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Nova fase, mesma Manu
São 16 horas de uma sexta-feira no restaurante Manu, em Curitiba. A cozinha está a todo vapor com os preparativos para o jantar que inicia às 20 horas, mas mal se ouve o tilintar das pinças. Uma das mesas, porém, está ocupada há horas. Em cima da toalha branca e longe das taças está um bebê-conforto, um travesseiro cor-de-rosa e uma bolsa com roupinhas e fraldas.
Helena tem um mês e meio e chegou sem precisar fazer reservas. O ambiente não lhe é estranho: passou 40 semanas ouvindo a dinâmica do restaurante dentro da barriga da mãe, a chef Manu Buffara, eleita uma das melhores chefs do Paraná cinco anos consecutivos pelo Prêmio Bom Gourmet (Gazeta do Povo) e chef revelação em 2011 pelo Guia 4 Rodas. Com uma vida em ritmo 220 volts, não parou durante a gravidez e trabalhou até a noite véspera do parto, realizado às 7h30 .
A chef, de 29 anos, estudou no Centro Europeu (Curitiba) e no Italian Culinary Institute for Foreigners e estagiou pelo mundo em restaurantes estrelados pelo guia Michelin. Inspira-se na cozinha tecnoemocional para criar seus pratos, assim como o catalão Ferran Adrià. No Manu, seu cuidado ao escolher e trabalhar com ingredientes locais faz jus ao seu desejo de valorizar o Paraná pela sua cozinha – ela trabalha exclusivamente com menu degustação, contando através da sequência de pratos a história de sua paixão.
O restaurante da chef parnanguara foi indicado pela revista Forbes em 2013 como um dos melhores lugares para comer no Brasil, o único fora da capital paulista. E recentemente caiu nas graças de Alex Atala, chef brasileiro mais respeita mundo afora.
Sua carreira galga degraus altos há pelo menos cinco anos. A pequena Helena fez a chef dar uma breve pausa. Brevíssima: ela passou 20 dias em casa resolvendo as questões do restaurante por telefone e cozinhando pratos caseiros para curtir a filha. “Neste tempo em casa senti falta de ir à chácara buscar ingredientes, de ficar no serviço, de montar pratos. Eu chegava às 9 horas e agora passei a vir umas 11h30.”
A nova rotina a deixa entusiasmada: “Nós duas vamos ter que nos acostumar uma com a outra. Ela veio para trazer alegria, me dar uma nova forma de ver a vida. Na última vez que fui à chácara consegui ver os ingredientes mais a fundo, estou mais sensível, minha forma de criar mudou”. Para os primeiros seis meses de vida de Helena, Manu contratou uma enfermeira que a acompanha nos afazeres do dia. “A Solange diz que ela vai falar coentro antes de falar mamãe”, ri. À noite, a menina fica em casa enquanto a mãe trabalha no restaurante.
No segundo semestre tem viagens marcadas para Áustria e Nova Iorque. Tanto o MB quanto o Manu recebem chefs do Brasil a partir de maio. Roberta Sudbrack (RJ) vem cozinhar no Manu. Na MB, o Festival Mistura Brasileira começa em junho com Janaína Rueda (Bar da Onça, SP); em julho, Kátia Barbosa (Comedoria e Aconchego Carioca, RJ); agosto tem Felipe Rameh e Fred Trindade (Trindade, MG); para setembro, Tereza Paim (Casa de Tereza e Terreiro Bahia, BA); e dois paraibanos Wanderson Medeiros (outubro) e Onildo Rocha. “Cada um vai transformar o restaurante por uma noite de acordo com o estilo de seu estabelecimento.
Os planos não param. Enquanto ela amamenta, dá as coordenadas no salão para atualizar o cardápio e prova uma pipoquinha de grão-de-bico que trazem da cozinha.“Acho que tem que secar mais, não está crocante. Você não fritou tudo, né?”. Em seguida responde às mensagens de WhatsApp que apitam às dezenas. Olha ternamente para a filha quando dá uma choradinha. Volta ao ritmo: atende o telefone e resolve pendências.
Para o futuro próximo ela vê Helena crescendo próximo à natureza e à família, comendo as papinhas preparadas no restaurante, acompanhando-na pelas viagens. Na sua carreira, espera colher o que semeou em 2014: “Se me perguntarem ‘Lista The World’s 50 Best Restaurants, quer entrar?’ Claro que quero. Mas não trabalho só para isso. Queria ganhar Melhor Chef Mulher do Mundo também. Tudo tem seu tempo”. Helena tem fome. Manu dá o peito e a cobre com uma fraldinha. “Vou com calma.”