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Peter Harrison é um dos principais historiadores da ciência dedicados a desfazer o mito do conflito entre ciência e fé. (Foto: Janaína Aguiar/Divulgação/Associação Brasileira de Cristãos na Ciência)
Peter Harrison é um dos principais historiadores da ciência dedicados a desfazer o mito do conflito entre ciência e fé. (Foto: Janaína Aguiar/Divulgação/Associação Brasileira de Cristãos na Ciência)| Foto:

O historiador australiano Peter Harrison esteve recentemente no Brasil, onde lançou seu livro Os territórios da ciência e da religião (link para comprar o livro). Na semana passada, Harrison publicou na Aeon um ótimo texto explicando por que a ideia de que a ciência acabaria destruindo a religião se mostrou uma grande furada. Mais que isso: quem ainda promove essa ideia está, no fim, fazendo um grande mal à própria ciência. A Folha de S.Paulo traduziu e publicou ontem.

Harrison mostra como, ao longo das últimas décadas, cientistas, acadêmicos da área de humanidades e até mesmo políticos como o turco Mustafá Atatürk e o indiano Jawaharlal Nehru acreditaram piamente que o avanço da ciência faria as pessoas abandonarem a religião, assim como abandonaram tanta coisa que ficou obsoleta com o avanço tecnológico. Era a confiança ilimitada em uma certa noção de “progresso” histórico inevitável que surgiu no século 19, especialmente com o positivismo de Auguste Comte (que, ironicamente, virou religião, com templo e tudo!). Comte defendia que as sociedades passariam por três estágios, o religioso, o metafísico e, por fim, o científico. Harrison lembra que também no fim do século 19 se estabelece, com força, o paradigma do conflito entre ciência e fé, graças a nossos velhos conhecidos John Draper e Andrew White.

Esse determinismo histórico, assim como o determinismo marxista, deu com os burros n’água. As sociedades se tornaram, sim, um pouco mais secularizadas, mas não ocorreu nada parecido com o que previam Comte, Nehru e demais defensores dessa filosofia. Não há correlação, argumenta Harrison, entre avanço científico e decréscimo de religiosidade, e os Estados Unidos são o exemplo mais evidente disso.

E aí entra a ciência, que se tornou vítima da campanha dos secularistas contra a religião. Quando os secularistas resolveram puxar a ciência para seu lado, como uma das ferramentas que ajudaria a acabar com a religião no mundo, criaram uma associação indevida, e a reação às forças secularistas está corroendo a credibilidade da ciência como “dano colateral”. Por isso, diz Harrison, a Turquia acaba de retirar do seu currículo escolar o ensino da evolução: menos por causa do que Darwin propõe e mais porque ela se tornou, na mente de turcos cada vez mais religiosos, intrinsecamente ligada ao secularismo que eles repudiam.

Por incrível que pareça, os secularistas, mesmo diante da evidência, continuam a se prescrever mais veneno, insistindo na tese de que a ciência eventualmente destruirá a religião. Um wishful thinking político-ideológico, diz Harrison, que só tende a piorar a situação para a ciência, que neste momento “precisa de todos os amigos que ela puder reunir”. Isso inclui as pessoas religiosas, mas isso só vai acontecer se os defensores da ciência pararam de descrever a religião como inimiga.

De brinde, fiquem com um vídeo de uma palestra de Harrison:

Pequeno merchan

Além de editor e blogueiro na Gazeta do Povo, também sou colunista de ciência e fé na revista católica O Mensageiro de Santo Antônio desde 2010. A editora vinculada à revista lançou o livro Bíblia e Natureza: os dois livros de Deus – reflexões sobre ciência e fé, uma compilação que reúne boa parte das colunas escritas por mim e por meus colegas Alexandre Zabot, Daniel Marques e Luan Galani ao longo de seis anos, tratando de temas como evolução, história, bioética, física e astronomia. O livro está disponível na loja on-line do Mensageiro.

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