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Ai, essas canções tradicionais…
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Guilherme Pupo

As canções tradicionais da infância expressam características da formação histórica da música de uma determinada região, fazendo parte de uma longa tradição oral, transmitida de geração a geração. Por ser fruto de um processo de transmissão cultural generalizada, a prática dessas cantigas adquire duas funções: assegura a continuidade cultural, impulsionando a permanência de estruturas musicais que caracterizam determinados estilos musicais e poéticos; garante a transformação da cultura musical, pois assimila para si as influências atuais, remodelando as práticas e seu sentido, o que é essencial para a sua sobrevivência.

É possível verificar que as cantigas tradicionais guardam estruturas rítmicas e melodias próprias de um período em que alguns dos gêneros (samba, moda de viola, seresta, rancheira, frevo, marchinhas) estavam em plena formação. É curioso notar que, quando canta “Marcha Soldado”, a criança entra em contato com elementos musicais próprios da estruturação de alguns gêneros relativamente antigos; ela assimila, por exemplo, as frases rítmicas que caracterizam as bandas marciais. Ou, ainda, quando canta “Se esta rua fosse minha”, se depara com a estrutura melódica típica das modinhas compostas há mais de cem anos.

Trabalhar com um repertório de cantigas tradicionais pode ser extremamente rico para o aprendizado, revelando a diversidade musical brasileira. A sua ampla utilização na escola pode impactar de modo significativo a musicalidade das crianças. De um modo geral, é comum os educadores evidenciarem aspectos ligados à socialização das crianças, à aprendizagem dos conteúdos expressos nas letras das canções, à psicomotricidade, à concentração, etc.

Além disso, é consenso entre muitos pesquisadores a ideia de que a música possibilita que cognição e afeto se integrem, pois ao mesmo tempo em que serve para despertar e organizar ideias, conduz inevitavelmente à expressão de sentimentos. De fato, a prática musical pode desencadear uma sequência de atitudes em sala de aula que fortalece os vínculos de confiança entre professores e alunos.

Se a questão é o trabalho musical e o desenvolvimento da musicalidade das crianças, é importante destacar a relevância de uma aprendizagem voltada, de modo especial, aos conteúdos que compõem determinados conhecimentos e linguagens musicais. Muitas vezes, a música é tratada no ambiente escolar apenas como uma ferramenta de apoio pedagógico ou de entretenimento. Isso pode limitar as possibilidades de ação dos educadores, reduzindo as frentes de aprendizagem dos alunos.

Além de suas potencialidades e de seus consequentes benefícios socioafetivos, a prática musical orienta o aluno à descoberta de um universo de saberes, encantadores e valiosos em si mesmos. O mundo musical é o espaço onde uma nova língua poderá ser aprendida, comunicada e até reconstruída, onde novas ideias e sentimentos poderão ser registrados e expressos, de maneira diferente daquelas expressas por outras formas de comunicação.

Reconhecer a riqueza desse patrimônio musical infantil e favorecer o acesso das crianças a esse tesouro é uma tarefa que não depende de uma formação específica em música. Pesquisa de conteúdo, atenção à diversidade musical e muita prática em sala de aula já são componentes que podem impulsionar o desenvolvimento da musicalidade das crianças. Cabe ao educador fomentar aquilo que as crianças têm de sobra: o desejo de brincar com o que é novo. E a música sempre guarda novidades a quem nela se aprofunda.

>> Nélio Spréa é mestre em Educação pela UFPR, arte-educador e coordenador pedagógico da Parabolé Educação e Cultura.

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