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“Restrição alimentar é para os fortes”: leia sobre os desafios na coluna Flor de Sal
A verdade é bem essa, ter restrição alimentar não é legal. E os motivos são incontáveis!
A primeira restrição que descobri foi a intolerância à lactose. Logo eu, mineira, que trocava um bom prato de janta por qualquer queijo e iogurte. Lembro bem de todas as substituições malucas que precisei fazer na rotina, das receitas que deram errado e das comidas sem graça que comi pelo caminho. “É hábito”, pensava. “Só mais algumas semanas e eu não vou nem lembrar mais o sabor de um bom queijo, e vai ficar tudo bem”. Engano meu!
O mesmo aconteceu quando vieram as mais recentes restrições: sensibilidade ao glúten e a restrição da ingestão de carboidratos e açúcares por causa da síndrome do ovário policístico (ligada à resistência insulínica). Quando descobri, sentei e chorei! Eu não aguentava mais. Comer tinha se tornado um pesadelo! Não podia simplesmente desfrutar de uma refeição sem pensar se passaria mal, se ia acordar inchada, com problemas digestivos, diarreia, gases, distensão abdominal, dor de cabeça, acne, rinite, e por aí vai.
O mundo acaba sendo um ambiente um tanto assustador quando precisamos lidar de forma responsável com essas restrições. As pessoas não entendem que não é frescura e que abrir uma exceção vez ou outra acaba cansando porque, afinal, você sabe que terá que lidar por semanas com as consequências de um deslize. Estabelecimentos mal instruídos não sabem te dizer se você pode ou não comer seus pratos. A falta de interesse que faz com que coloquem produtos sem sabor e textura à venda.
Quando não podemos comer algo que gostamos, deixamos de lado nossa história, nossa cultura, nossas memórias. Deixamos de compartilhar a receita de família, o almoço de domingo, a saidinha com os amigos, o pastel na feira, a empadinha da festa do primo mais novo. Na hora da refeição, a restrição sempre vem à tona e vira assunto por alguns minutos, enquanto os demais comem algo que gostaríamos de estar comendo também, para o nosso desconforto e, quase sempre, quando comemos aquilo que nos resta como opção, a infelicidade bate à porta – o conhecido e temido gosto de isopor com sal.
Resolvi escrever sob a perspectiva de quem tem restrições alimentares com um pedido carinhoso para quem me lê: as rupturas já são muitas! É cansativo, de várias formas, ter que lidar com elas. Seja o motivo de um sorriso quando compartilhar a refeição com alguém com restrição. Ao preparar um alimento, seja inclusivo e empático, faça algo gostoso, com carinho. Seja acolhimento e amor. Ter restrição alimentar não precisa ser tão difícil.
E esse mês vamos de bolo de milho cremoso, com crosta de coco, bem parecido com o que a minha vó fazia quando eu era mais nova, porque eu não sou obrigada a comer bolo ruim – nem você!
* * Gabi é chef e culinarista, autora do blog e livro best seller Flor de Sal e fundadora do projeto social Good Truck.