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Guilhermina Guinle no papel da socialite Alice, em "Paraíso Tropical" | Reprodução www.globo.com/paraisotropical
Guilhermina Guinle no papel da socialite Alice, em “Paraíso Tropical”| Foto:

A pergunta, tão óbvia como obrigatória, persegue qualquer ator britânico com mais de 1,80m: "Você gostaria de viver James Bond?". A resposta costuma ser evasiva, escoltada por sorriso docemente constrangido - afinal, nunca se sabe o que o futuro e as propostas contratuais reservam. Um deles quebra o protocolo com o despudor das pessoas francas.

- Não dá. Eu uso óculos - avisa Clive Owen, renegando a pinta de galã e os 1,89m que o recomendam ao ofício de passar o rodo pelo mundo, a serviço de sua majestade.

Simples assim. O despojamento funciona como cartão de visitas do astro inglês, que investe no papel de desmistificar a arrogância comum ao primeiro escalão hollywoodiano. Protagonista da ação descerebrada "Mandando bala", que estréia sexta-feira (9), ele aposta, na vida real, no personagem "homem comum". E, com o interlocutor brasileiro, aproveita para saciar um pouco a paixão comum aos dois países: falar de futebol. Owen é torcedor xiita do Liverpool, a ponto de se recordar de uma derrota acontecida 26 anos atrás:

- Lembro, claro, daquele time brasileiro maravilhoso. Não tivemos a menor chance - confirma, referindo-se ao Flamengo de Zico, que, em 1981, bateu os ingleses por 3 a 0, na final do Mundial Interclubes, em Tóquio.

Pelo menos isso de brazuca ele tem. Arruma sua agenda para estar diante da TV quando seu time entra em campo. É a segunda diversão predileta - a primeira, claro, atende pelos nomes de Hannah e Eve, as filhas que teve com a mulher, a também atriz Sarah-Jane Fenton. A família vive em Londres, endereço que Owen, 43 anos, não troca pela Califórnia. Prefere, em nome do sossego das crianças, ficar na ponte aérea transoceânica.

Ele recebeu a revista "Megazine", do O Globo num quarto de hotel na ponta sul da ilha de Manhattan. Cheio de estilo, de calça social, camisa branca sem gola e tênis branco, exibia um grosso cordão de ouro no peito. Estava com a barba feita - bem diferente dos personagens mais famosos, como o Dwight McCarthy da franquia "Sin City" - e, durante os 20 minutos da entrevista, manteve-se atento e sorridente, bebericando uma garrafa de água mineral sem gás. Ele prefere o tipo "cara normal" e segue sem escorregões pelo caminho da simplicidade. Diante deste repórter, foi gentil e cuidadoso para falar do país que não conhece bem.

- Vários amigos me falam muito bem do Brasil. Eles repetem: "você precisa conhecer, você precisa conhecer". Vou, com certeza. Infelizmente, não sei ainda quando. Mas só ouço elogios a respeito do povo e das mulheres - garante o inglês, que cita Ronaldinho Gaúcho como sonho de consumo para vestir a camisa vermelha do Liverpool. - É o melhor jogador do mundo. Seria maravilhoso para jogar com Gerard, nosso craque.

A grandiloqüência comum ao futebol e ao cinema não seduz Clive Owen na condução de sua carreira. Na batida da não-afetação, ele prefere misturar estilos e gêneros, mantendo um pé na Inglaterra enquanto caminha - e conquista - Hollywood. Assim, ele vai de "Assassinato em Gosford Park", de Robert Altman, totalmente cabeça, a "Identidade Bourne", ação-pipoca da melhor qualidade.- Minha carreira é uma mistura de estilos, os filmes de que participo são incrivelmente diferentes. Prefiro diversificar os tipos de trabalho, descobri que rendo mais dessa maneira - acredita ele que, este ano, além de "Mandando bala", ainda estrelou "Elizabeth: A era de ouro", com estréia no Brasil marcada para 11 de janeiro.

A estratégia já rendeu uma indicação ao Oscar de coadjuvante, pelo ótimo desempenho em "Closer", vitória pessoal das mais relevantes. Afinal, estavam no elenco a superestrela Julia Roberts, a gracinha Natalie Portman e outro inglês emergente, Jude Law.

- Talvez você não acredite, mas não faço filmes pensando em ganhar um Oscar - garante ele, que perdeu o prêmio (com toda a justiça) para Morgan Freeman, genial em "Menina de ouro". - Sem problema. Participar da festa já foi fantástico. Estive com muitos dos meus ídolos no cinema. Quando você começa nessa carreira, não pensa que vai chegar tão longe.

Pode ser. Mas Owen tem seus feitos a ostentar. Conquistou lugar cativo no disputado mercado do cinema e um cachê que ronda os US$ 5 milhões por filme. Está longe de bambambãs como Matt Damon (US$ 10 milhões), Russell Crowe e Leonardo Di Caprio (US$ 20 milhões cada), mas não dá para reclamar da vida. O inglês ainda cristalizou, nos personagens mais populares, uma assinatura que os fãs já consideram obrigatória: a barba por fazer.

- É estranho, os diretores pedem, dizem que fica melhor se eu não fizer a barba. Claro que não tenho o hábito de deixar assim. Então, só obedeço - comenta, sorrindo, com a barba da vida real impecavelmente feita.

A mesma tranqüilidade é usada por ele para falar de "Mandando bala", o filme que serviu de mote ao encontro com jornalistas em Nova York. Os críticos, farejando mensagens subliminares, metáforas e alegorias no frame mais descomprometido, perguntaram sobre uma eventual crítica à indústria de armas e à política americana no setor. A resposta de Owen foi desconcertante:

- Não levem tão a sério - aconselhou. - Nossa idéia, nesse filme, foi realizar uma diversão pura e inconseqüente. Cinema, sabe? - arrematou, sorrindo britanicamente.

Um achado, para a média das entrevistas de lançamento de filmes com atores de Hollywood, normalmente uma sucessão aborrecida de respostas estudadas, nas quais todo mundo é maravilhoso, tudo dá certo... A sinceridade da sugestão de Owen, para não levar tão a sério, é algo muito raro. Coisa de um míope que, os fatos mostram, enxerga longe.

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