• Carregando...
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Foto: Marcos Santos/USP Imagens| Foto:

Não são poucas as lacunas e omissões no discurso do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) e uma delas promete se tornar uma polêmica sem fim. Está em debate por sua equipe econômica a simplificação absoluta do sistema tributário, com a criação de um imposto único sobre movimentações financeiras. Seria uma super CPMF.

Se a ideia vai evoluir para ser uma proposta real, não se sabe. Muita coisa que está sendo cozinhada na sala da equipe do economista Paulo Guedes vai morrer na hora em que Bolsonaro ficar sabendo – a CPMF mesmo foi desmentida por ele via Twitter, mas continuou sobre a mesa de seus economistas. O que tem sido sinalizado, no entanto, é que esse imposto é uma peça importante na proposta de reforma tributária que seria a presentada em caso de vitória da chapa bolsonariana. No limite, seria a única proposta.

A CPMF ficou conhecida como “imposto do cheque” e incidia sobre as movimentações financeiras. Quando você sacava dinheiro, por exemplo, ou usava o cartão de débito, um percentual era descontado na forma de imposto diretamente da sua conta. Para os defensores, esse imposto tem ótimas características: fácil de cobrar, com base muito ampla, difícil de ser sonegado e igualitário na cobrança. Para os críticos, incide em cascata, aumentando custos de produtos com cadeias longas, e estimula a desbancarização.

LEIA TAMBÉM: Equipe de Bolsonaro estuda fundir tributos em imposto único nos moldes da CPMF

Na forma de contribuição provisória, esse tributo foi derrubado duas vezes nos últimos anos, no governo Lula e no governo Dilma Rousseff – nesse último caso, por ironia, proposto por Joaquim Levy, um pupilo da Universidade de Chicago, mesma escola de formação de Guedes. Esse é o sinal de como o tributo sobre movimentação financeira é politicamente delicado, para dizer o mínimo.

O economista e ex-deputado federal Marcos Cintra é o maior defensor do imposto sobre movimentação financeira no Brasil e faz parte da equipe que conversa com Paulo Guedes. Na visão de Cintra, esse tributo poderia ser o único do país, substituindo todo o resto – do ICMS ao Imposto de Renda, passando pela contribuição para a Previdência. E aqui estaria a grande aventura tupiniquim, caso o economista convença Bolsonaro de que é possível virar o sistema tributário completamente do avesso.

Em artigos e palestras, Cintra defende que as vantagens de um imposto nos moldes da CPMF são grandes o suficientes para se comprar a briga política para aprová-lo. A sonegação cairia, os custos das empresas para pagar impostos desapareceriam e a receita do governo seria estável. Para lidar com o risco de uso maior do dinheiro nas transações e a desbancarização, Cintra diz que são necessárias regras rígidas para saques e a obrigação da liquidação de operações via sistema financeiro. A alíquota seria baixa, de 2,81%, na entrada e saída do dinheiro nas contas (5,62% no total, já que incidiria no saque e no depósito, coisa que não acontecia com a CPMF).

LEIA AINDA: CPMF: a longa história do imposto que une PSDB, PT e caiu no colo de Bolsonaro

A defesa ignora que o sistema tributário não é uma bagunça por acaso. Ele é resultado de disputas e disparidades regionais, da eficiência de lobbies e das necessidades de governos em construir a receita necessária para suas obrigações. Provavelmente, também subestima o impacto sobre o sistema financeiro. A alíquota também pode estar subdimensionada, a depender de como o imposto incidiria sobre investimentos e aplicações financeiras – a missão é de recolher R$ 1,4 trilhão, contra R$ 32 bilhões da CPMF de 0,2% discutida por Levy em 2015, para fazer uma comparação.

A proposta de Cintra apresentada em debates sobre reforma tributária é começar a transição para o imposto único a partir da desoneração da folha de pagamentos. Parece ser o caminho escolhido pela equipe econômica de Paulo Guedes, que substituiria a contribuição patronal e parte da contribuição do trabalhador por um imposto sobre movimentações financeiras. Será o suficiente para testar a viabilidade política da ideia e seus efeitos práticos em uma reforma tributária cujos resultados são difíceis de prever. Se der certo, poderá abrir caminho para a realização do imposto único sonhado por Marcos Cintra.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]