceito 4 no MEC, faltando muito pouco para ter o conceito máximo, com convênios internacionais – inclusive com Harvard –, respeitabilidade no mercado, boas instalações e de tradição no Paraná. Só para ter uma ideia, em janeiro nós formamos uma turma de Medicina com 49 alunos. Desses, 10 deles tinham pai ou mãe médicos. Isso significa que os país, médicos, confiam na faculdade. Somos a única instituição privada no Brasil autorizada pelo MEC para ter mestrado e doutorado em prática cirúrgica.

Haverá interessados no negócio?

Eu acredito que haverá interessados. Acredito porque a operação do hospital caminha para o equilíbrio e a situação da faculdade está equacionada. O preço está convidativo e ainda permite parcelar em 60 vezes. O edital também permite a constituição de consórcio, o que permite grupos interessados se unirem. O hospital atende mais de 50% de urgência e emergência da grande Curitiba.

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