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Paul mergulha na Jamaica em 1971: fugindo da sombra dos Beatles | Linda McCartney/Reprodução
Paul mergulha na Jamaica em 1971: fugindo da sombra dos Beatles| Foto: Linda McCartney/Reprodução

Lançamento

Man On The Run, Paul McCartney no Anos 1970

Tom Doyle. Tradução de Paulo Polzonoff. Leya, 333 págs., R$ 39. Biografia.

Opinião

Livro de Doyle acerta no tom e no recorte temporal

Sandro Moser

Cobra criada do jornalismo musical inglês, Tom Doyle soube unir uma boa ideia à sua capacidade de executá-la. Colaborador há décadas da revista Q e de outros veículos britânicos, e o homem que mais vezes entrevistou McCartney, Doyle escolheu um recorte interessante da vida do astro – a conturbada década de 1970 – para fazer um perfil biográfico completo.

É minucioso na apuração, sensível aos problemas e irreverente quanto aos deslizes do baixista canhoto, compositor das canções mais executadas da história.

O resultado é um mergulho certeiro na vida e na careira solo de McCartney, indispensável para fãs dos Beatles. Há desde detalhes técnicos das gravações até declarações inéditas e muito espontâneas de Paul sobre assuntos como família, drogas e sua relação com John Lennon. GGGG

No começo dos anos 1970, Paul McCartney estava na pior. Apesar de ser um dos artistas mais famosos do mundo e um dos compositores que mais lucrou na década anterior, Paul estava deprimido, sentia-se artisticamente arruinado e escorregava perigosamente para o alcoolismo.

Aos 27 anos, carregava o peso de ser um ex-Beatle. Pior. As notícias da sempre rumorosa imprensa inglesa sobre a briga que dera cabo à super banda o colocavam como o principal culpado. Um penoso processo judicial contra os ex-colegas de grupo o colocaram em uma encruzilhada que o cara que, um ano antes escrevera "por que me deixar aqui sozinho? Mostre-me o caminho", parecia não saber como atravessar.

O livro Man On The Run, Paul McCartney nos Anos 1970 mostra a volta por cima que Paul conseguiu dar em sua vida e carreira nos dez anos seguintes.

Fugindo de si mesmo e dos sonhos dourados dos ­Fab ­Four, Paul fez coisas inusitadas e polêmicas, mas conseguiu redescobrir seu talento. E, ao fim da década, resgatou a integridade pessoal e lugar no topo da cadeia alimentar do showbiz.

Luta e fuga

Escrito por Tom Doyle, certamente o jornalista que mais vezes entrevistou McCartney (leia mais nesta página), o livro mostra um homem a um só tempo brilhante e inseguro, capaz de sentimentos e ações inexplicáveis ao caminhar sobre o gelo fino que separa a soberba de uma insegurança quase infantil.

"Se alguma palavra resume Paul McCartney nos anos 1970, esta palavra é luta. Outra é fuga", definiu Doyle na introdução do livro.

São mesmo as palavras-chave do período, pois ele passou a década fugindo da sombra da ex-banda: tornou-se um hippie tardio e excêntrico e foi perseguido pela polícia como o maconheiro n.º 1 da música pop. Milionário, Paul foi viver em uma acanhada fazenda, e excursionou pelo mundo com bandas ­semi-amadoras.

O mais importante: contra muitas adversidades soube produzir discos brilhantes (e também outros bem confusos). Foi enfim, um período tenso e libertador, ricamente documentado pela pesquisa de Doyle.

Muito divertido ler o relato da primeira turnê dos Wings, a banda montada em 1970 que, praticamente sem repertório, tocava, de supetão em universidades do interior da Inglaterra em troca de alguns pratos de peixe com batata frita.

Briga pública

Doyle usa a estrondosa briga pública que Paul travou pela imprensa com John Lennon para costurar os capítulos da biografia. Foi chumbo trocado em forma de declarações e canções, enquanto o pau quebrava nos tribunais de forma muitas vezes antiética, de parte a parte. Há, porém, detalhes da reaproximação dos ex-parceiros no final da década, e também a mais completa versão de Paul sobre sua desastrosa reação em entrevista dada a tevê Inglesa no dia em que Lennon foi assassinado, em 1980.

Fazendeiro

Paul morou a maior parte dos anos 1970 em uma relativamente humilde fazenda em High Park, na Escócia. Lá, como um hippie tardio, criava as filhas longe dos colégios britânicos, plantava a própria maconha (chegou a ser preso por isso), e pastoreava ovelhas e cabras. Na fazenda, também gravou McCartney, seu primeiro álbum solo, tocando todos os instrumentos em seu estúdio caseiro. O disco emplacou hits como "Maybe I’m Amazed" e "Every Night".

Para Linda, com amor

O livro acerta na dimensão da esposa Linda Eastman na vida de Paul. Ela foi o pilar de sobriedade que o fez levantar da lama, companheira para viver no campo e na estrada com os Wings. Na banda, ainda que soubesse tocar apenas um par de acordes, foi tecladista e parceira em canções. Linda foi sobretudo inspiração para algumas das mais belas músicas de Paul, como "My Love" e "Lovely Linda".

Viva e Deixe Morrer

Ex-amigos e parceiros, Paul McCartney e John Lennon protagonizaram uma polêmica pública através de músicas em seus discos solo nos anos 1970. Começou com Paul, em Ram (1971), alfinetando Yoko Ono na canção "Too Many People"(Gente Demais, em tradução livre). Lennon responderia com "How Do You Sleep?" (Como Você Consegue Dormir?) atacando McCartney em seu álbum Imagine (1971). Em 1974, os dois reataram a amizade.

Tensão em Lagos

Em 1973, Paul decidiu levar os Wings à Nigéria para as gravações do álbum clássico Band on the Run. Paul levou a família junto, mas não se deu conta de que o país estava em guerra civil e sob epidemia de cólera. Também não contava com a resistência do artista e ativista Fela Kuti (foto), que desconfiava que o ex-Beatle tinha ido à África plagiar a sua música.

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