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Com voz calma e uma autocrítica polidamente elegante, um alinhado Andrea Berton responde às minhas perguntas no saguão do Senac-SP, durante congresso Mesa Tendências. Fica fácil entender porque moda e estilo são assuntos tão recorrente em seu discurso.

Também explica o fato de seu restaurante, o Trussardi alla Scala, em Milão, na Itália, levar o nome de uma importante grife – a Trussardi, que confecciona roupas masculinas, principalmente.

E sua cozinha respira moda, ele garante. O italiano pensa seus pratos como estilistas trabalham os tecidos. Respeita as tradições, mas acha que a gastronomia precisa estar em constante evolução.

Não à toa, sua forma de cozinhar é como uma nova coleção de uma consagrada grife, no caso, a mesa italiana. Engana-se quem pensa que a berinjela à parmiggiana, uma de suas criações mais conhecidas, tenha uma apresentação clássica…

A seguir, você confere a conversa com Berton — a última da série Chefs Italianos — cujo restaurante tem duas das três estrelas possíveis no Guia Michelin (referência mundial em boa cozinha). E ele dá um recado aos brasileiros: devemos investir em cozinha regional:

O Trussardi é um restaurante ligado a uma marca de moda. Como harmonizar estes dois importantes segmentos?
Na verdade foi um casamento. Essa parceria deu certo porque tenho um estilo muito semelhante ao produzido por esta marca. Minha cozinha preza por muitos valores que também são respeitados na alta costura. Elegância, qualidade, estilo…Tudo isso de uma forma que inove, mas use bases tradicionais consagradas.

Então as bases tradicionais são alicerce desta cozinha italiana de vanguarda?
Sem dúvida alguma. Esse é um ponto que os novos cozinheiros italianos têm respeitado e, por isso, ainda somos uma cozinha italiana no sentido pleno da palavra. Não reinventamos as bases da cozinha. Apenas sugerimos novas formas de preparo, apresentação, como extrair o melhor de cada prato. A tradição nunca ficou de lado. Sabe o que é o fator determinante para uma bom restaurante italiano: nossa terra, nossos produtos. Se na moda você não faz uma boa costura sem um bom tecido, na cozinha, não há como fazer um bom prato sem um insumo de qualidade.

E porque inovar uma cozinha que já é plenamente consagrada?
A cozinha é como a moda. Está em constante movimento. A moda não para. E a cozinha italiana evoluiu muito nos últimos anos graças à inquietude.

A moda sempre está presente em suas afirmações. Você acha que essa nova forma de cozinhar na Itália está na moda?
(Risos) sim, claro. Sempre faço paralelo da moda com a cozinha porque meu restaurante é fruto desta combinação. Além disso, muita gente acha que moda e estilo também envolvem comer bem, em bons restaurantes. Mas acho que este fator tem mais relação com a busca da qualidade, que hoje é muito mais intensa na Europa.

O menu de seu restaurante seria aceitável para um cliente mais tradicionalista?
Sim. Meu cardápio não assustaria um italiano nato. Há a berinjela à parmiggiana, os risotos, as carnes.

No Brasil, os restaurantes italianos (ou inspirados na gastronomia italiana) são numerosos. O que você acha deste legado tão forte a milhares de quilômetros da sua terra?
Ficamos envaidecidos, mas volto a citar a necessidade de se encontrar a identidade da cozinha brasileira. Pelo tamanho do país, pelo clima, pelas florestas, posso crer na riqueza dos elementos que vocês têm. Com isso, não quero dizer que amanhã todos os restaurantes italianos no Brasil devam ser fechados. Muito pelo contrário. Mas gostaria de saber que há muitos restaurantes excelentes de cozinha regional em São Paulo ou no Rio.

Até que ponto a crise econômica europeia tende a mudar os hábitos dos frequentadores dos restaurantes de alta gastronomia em seu país? E isso é muito prejudicial?
Muda bastante. Mas acho que há um aprendizado nisso. Tem menos dinheiro na Europa e a tendência é que as pessoas estejam dispostas a pagar menos, mas sem perder a qualidade. Este exercício fez muitas cozinhas voltarem os olhos aos elementos regionais. Ou seja, olharam em volta em busca de bons fornecedores, bons produtos. Isso desenvolve a cozinha. É positivo. Mas, claro, ainda assim, as coisas têm seu preço…

Você faz parte de uma nova corrente de cozinheiros italianos muito bem sucedida e consagrada pelos principais guias de cozinha. A que se deve isso?
Acredito que é uma geração sem medo de experimentar e consciente de nosso passado. Assim como a Espanha e a França, temos bons novos nomes se destacando. E, como nos países que citei, há uma boa escola. Eu aprendi muita coisa com gente como Gualtiero Marchesi. Foi dele que ganhei a consciência de respeitar o terroir e seus ingredientes, usar a sazonalidade e ser apaixonado pelo que faço. Ter estrelas é importante, mas clientes fieis e satisfeitos é ainda mais.

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