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10 coisas que mais odeio na escola – PARTE III
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Nos últimos dois meses compartilhei algumas questões que mais odeio na escola e o que eu faria pra mudar. Nos primeiros artigos falei sobre: 1 – padronização e massificação de alunos, 2 – lição de casa em excesso, 3 – a madrugada, 4 – Professor que se acha (autoritário), 5 – Recreio de 20 min, 6 – Aulas fragmentadas e chatas. Todas fazem parte de minhas reflexões, pesquisas e palestras sobre educação, criatividade, filhos e a escola nos tempos atuais. Hoje no artigo final compartilho mais quatro coisas que odeio na escola. E o que eu faria?

 

7 – Conteúdo, conteúdo, conteúdo

Ouvi esses tempos de um pai numa reunião da escola: “essas crianças precisam de mais conteúdo, mais lição de casa, mais exames e mais reforço, afinal devem estar preparadas para o vestibular”.  Detalhe: era um pai de um menino do quarto ano do fundamental I, ou seja 8 anos. Oi? Conteudismo x aprendizado. É assim que vejo. Esse conceito de que quanto mais conteúdo, mais nossos filhos aprenderão é errado e apenas privilegia escolas que dão justamente o que os pais pedem: conteúdo, conteúdo, conteúdo. E cada vez menos reflexão, menos debate e raríssimos projetos inovadores. Repetimos conteúdo, ao invés de cria-los. Escolas devem repensar seu papel na transmissão desses conteúdos, pois ainda o fazem de maneira expositiva, pouco atrativa e onde o aluno geralmente permanece em posição passiva ao volume sendo enfiado goela abaixo.  E ao final do dia, o professor sai com aquela sensação de dever cumprido, afinal seguiu by the book o que tinha que seguir, mas no fundo, no fundo sabe que pouco conseguiu transmitir de verdade a seus alunos, e que muitos ali “boiaram” em sua aula tamanha a quantidade despejada de maneira fria e nada atraente. E os alunos? Bem esses saem de muitas aulas lembrando apenas do que fez no recreio ou de uma brincadeira de um professor criativo que soube usar humor em sala de aula. Sem contar a quantidade de livros nas mochilas super pesadas que eles levam pra lá e pra cá.

 

Solução

 

Menos conteúdo, mais debate. Menos aula, mais discussão. Menos decoreba e mais pesquisa e aprofundamento. Menos lição e mais desafios interessantes. Sei que há metas e conteúdos a cumprir, que há o MEC, que há as diretrizes, a Base Curricular, que há o vestibular etc etc etc. Sei de tudo isso, mas não posso aceitar que as escolas, coordenadores pedagógicos e professores fiquem omissos e inertes sabendo que suas metodologias, seus conteúdos e suas aulas estão muito longe de seus alunos. Como se sentem ao saber que muitos deles já perceberam que no modelo tradicional de ensino só o que precisam fazer é estudar apenas para as provas, e que o aprendizado real mesmo não importa no final, afinal o que importa é passar de ano. Escolas e professores precisam se unir para quebrar esse círculo vicioso onde o conteudismo impera e professores e alunos fingem que ensinam e aprendem respectivamente e fecham os olhos para o real problema. É preciso coragem para estabelecerem mudanças e formas inovadores de apresentarem seus conteúdos, apesar de toda exigência de ministérios e diretrizes. É possível sim transmistir conteúdos de forma criativa, estimulante e envolvente trazendo o aluno para o processo. Fazendo com que seja protagonista e tenha autonomia para apresentar suas ideias, debater e interagir com os colegas e professores. Precisamos de jovens mais resilientes, conscientes globalmente, colaborativos e criativos. Mas com esse sistema conteudista passivo, estamos tirando qualquer possibilidade que isso aconteça

 

8 – Obsessão por provas e exames

Escolas padronizadas, ensino massificado, testes padronizados = estudantes repetidores. O sistema de avaliação da velha escola é falido, injusto e não avalia o aluno em sua totalidade. Como permitir que apenas uma parte dos alunos de uma sala de aula, que se adapta a essa forma tradicional de avaliar, possa se dar bem, enquanto os demais não se enquadram e são colocados à margem. O que temos ainda, são alunos obsessivos por provas e exames, afinal eles sabem que são elas afinal que terão maior peso no fim.

 

Solução

 

Avaliar de forma integral e justa é ter a prova como apenas mais um elemento de avaliação. É desmistifica-la. Onde a avaliação do aluno passa por apresentações orais, habilidade de se comunicar e expor suas ideias e pensamentos, é saber trabalhar em grupo e se adaptar, é trazer para a sala de aula suas ideias e projetos pessoais, ou participar ativamente dos debates e trocas dentro e fora de sala de aula. Assim a prova é mais um desafio ao jovem, e não o abismo que o aterroriza o ano inteiro.

 

9 – Recuperação

Da maneira que ainda é aplicada, é nefasta pois tira a confiança do aluno e em suas habilidades, e principalmente porque coloca ênfase apenas em seus pontos fracos e não em seus pontos fortes. Porque a obsessão em estigmatizar crianças para que repitam, repitam e reforcem apenas uma ou duas áreas de conhecimento as quais não vão bem, e esquecem seus talentos?

 

Solução

 

Recuperar e reforçar pontos fracos é importante, sim, porém se realizada na dose certa e com atenção individualizada. Alguns pontos de defasagem de conteúdo podem ser recuperados ao longo do ano pontualmente e não de forma obsessiva e recorrente. Afinal reforçar não significa repetir conteúdo de forma interminável, pois dessa maneira o problema persistirá e o aprendizado não estará acontecendo. Que seja realizada aluno por aluno com atenção individual e onde o professor possa não apenas acessar o melhor canal de expressão com o aluno como também possa guia-lo para que aprenda efetivamente.  Outra proposta é que a recuperação não apenas aconteça nas chamadas disciplinas essenciais como matemática e português, mas também nas demais, inclusive em artes e educação física. Dessa forma escolas estariam agindo de maneira justa e democrática afinal cada aluno aprende de forma diferente e tem suas habilidades e dificuldades naturais. Minha filha esses tempos questionou dizendo que as escolas deveriam também dar reforço àqueles alunos que não vão bem em artes, ou educação física, ou também que não falam bem em público. E finalmente, talvez a solução que considero mais sensível, seria que as escolas oferecessem reforço justamente nas matérias e habilidades nas quais as crianças mais se destacam. Sim, porque apenas reforçamos os pontos fracos dos alunos obsessivamente, e não reforçamos seus pontos fortes? Uma criança que tem dificuldades em matemática e está constantemente em recuperação e reforço, obviamente nunca será um As da matemática e está tudo bem com isso. Mas e se essa mesma criança tem um talento excepcional para as artes por exemplo, será que a escola não teria a obrigação de dar a ela um olhar especial e oferecer um reforço onde ela justamente tem talento?

 

10 – Sala de aula – Intra-muros e ambiente.

Definitivamente a escola deve sair de sua zona de conforto e pelo menos explorar todo conhecimento que existe em sua comunidade. Vivemos em redes. Família é uma rede. O bairro é uma rede. O trabalho hoje depende cada vez mais de boas redes e laços. A Escola também deveria ser, mas não é. Se isola em seus muros, em seus conceitos e sistemas pragmáticos e acredita que ali garantirá a aprendizagem do mundo aos estudantes. Mundo? Que mundo? A Escola, mesmo depois de tantos anos, ainda mantém seu velho sistema fechado, muito distante do mundo real, e que não explora os ambientes de aprendizagem que poderia explorar. E há muitos bem próximos de nós. Falando em ambiente, outra coisa irritante é ver os ambientes físicos das escolas e das salas de aulas extremamente conservadores, com espaços pouco agradáveis, com carteiras enfileiradas, pouco design ou experiência. Onde a criança ou o jovem ainda é proibido de circular pelos pátios da escola ou de explorar seus ambientes de maneira que se sinta parte. Não estou falando de complexidade como ter uma sala altamente tecnológica ou impressoras 3D, estou falando de experiência, sensações e bem estar.

 

Solução

 

Se o medo de sair para o bairro, fazer visitas técnicas ou passeios fora da escola for a desculpa que se repete quando se prega que as escolas devem estimular mais suas atividades fora dos muros, vamos então a outras soluções bem práticas que poderão mudar significativamente essa realidade. Porque não convidar pais de alunos que possuem conhecimento e experiências que poderiam ser compartilhadas das mais diferentes formas com os estudantes e com os professores? Porque não trazer vida para aulas de ciências, convidando um biólogo para trazer novidades as crianças? Por que não trazer encantamento trazendo um grafiteiro ou um artistas para fazer uma oficina diferente com as crianças? Por que não trazer um engenheiro, um arquiteto, um mestre de obras para compartilhar nas aulas de matemática de forma prática? Ou uma equipe de vídeo makers ensinando roteiro, story board, filmagem e textos para os jovens nas aulas de português? O encantamento é imediato e trazemos o mundo para a Escola. Pergunte a qualquer profissional, de qualquer área, se topariam fazer uma fala ou uma oficina com crianças numa escola e verá que 100% deles topariam sem custo algum. Enfim…, basta sair dos muros. E sobre melhorar o ambiente físico da escola, não seriam necessárias mudanças caras ou complexas. Certamente alguns desses pais, profissionais dos mais variados, poderiam contribuir com soluções simples na arquitetura, pintura, design, ergonomia e experiências visuais e sensoriais para a escola. Partir pros mutirões e ações simples onde os próprios alunos podem participar dos projetos e melhorar espaços que eles consideram ruins. O mesmo vale para os professores. Só fazer. Conheci escolas muito simples, comunitárias em regiões violentas do Rio de Janeiro, mas que pela atitude e ação de professores, pais e alunos transformou seu espaço e melhorou significativamente as relações e também o desempenho dos alunos. Afinal a escola é sua, é de todos ou não é? Já diria um designer que conheci – ambiente realmente cria comportamento nas pessoas. Se o lugar é feio, pouco convidativo, funcional e chato, que comportamento esperar das pessoas lá dentro? Mas se o lugar tem design, conforto, experiência e alegria, que comportamento teremos? Então, mão na massa todos, afinal que escola e que pai ou mãe não gostaria de ver seu filho feliz naquele espaço que pertence a ele?

 

A escola tem o dever de refletir constantemente sobre seus velhos hábitos e metodologias, pois talvez seja depois do setor governamental, o mais resistente às mudanças e ao novo. Precisa repensar formas e dinâmicas para ser capaz de criar vínculo relevante e verdadeiro com seus alunos. Acompanhar a evolução do mundo e se adaptar às mudanças. Preservar valores, ter autonomia e tradições são importantes sem dúvida. Porém auto-crítica e coragem para mudar e inovar também.

 

*Artigo escrito por Jean Sigel, especialista em Marketing, Comunicação e Inovação, e co-fundador da Escola de Criatividade. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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